R. B.
Na certeza de que conseguirá oferecer aos leitores uns momentos de recreio ao
mesmo tempo instrutivo, este pequeno apontamento de curiosidades
refere-se àquele pequeno objecto que, acompanhante
diário de todos nós, como é, merece da nossa parte um pouco de
apreço, pois com ele escrevemos e assinamos: a caneta.
Nasceu nos princípios do século XIX, em 1803, e a sua invenção deve-se a um
espanhol de nome Francisco de
Paula Marti. Escritor sem projecção, deixou-nos alguns dramas de
certo interesse, mas que não conseguiram evitar as teias de aranha
do esquecimento. Igualmente nos deixou algumas gravuras,
insuficientes, porém, para sabermos do seu génio, se é que chegou a possuí-lo.
Não chegaria isto para o fazer conhecido; o que faria o seu nome
recordado por todos nós e conhecido do mundo de então
foi, sem dúvida, a taquigrafia, de que foi o introdutor na Península Ibérica e, depois, o seu invento.
Marti tinha por funções registar as palavras proferidas em discursos
ou conferências por qualquer orador; nestas condições, tinha
interesse em
tornar a escrita tão rápida e cómoda quanto fosse possível. Este seu
interesse era satisfeito pela taquigrafia, essa maneira
abreviada de escrever usando sinais, tão em voga nos tempos
actuais, pelo que logo passou a servir-se deste modo de escrita.
Outros lhe seguiram o exemplo e, em breve, a taquigrafia era usada em toda a
Península. Por outro lado, havia vantagem em eliminar o
inconveniente que as penas de ave tinham de obrigar a molhá-la no
tinteiro com a frequência atentatória do fluir das ideias. Imaginou, então, uma pena
com um depósito interior, a fim de dispensar a presença do tinteiro.
E nasceu a primeira caneta estilográfica: um tubo de metal tinha
numa extremidade uma tampa roscada e na outra, mais estreita, um aparo
simples, à semelhança da ponta duma pena que podia estar protegida,
quando a caneta não estivesse em uso, por um casquilho de uns três
centímetros, que se enroscava no
tubo. Este tubo podia conter tinta suficiente para quatro horas consecutivas de escrita, o que representava um atributo
vantajoso da caneta. Ao mesmo tempo, dada a sua forma, facilmente
/
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Finalmente, o aparo escrevia fino e legivelmente, além de que não se
gastava, por ser de metal.
Era incómoda, diremos nós; mas, se soubermos
compreender o
progresso que ela representava, louvaremos Marti por nos ter dado a caneta.
Indubitavelmente, o invento podia trazer avantajados lucros ao seu
autor, mas ele era modesto e isento de ambições, pelo que não
procurou enriquecer, explorando o interesse alheio. Antes, pelo
contrário, ele ensinava a construir essa maravilhosa pena.
Explicava a sua atitude, afirmando: «... Como nada deve omitir-se
sobre quanto possa contribuir para ganhar tempo, pareceu-me conveniente dar uma ideia da espécie de pena que pode ser usada para
maior comodidade dos que aprendem: as melhores são as de ouro e
platina, porque a tinta não as corrói; mas, na falta destas, as de
prata, latão e aço.
A nova pena só viria a ser
explorada industrialmente volvidos mais de trinta anos, mais
exactamente em 1835, pelo inglês Parker que, cônscio dos lucros que
daí lhe adviriam,
começou a sua produção em série, efectuando, simultaneamente, diversas modificações, tendentes a torná-la mais
prática,
mais leve, mais eficiente.
A expansão foi rápida,
fazendo a fortuna de Parker, que,
inteligentemente, soube aproveitar-se da ingenuidade do espanhol: foi, sucessivamente
intensificando a fabricação do
artigo, abrindo novas instalações fabris, melhorando as já
existentes.
Presentemente há numerosas fábricas do género
produzindo inúmeros
tipos de canetas, mas todas, mais ou menos, à semelhança daquela
que Marti construiu, inaugurando um reinado triunfal, que nem o
assédio da caneta esferográfica conseguiu ainda derrubar, não
obstante a comodidade do botão, a duração da carga, a possibilidade
de recarga.
Conquanto estivesse ao
alcance de qualquer, foi Francisco de
Paula Marti que nos trouxe a taquigrafia e nos legou a caneta. Graças a ele, a
escrita é, hoje, incomparavelmente mais fácil e rápida. Em
qualquer lugar podemos escrever – na cama. em viagem,
no campo –, mas poucos sabem a quem se deve essa comodidade, que já
é possível desde há 163 anos... |