Maria do Rosário Azevedo
Tínhamos falta de tudo naquela Escola. Não tínhamos
edifício, não tínhamos alunos, só tínhamos professores. Tínhamos falta
de tudo menos de vontade de trabalhar. Nessa altura, ano lectivo de
1975/76, as pessoas estavam entusiasmadas. Tínhamos de arranjar um
edifício para a Escola nem que tivéssemos de transportar adobos.
Como apareceram os professores para a Escola Secundária
de Aveiro?
Um grupo de professores do então Liceu Nacional de Aveiro
(LNA) concorreu para esta Escola criada no papel como Escola Secundária
de Aveiro, mas ninguém sabia onde era. Fomos colocados (nessa altura os
concursos eram feitos numa folha de papel selado onde se indicavam, por
ordem de preferência, as Escolas) e ficámos contentes.
A este grupo foram-se juntando outros professores também
colocados nesta Escola que, talvez porque o então LNA era muito
conhecido, lá se dirigiam para saberem onde era a Escola. Assim o grupo
inicial foi-se alargando e, em "auto-gestão", começou a trabalhar.
Formaram-se grupos de trabalho.
Um foi ver se arranjava "casa". Percorreu-se a cidade,
não conseguimos. Fomos a Lisboa e depois de várias diligências deram-nos
o edifício que hoje é a Escola Secundária Homem Cristo (ESHC) e que na
altura era uma secção do LNA. Tínhamos edifício e professores. Não
tínhamos alunos.
Enquanto outras Escolas estavam a "rebentar pelas
costuras" nós não tínhamos alunos. Os alunos tinham-se matriculado no
LNA e na Escola Comercial e Industrial. Como é que os Encarregados de
Educação aceitavam que os seus educandos fossem transferidos para uma
Escola na qual se não matricularam, não sabiam onde ficava e nem sequer
sabiam o que era uma Escola Secundária?
Ficámos sem saber quais foram os critérios de selecção
mas "democraticamente" os alunos apareceram.
Organizámos grupos que se encarregaram de dizer aos E.E.
[Encarregados de Educação] que confiassem em nós. Estávamos cheios de
vontade de fazer dos filhos alguém. Eles iam
/ 72 /
aprender muitas coisas na nossa Escola. Para estes esclarecimentos
fizemos um levantamento das áreas de residência dos alunos e fomos fá
fazer reuniões com os EE Julgamos que nessa altura conseguimos motivar
mais os Pais para essas reuniões do que as actuais Associações de Pais
conseguem fazer. Bem sabemos que havia todo um clima envolvente que era
diferente do presente. Também tivemos que informar sobre a nova escala
de avaliação, 1 a 5. Não foi fácil explicar aos Pais que os meninos não
iriam ter 18. Talvez tivessem 5. Mas 5 era muito poucochinho...
Lembrámos alguns episódios, algumas situações criadas que tivemos de
ultrapassar. Uma das vezes que fomos a Lisboa, à 5 de Outubro, não
conseguimos entrar no elevador de serviço por estar uma fila enorme à
espera. Reparámos que havia um elevador parado e fomos perguntar ao
porteiro porque não funcionava tal elevador. Era para o Sr. Ministro,
foi a resposta. Depois de uma "conversa" com o porteiro subimos no
elevador do Sr. Ministro. íamos cheias de cópias de ofícios que não
tinham tido resposta. Chegadas ao departamento, disseram-nos que não
tinham lá chegado. Convidaram-nos a ir dar umas voltinhas enquanto
procuravam. Sentámo-nos à espera, pois íamos apenas tratar assuntos
desse departamento. Ao fim de meia hora de espera apareceram todos os
ofícios e resolvemos alguns dos problemas.
E as colocações dos professores? Havia um horário do 8.º
B por preencher.
Minimizámos os prejuízos dos alunos. Das 3 horas semanais
a que os alunos tinham direito os professores já colocados davam 1 hora.
Era uma "autonomia clandestina" para que os alunos não desaprendessem o
que já tinham aprendido.
As colocações vieram em Maio, duas, uma para esse horário
e outra para um horário de Canto Coral. Não tínhamos esta disciplina.
Para o 8º B veio um Serralheiro Mecânico que tinha concorrido para as
Escolas Técnicas e para Canto Coral um Contabilista. Ficaram aterrados.
Entrámos em contacto com a Direcção Geral e disseram-nos que não havia
engano nas colocações, que os professores estavam muito bem colocados e
que tínhamos de os ter cá. Nós tínhamos autonomia para resolver a
situação. O Serralheiro disse-nos que desistia. Isso implicava que ele
ficasse dois anos sem trabalhar. Não sabemos como ele resolveu a
situação. O Contabilista foi trabalhar na secretaria.
/
73 /
Quando a Dulce veio de Lisboa indigitada para Presidente
da Comissão de Gestão, disse-nos: "Olha estou na cabeça do toiro".
Arranjámos uma lista, a Dulce Pato, a Lucília Ramalheira
já faleceu) e eu. A Escola deu o seu aval. A resposta de Lisboa foi que
teríamos de ser quatro elementos ou a Dulce sozinha. A colega Licínia
Cruz, do 1.º grupo, associou-se a nós.
Depois desta gestão, que fez os alicerces da Escola,
estivemos em 1980/81 com a Dulce Pato, o Carlos Corga, a Alcina Paula do
Bem e a Lurdes Magalhães. Nessa altura foi o 12.º ano e os problemas a
ele inerentes.
Estivemos novamente no Conselho Directivo em 91/92 e
92/93 e, por incrível que pareça, nós, que ajudámos um pouco na
construção desta Escola, hoje Escola Secundária Homem Cristo, fomos
alertados por um telefonema do Dr. Girão Pereira, então Presidente da
Câmara, que tinha assinado um protocolo com a DREC da cedência do
edifício à Câmara. Não queria o Sr. Presidente ir para a Assembleia
Municipal sem dar conhecimento à Escola do que se estava a passar.
Depois de termos andado a calcorrear as ruas de Aveiro
para arranjarmos um edifício para a Escola, vamos estar no Conselho
Directivo onde nos vem dizer a "a Escola vai acabar"!
Não acabou. O Dr. Girão levou esse protocolo à Assembleia
e o CDS, que na altura estava em maioria, aprovou. Os outros partidos
todos votaram contra.
Nós sentimos que houve muita exploração disto por parte
da Comunicação Social e até das outras Escolas. O nosso grande apoio foi
da população de Aveiro e dos outros partidos. Arranjámos uma Comissão
que trabalhou para que a Escola não fosse desactivada. A Escola não
acaba. Já está prometido que nos vão ceder as salas que nos levaram.
Na ala que foi cedida à Câmara havia salas de aula e o
laboratório de Química. Foi tudo desmantelado para lá funcionarem
serviços da Câmara.
Terão que ser reconstruídas as salas de aula. Põe abaixo
e põe acima. É também para isto que servem os nossos impostos.
Não quero deixar de chamar a atenção para a escada que a
Câmara construiu para ter acesso aos seus serviços.
A actual Comissão Executiva vai tratar de pôr tudo em
ordem.
|