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        FUNDAMENTOS 
        
        
        O CORPO E O MOVIMENTO 
        
        
        «O corpo fala pelo movimento em fases com uma 
        acentuação com hesitações, transições, pausas e 
        chega mesmo ao silêncio.» 
        
        
          
        
        
        O Homem dispõe do seu corpo para agir e para exprimir em 
        presença de situações às quais se deve ajustar e não somente reagir. 
        
        
        Ter a noção exacta e real do que é a expressão pelo 
        movimento do corpo, impõe, em termos de estratégia, uma preparação e 
        manutenção assídua, para que se efectue um trabalho fundamental de 
        consciencialização do corpo, sem a qual, a unidade mental e motriz do 
        comportamento é ilusória e não autêntica, como deverá ser. 
        
        
        Todo o corpo é importante para que a parte ou as partes 
        do corpo possam ser relacionadas no todo. 
        
        
          
        
        
        O MOVIMENTO NASCEU... 
        
        
        A criança apercebe-se do mundo que a rodeia pelo gesto, 
        explorando, comunicando, muito antes de aprender a andar e a falar. E à 
        medida que vai crescendo, vai-se lentamente integrando numa vida com 
        ritmo e gesto, até que surge o movimento expressivo executado sem 
        necessidade funcional ou de comunicação. A criança possui naturalmente 
        um vocabulário espontâneo de movimento, que necessita de experimentação, 
        a fim de evoluir para poder dominar a sua própria linguagem do corpo. O 
        uso da sua linguagem do corpo através de vivências de actividades 
        expressivas, a criança desenvolve a sua personalidade, afirmando-se, 
        libertando-se, para conhecer-se melhor, comunicar mais facilmente, ao 
        mesmo tempo que forma e desenvolve o seu sentido estético. 
          
        
        
        O JOGO DÁ-NOS... 
        
        
        O jogo é uma actividade séria, importante e catártica, 
        que pressupõe regras, onde se conquista autonomia e forma o carácter. 
        Por isso, qualquer animador de educação deve reservar grandes momentos 
        da sua prática utilizando a força educativa do jogo. É aqui que se criam 
        com facilidade mundos de ilusão, fundindo-se com o ambiente criado pela 
        imaginação e com o real. Deve-se dar ao jogo o estatuto potencial de 
        agente criador, não como fim, mas como meio de se chegar a um fim, onde 
        cada um se possa expressar para melhor crescer. 
          
        
        
        O GRUPO FORMA... 
        
        
        A comunicação é uma necessidade natural para ser 
        realizada uma integração social capaz. A troca de ideias e conhecimentos 
        e sua ponderação considera a existência do outro e promove o auto 
        conhecimento, armando o trabalho em comum de riqueza de iniciativas, 
        propostas, sugestões, discussões, para finalmente se encontrar 
        plataformas de actuação do agrado de todos. É dever do animador de 
        educação não deixar que aconteçam marginalizações, desacordos que levem 
        a recusas de actuação, autoritarismos que não consideram a opinião dos 
        outros, más distribuições das acções individuais, e discussões 
        
        
        / 62 / 
        prolongadas por falta de bases de relação entre os membros, dificultando 
        a ideia comum. 
        
        
        O homem, da mesma maneira que os animais, utiliza o 
        movimento em acções quotidianas em resposta às necessidades da vida; 
        assim as expressões primárias estão relacionadas com as funções 
        biológicas. 
        
        
        A dança foi uma expressão espontânea da vida colectiva, 
        muito antes de ser uma forma de arte. Nos povos primitivos dançava-se 
        como manifestação emocional, traduzindo impressões vividas. Além deste 
        fim socializante e unificador, que está inserido na dança, não podemos 
        deixar de frisar que a dança teve principalmente um fim de ordem 
        utilitária; ex.: as danças com fins medicinais, religiosos, bélicos, 
        etc... Os seres "primitivos” acreditavam que imitando os acontecimentos 
        que desejavam ver realizados conseguiriam torná-los reais. Estas danças 
        imitativas deram lugar a um simbolismo convencional. A própria vida 
        passa do instintivo para o codificado. Um exemplo bem elucidativo da 
        substituição das formas instintivas pelo simbolismo gestual onde tudo 
        está previsto, desde a posição das mãos aos detalhes do vestuário, são 
        as danças na Índia. O dançarino ou a dançarina tornou-se (neste caso) 
        num instrumento estereotipado; toda a iniciativa ou expressão pessoal 
        estava-lhes interdita, tudo o que passasse além das regras impostas 
        tornava a cerimónia ineficaz. 
        
        
        No Ocidente surgiu o mesmo problema, mas indivíduos como 
        Jean Georges Nouvert, lsadora Dunkan, Delsarte, Jaques Dalcrote, Von 
        Laben, etc..., tentaram libertar a dança de alguma tirania clássica, 
        dando-lhe mais expressividade na transmissão das mensagens emocionais e 
        estéticas, tendo em conta o aspecto, originalidade e instintivo. 
        Considera-se contudo que tanto na dança como na expressão corporal, em 
        geral, as possibilidades de expressão dependem de um controle e de 
        disponibilidade que só podem ser obtidos duma formação muito prolongada. 
        Se esta formação não é profunda, cai-se facilmente na tentação de 
        proceder por tentativas de mecanização e de adestramento a que se pode 
        chamar "técnico". 
        
        
        Outra corrente afirma que dando um "certo espírito", e 
        tendo a intuição como ajuda, poder-se-á passar sem uma formação real e 
        atingir reais possibilidades expressivas. O essencial será utilizar a 
        dança criativa não sob os aspectos artísticos mas com fins pedagógicos, 
        permitindo assim ultrapassar o anátema desvalorizador que pesa sobre o 
        corpo há já muito tempo, o que é um motivo de dificuldades regressivas 
        no comportamento. 
        
        
        Sobre o jovem e a sua criatividade no movimento, na 
        dança, John Lindstone diz que, «pouco importa a facilidade que um jovem 
        tem na forma como dança, porque ele não recebe qualquer benefício 
        criativo duma experiência em que seja forçado na interpretação 
        tradicional duma determinada forma de dança ou num material coreográfico 
        estranho à sua criação.» Ele poderá até receber outro tipo de 
        aquisições, como a possibilidade de transmitir ideias de outrem; mas é 
        só através de uma completa expressão de si próprio que o jovem chega a 
        uma verdadeira libertação e exaltação de alegria, que provém de um 
        factor muito importante para ele: é o facto do seu depoimento artístico 
        ser inteiramente obra sua. 
        
        
        Desde o nascimento, o movimento é para a criança a sua 
        forma mais importante de expressão. 
        
        
        E mesmo quando a palavra se torna o melhor veículo dessa 
        expressão, ela volta 
        
        / 63 / 
        constantemente ao movimento e ao gesto como variante ou reforço das suas 
        intenções. 
        
        
        De facto, é pelo gesto que a criança consegue, a maior 
        parte das vezes, encontrar a mais profunda e verdadeira manifestação das 
        suas emoções. 
        
        
        O saltitar a caminho de casa, vinda da escola, é uma 
        expressão de exuberância, conforto e alegria interior que ela não 
        saberia encontrar em palavras, e o mesmo acontece quando num caso de 
        prostração ou desconfiança ela executa um movimento típico de balanceio 
        agitado. 
        
        
        Conforme vamos crescendo, mesmo assim, marcamos os nossos 
        estados de emoção ou sentimentos com movimentos, tendo em conta um 
        determinado comportamento que nós consideramos mais apropriado ao 
        momento ou tipo de situação que escolhemos viver ou jogar. 
        
        
        A criança, no entanto, não hesita em revelar 
        imediatamente os seus sentimentos e acções através dum movimento que é 
        desinibitório e honesto. 
        
        
        O próprio movimento espontâneo e desacertado do 
        gesticular do bebé é, sem dúvida pela sua vitalidade e libertação, a 
        mais real identificação de si mesmo e o melhor indicador do seu estado e 
        das suas emoções. 
        
        
        Basta-nos observar o recreio numa escola, para nos 
        apercebermos da importância do vigor com que a criança se move 
        alternando o seu estado mais enérgico com o de descanso; e a confiança, 
        graça e destreza com que se movimenta, correndo, escorregando, pulando, 
        saltitando, a criança encontra uma enorme libertação saudável de energia 
        física, e é também através de movimentos emotivos que ela obtém a mais 
        real exteriorização da sua sensação mais profunda. 
        
        
        Partindo dos seus movimentos naturais e da forma de 
        expressar as suas emoções pelo movimento, até a sua aproximação à dança, 
        a criança demonstra a importância que o sentir tem, como factor de 
        transformação dum movimento elementar natural, num movimento de 
        criatividade. 
        
        
        Não é só o facto de ser capaz de construir o seu próprio 
        movimento mas, é sobretudo, o aspecto global de que a criança se envolve 
        no interesse de criar a sua própria forma de expressar-se pelo 
        movimento, tomando consciência da importância da sua iniciativa e da 
        forma como a aguenta. 
        
        
        A criança que explora a expressão pelo movimento dá-se à 
        alegria e à confiança de cada gesto, cada movimento é uma criação sua, é 
        ela. 
        
        
        A criança não deve ser forçada a aperfeiçoar determinado 
        estilo, ou determinado passo, mas sim encorajada a criar a sua própria 
        expressão pelo movimento que nasce da sua exploração; do seu sentir, da 
        sua própria maneira de se mover sempre originalmente sua. 
        
        
        O jovem chega-nos à escola secundária, na maior parte dos 
        casos, ou intimidado, assustado, ou até com vontade de executar 
        movimentos que foram sendo reprimidos por questões de educação. Mas é 
        justamente nesta ocasião que o jovem pode pôr em prática o seu 
        repertório de movimentos apreendidos funcionalmente, dar conta do 
        espaço, da sua energia e do tempo, para mais facilmente chegar à 
        exploração dos movimentos comunicativos e expressivos. 
        
        
        Só que nem sempre é capaz, porque ao entrar na 
        adolescência entra num mundo onde a competição e a exigência exagerada 
        são chaves mestras, onde é responsabilizado 
        
        / 64 / 
        pelo que faz e pelo que não faz. 
        
        
        Cabe-nos também a nós, professores, fazer com que o jovem 
        se desenvolva harmoniosamente, com algum rigor comportamental (o que é 
        difícil, porque a sociedade é muito pluralizada e torna-se difícil 
        encontrar uma uniformidade pedagógica), ao mesmo tempo que se explora em 
        todos os aspectos ligados à expressão dramática, não esquecendo nunca o 
        verdadeiro significado da liberdade, com constante adaptação aos 
        contextos sociais e culturais de cada adolescente. Pensar / geometrizar 
        mentalmente imagens expressivas / projectar a imagem com o movimento do 
        corpo – tudo isto faz parte de um mundo sem limites, um mundo de 
        liberdade do imaginário. 
        
        
        As imagens não podem ser submetidas a leis. Elas estão 
        fora do mundo das regras e das convenções sociais, por serem únicas, por 
        fazerem parte do que cada um tem mais íntimo. Criticá-las em nome de 
        dogmas ou conveniências, é cometer um atentado contra a vida, tal como 
        elas se manifestam nas suas formas mais perfeitas, a vida do imaginário 
        / através do corpo e sua expressão porque a expressão é a exteriorização 
        de emoções e isso não se ensina. 
        
        
        A criação de uma imagem é a primeira expressão visual de 
        um impulso – pode ser de origem visual ou literária, toma a forma de um 
        esboço mental que se transmite ao corpo e fica assim criado um quadro 
        que o corpo irá registar num "momento decisivo". 
        
        
        Espaço não significa apenas o espaço físico de trabalho, 
        importa considerar igualmente o espaço objectual e o espaço do corpo, ou 
        seja o jogo de combinações materiais e semânticas produzido pela 
        aproximação entre o corpo e os elementos que o envolvem. 
        
        
        O espaço das imagens físicas e vivas com a evocação de 
        uma multiplicidade de referências. 
        
        
        E para além de tudo, os espaços ilusórios que dão corpo 
        ao corpo. 
        
        
        Os rostos são máscaras que produzem a identidade 
        retratável dos sujeitos. As máscaras são reveladoras no sentido estrito 
        do termo, porque sem elas a identidade do sujeito não toma corpo. O acto 
        expressivo quando acontece, torna-se aqui uma forma de demiurgia. 
        
        
        No princípio a imagem fotográfica trazia consigo a 
        promessa de reter o sujeito. O sujeito era a imagem e a imagem era 
        avaliada segundo a capacidade de retenção aferida por critérios 
        subjectivos de adequação entre a coisa impressa e uma ideia de si 
        próprio ou de outrem. Mas a coisa impressa era sempre um corpo onde o 
        sujeito se mostra. Então, no processo que faz a imagem ser o movimento 
        expressivo, trata-se de uma "fantasia" que serve de recurso conceptual, 
        incorporando artefactos sensoriais, acabando como arte, corpo 
        generativo, como tende ser, cada vez mais, aquele com que cada um veio 
        ao mundo, no mundo presente. 
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