Manuel António Calisto Morais
(25 2.° D)
UMA nau cortava as águas agitadas por longas ondas
enfurecidos. Um marinheiro, com a pele queimada pelos
maus tratos do tempo, segurava o leme, alheio a tudo que o rodeava.
Mas o Adamastor soprando contra as
suas velas, acordou-o das suas meditações:
A –
Quem és tu, marinheiro?
M –
Sou um português, daqueles que conseguiram vencer
a tua fúria.
A –
E que fazes tu nos meus mares?
M –
Teus! não; nossos, dos meus irmãos de raça que
vencendo mil dificuldades, sulcam – como eu – estas águas tormentosas.
A –
Mas, por que te arriscas a tais trabalhos?
M –
Porque quero tornar realidade o sonho de um homem
que, lá longe, estará agora a pensar em mim: o Infante D. Henrique,
o filho de El-rei D. João I...
A –
Mas só por um homem serias capaz de morrer?
M –
Eu não morreria por um homem qualquer, morreria
pelo Infante, pela Obra do Infante D. Henrique, e cumprindo as suas
ordens estou a espalhar pelo mundo o nome de Portugal.
A –
Mas não tendes os vossos campos paro trabalhar? Que mais
quereis?
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M –
Queremos mostrar ao Mundo
que, pequenos no tamanho, somos enormes no valor. Em cada canto, por pequenino
que seja, onde a pequena bandeira de Portugal estiver, estará a fé dos Portugueses. Os santos morrem para espalhar a nossa
Fé,
os heróis morrem pare espalhar o nosso nome.
A –
Sabes, marinheiro português, se não fosse minha sina meter medo
aos navegantes, acabava por gostar de ti. Ouve uma
coisa: Vós, lusitanos, não tendes medo de mim?
M –
Que interessa, Adamastor, que tu nos queiras matar,
se temos um ideal que queremos concretizar: tornar real o desejo do Infante, dilatar a nossa fé e espalhar o nome de Portugal.
O vento abrandou um pouco, até que desapareceu por
completo.
As mãos enrugados do marinheiro foram a pouco e pouco
perdendo o nervosismo.
E quando se ouviu a voz do contra-mestre, tudo voltou
à normalidade:
– Eh do leme: Que tal vai isso? Que tal vai a nossa nau?
– Tudo bem. Ao leme da nossa nau não vou só eu, vai
também o Infante, a minha Fé e o nome de Portugal.
... E a nau continuou a sulcar, noite e dia, os mares
calmos do Adamastor. |