A família das CYPRAEAS
Estas conchas são, sem dúvida, as mais conhecidas e
talvez as mais apreciadas pelos coleccionadores dedicados à conquiologia.
Isto deve-se à sua forma peculiar, à sua natureza brilhante e ao seu
colorido, a que se juntam desenhos naturais de grande beleza e
variedade.
Os franceses dão-lhes o nome de porcelanas por causa da
textura e do seu brilho, o que as aproxima das belas peças de porcelana
feitas pelo homem. Nós, contudo, vamos mais além e relacionamos a
palavra com o latim Porcellus e Porcella, diminutivo para
designar o bacorinho e a porca pequena. Estabelecemos estas ideias não
só pelo aspecto da concha e do seu brilho, mas também pela própria forma
como termina a abertura da parte dianteira do molusco, semelhante a um
pequeno focinho de porco.
Os ingleses chamaram-lhes cowries, vocábulo que
deriva de cauri ou caurim, que foi o nome dado a estas
conchas que serviam de moeda na Polinésia e assim foram utilizadas
noutras partes do mundo, designadamente na África ocidental.
A maior parte das 180 espécies é constituída por conchas
relativamente comuns nos mares tropicais. Algumas são muito raras. Têm
vida e actividade nocturna, são hervíboras, alimentam-se de hidróides, e
algumas espécies nutrem-se de pólipos de coral e de gorgónias.
Há de tal maneira interesse por estas conchas que, na
Austrália, se publica uma revista exclusivamente dedicada às Cypraeas.
Por isso, constituem o objecto de muitas monografias e de numerosas
associações.
Esta concha dura e brilhante atraiu e impressionou os
povos primitivos de tal modo que eles se serviram dela como ornamento,
como moeda ou como símbolo religioso. Aliás, ainda hoje a podemos
encontrar formando colares a ornar o peito de certas mulheres africanas,
o seu cabelo e até certas peças de vestuário. Além disso, certas armas e
escudos de alguns povos africanos, bem como alguns instrumentos musicais
(ex: a cora) são ornamentados com pequenas cipreias.
Entre nós, aparece em muitas praias portuguesas, talvez a
mais pequena cipreia conhecida no mundo. Trata-se da Trivia europaca,
que designamos por beijinho que, de acordo com as manchas escuras
do dorso, entra diferentemente nos jogos do amor entre os namorados. Os
franceses chamam-lhe grão de café (grain de café), piolho do mar
(pou de mer) e virgindade (pucelage). É uma pequena concha
de 5 a 10 mm, com estrias finas e de cor cinzenta rosada, com duas ou
três manchas escuras na parte superior.
A Cypraea moneta ou concha-moeda
Para além das indicadas, existiu também uma outra forma
de dinheiro-concha que constituiu o dinheiro para o comércio durante
séculos e manteve uma circulação notável quase no mundo inteiro, desde o
Oriente até à costa ocidental da África e até à América. Era o chamado
dinheiro-búzio, que ainda hoje é utilizado em paragens remotas
por povos primitivos. Eram pequenas conchas de cor amarelada, da família
das Cypraeas, classificadas como Cypraea moneta, muito abundantes
nas águas mornas do Oceano Índico. Estes búzios tiveram larga
utilização, como moeda corrente, até ao século passado, em Bengala, na
China e no Sião.
Ao longo das costas de África e dos seus rios, a seguir
aos árabes, apareceram os navegadores portugueses, ingleses, espanhóis,
franceses e holandeses, e todos praticaram negócios utilizando os búzios
que, a pouco e pouco, se vieram desvalorizando.
À cipreia moneta, como dinheiro-búzio, originária
do Oceano Índico, veio juntar-se uma outra, a Cypraea annulus,
também chamada búzio-anel ou anel de ouro, pelo traço dourado visível
sobre o dorso, também originária das costas orientais da África, onde
era colhida, sendo depois utilizada na costa ocidental pelos mercadores,
onde também qualquer das ditas conchas era designada por cauri. O
curso dos cauris esteve assim subordinado a flutuações que dependiam da
lei da procura e da oferta.
Apesar da concha, como valor monetário, ter vindo das
zonas orientais, o certo é que o Rei do Congo também resolveu instalar
os seus representantes junto ao Atlântico para aí se fazer a recolecção
de búzios. Na verdade, Capelo e Ivens, no Capítulo I de “Angola à
Contracosta", ao fazerem referência à cidade de Luanda, indicam "a
ilha, espécie de quebra-mar de areia" (...) "outrora importante pela
colheita do cauri", búzio ou zimbo, como é ainda conhecida nessa costa. |