Escola Secundária José Estêvão, n.º 15, Set.-Dez. de 1995

Foram distribuídas pelas escolas, orientações para a gestão dos programas do ensino secundário. Foram também distribuídas indicações e instruções sobre os exames de cada uma das disciplinas, tal como tinha sido definido no ponto 16.1.2 do Regulamento anexo ao Despacho Normativo 55/95 de 19 de Setembro. Esta orientações devem ser seguidas com atenção e a sua leitura deve ser cruzada com as indicações expressas nesse Despacho que regulamenta os exames finais do ensino secundário. Em especial, convém ter presente em todas as planificações (em especial do 12.º ano) que "as provas incidem sobre o programa do 12.º ano, podendo avaliar conteúdos dos restantes anos que com ele estejam directamente relacionados." (16.1. do Regulamento). Ora algumas disciplinas, em especial a Matemática, viram o programa do 12.º ano adaptado especialmente para este ano nas orientações para a gestão dos programas. Vários grupos disciplinares (apoiados pelo Conselho Pedagógico) levantaram dúvidas e preocupações sobre a aplicação deste Regulamento aos exames das respectivas disciplinas.

Para apoiar a reflexão da comunidade escolar sobre essas orientações, transcrevemos as indicações gerais que o Departamento do Ensino Secundário enviou às escolas. (NR)



O que são as orientações para a gestão dos programas?

Não são programas novos nem programas mínimos, no sentido tradicional.

As orientações para a gestão dos programas consistem na prescrição dos objectivos e conteúdos essenciais, com a indicação do grau de aprofundamento necessário e algumas sugestões metodológicas.
 

O que visam as orientações para a gestão dos programas?

As orientações para a gestão dos programas têm em vista garantir o cumprimento dos programas com uma unidade mínima a nível nacional. Pretende-se, assim, que:

– os professores centrem o seu trabalho com os alunos nos objectivos e conteúdos essenciais;

– os alunos, independentemente da escola que frequentaram, se apresentem aos exames finais nacionais em condições de relativa igualdade.

Naturalmente, tais efeitos não são automaticamente produzidos pelo facto de serem enviadas para as escolas as orientações para a gestão dos programas. O professor e o grupo de professores da mesma disciplina têm, aqui, um papel fundamental e insubstituível. Só eles poderão potencializar a utilidade das orientações para a gestão dos programas e garantir que tais efeitos desejados se produzam.
 

O programa no currículo

A educação é uma acção intencional, orientada para finalidades que se ligam a metas sociais. No seu conjunto, o sistema educativo deve responder àquelas finalidades. O ensino secundário, enquanto subsistema, assume a sua quota-parte através dos seus objectivos gerais que, no conjunto, configuram o perfil do aluno do ensino secundário.

Definido o perfil do aluno do ensino secundário, está encontrado o primeiro elemento do respectivo currículo. Os restantes elementos (conteúdo do ensino, objectivos de aprendizagem, metodologias e regime avaliativo) devem ordenar-se com vista a assegurar a realização, em cada aluno, do referido perfil. Encontrá-los corresponde a responder às questões: o que ensinar? como ensinar? o quê, como e quando avaliar? / 16 / o que ensinar? Responder a esta questão consiste em colocar outra: que áreas do saber são mais aptas para assegurar a concretização do perfil desejado? Na resposta fica desenhado o plano de estudos enquanto elenco de disciplinas e áreas disciplinares que, no seu conjunto e nas suas interconexões, asseguram os saberes, as competências, as habilidades e destrezas, as atitudes e os valores constantes do perfil do aluno do ensino secundário que se quer formar. Daqui resulta uma constatação: as disciplinas não estão no currículo por fatalismo ou tradição, nem sequer pelas suas qualidades intrínsecas ou por um pretenso valor absoluto. Estão no currículo porque cumprem nele uma função: assegurar um contributo para o perfil de formação desenhado.

E se é assim há uma nova questão a colocar: quais os elementos de cada uma das disciplinas escolhidas dão um contributo real e significativo para o perfil de formação? Só esses interessam!

E porque não se pode ensinar tudo (o plano de estudos já representa uma selecção com o que este conceito abarca: incluir uma e excluir outras), teremos até de encarar uma nova interrogação: da listagem dos elementos das disciplinas que interessam quais são os mais significativos, os que oferecem um maior potencial formativo (não em absoluto mas por referência ao perfil de formação desejado?)

A nossa listagem diminuiu e eis-nos chegados ao programa: um conjunto de objectivos e conteúdos seleccionados em função da sua relevância para o perfil do aluno do ensino secundário, ao qual se juntam metodologias consideradas aptas para optimizar o contributo da disciplina e garantir que ela cumpra o papel que lhe cabe no currículo.

Daqui deriva que o programa deve ser cumprido e, por isso, a sua natureza prescritiva.

Deve ainda ter-se em conta que um programa não consiste em listagens separadas de objectivos, de conteúdos, de orientações metodológicas, de práticas avaliativas. a programa tem - deve ter - um carácter sistémico, em que estes quatro elementos constituam uma totalidade dinâmica e interdependente. Daí que cumprir um programa significa, a cada momento, respeitar – reconstruindo-a permanentemente e em função das circunstâncias da sua aplicação – esta unidade sistémica. Assim, por exemplo, evitar práticas laboratoriais no tratamento de um dado conteúdo devido a preocupações de economia de tempo, pode conduzir, numa disciplina científica, à não apreensão do conteúdo pelo aluno e a impedir a consecução dos objectivos com ele relacionados. Práticas curriculares como a descrita são, então, outra forma de contribuir para que a disciplina não cumpra, de facto, a sua função no currículo e, por isso, não dê o contributo que podia/devia para a consecução do perfil de formação do aluno do ensino secundário.
 

O programa, o professor e o contexto da aprendizagem.

Em Portugal os programas são, na sua Íntegra, prescritos nacionalmente e elaborados ao nível técnico-pedagógico e administrativo, isto é, o programa é fruto de decisões e escolhas feitas para o todo nacional (em função das características gerais dos contextos sócio-económico e cultural nacional e dos alunos seus destinatários).

Mas o programa vai à prática num contexto particular, tem como destinatários uns alunos específicos e a mediação de um professor-indivíduo.

Estamos perante uma contradição insanável?

Parece-nos que não. Se o geral está no particular embora não o defina, então o programa nacional pode ser objecto de uma aplicação contextualizada e, por esta via, abre-se a possibilidade de o professor assumir um papel de agente de reelaboração curricular: tomar as decisões necessárias para garantir o cumprimento do programa nacional adequando-o às características do contexto da acção educativa e dos seus alunos e turmas.

As disciplinas são projectos de trabalho, itinerários de aprendizagem, mas todos eles constitutivos do itinerário que todos e cada um devem percorrer.

O que se chama "programa" da disciplina é um mapa / 17 / que assinala os pontos de visita obrigatória, algumas vias de passagem de uns pontos para outros, alguns marcos indicativos de percurso.

E tal como num mapa, os trajectos, a ordem dos lugares a visitar são, por vezes, únicos, outras vezes alternativos, assim, numa concepção e prática de currículo adequadas, há uma margem de autonomia que, no itinerário das disciplinas, tem que ser deixada aos alunos.

Com efeito, por vezes, haverá uma consequência necessária e, portanto, obrigatória entre um ponto e outro. Noutras vezes, porém, a consequência do itinerário poderá ser, e convirá que seja, guiada pelos interesses e pelos conhecimentos próprios de cada aluno assistido pelo professor. Como em todos os itinerários, há lugares de visita guiada e lugares em que a visita poderá ser apenas "assistida"; uns terão que ter o seu tempo marcado e próprio, comum a todos; os outros poderão ser deixados mais à iniciativa individual.

Consequentemente, metodologias e regime avaliativo têm também que ser diversificados, de modo a que acompanhem o ritmo e a ordem de todos e de cada um. Nem todos visitarão todos os lugares pela mesma ordem, na mesma altura, pela mesma via de entrada. O essencial é que, no fim, todos tenham feito o itinerário, pelo menos nos seus lugares essenciais, e tenham feito a organização interior que dá unidade e sentido ao seu percurso pessoal.

Cumprir o programa de uma disciplina é, pois, visitar lugares essenciais que todas as pessoas de uma comunidade nacional devem conhecer. Mas, no contexto de cada escola, de cada aluno, há lugares próximos e particulares que desembocam em objectivos de conhecimento, de atitudes, de valores, etc., idênticos e comuns aos de outros lugares.

É por isso que não há necessariamente contradição entre "cumprir o programa", que é geral, e atender aos percursos particulares e mesmo individuais. Para atender ao particular não é preciso ignorar o programa. Pelo contrário. O programa é, precisamente, o apelo para que se vá ao geral por vias particulares.

E é essa também a razão pela qual não se deve seguir literalmente um manual. O manual é sempre um percurso particular, resultante, normalmente, de uma certa prática contextualizada do seu autor. Poderá, por vezes, ser útil e, noutras vezes, totalmente inadequado a outro contexto – outros alunos, outra escola, outra comunidade, outro professor. Não há dois contextos iguais, bastando para tal como acontece de facto, que não haja dois alunos nem dois professores iguais. Em termos de aprendizagem, a sujeição ao manual é apenas uma maneira desviada de manter a prática do "livro único".

 

O programa, o professor e a escola.

Compete ao professor adequar o programa ao contexto da aprendizagem e às características dos alunos. E só pode fazê-lo com êxito se tiver um bom conhecimento do programa, do meio sócio-económico e cultural e dos alunos. E isso implica:

a) estudo e pesquisa: do programa (opções fundamentantes, esquemas conceptuais, tipos de conteúdos e objectivos, estrutura de relações entre os conteúdos, organização e sequencialização dos conteúdos, avaliação da importância relativa de objectivos e conteúdos, relação sistémica de objectivos e conteúdos, relação sistémica objectivos conteúdos-metodologias-avaliação, gestão temporal recomendada); do contexto (actividades económicas, estilos de vida das famílias, profissões e grau de instrução dos pais dos alunos, clima da escola, recursos disponíveis, etc.); dos alunos (aprendizagens anteriores, características psicológicas, motivações e interesses, formas de ocupação dos tempos livres, estilos e dificuldades de aprendizagem, etc.);

b) análise e avaliação de todos esses dados;

c) explicitação das implicações para a acção educativa dessas informações (que obstáculos? que dificuldades? que oportunidades? que alternativas de acção?);

Só após, o professor está em condições de fazer opções conscientes e fundamentadas acerca da orientação a seguir para a necessária contextualização / 18 / do programa. É uma tarefa ciclópica, uma missão impossível para o professor?

Mas porquê considerá-la como tarefa do professor individualmente considerado? O professor é membro de uma organização chamada escola, no interior da qual se organiza em grupos em função de afinidades profissionais num sentido restrito.

Se todos os professores da mesma escola têm de estudar o mesmo meio sócio-económico e cultural e caracterizar a mesma escola é razoável que o façam cada um por si? Um grupo de trabalho coordenado pelo Conselho Pedagógico pode fazê-lo e disponibilizar o estudo a todos os professores da escola.

Se um grupo de professores da mesma disciplina tem de aplicar o mesmo programa, cada um tem de o estudar, analisar, tomar decisões em relação a ele. Não será lógico que o façam em conjunto, no Conselho de Grupo ou em subgrupos do mesmo Departamento Curricular?

Se um grupo de professores dos mesmos alunos têm de fazer o diagnóstico da mesma turma e dos mesmos alunos, porque não fazê-lo em Conselho de Turma, sob coordenação do respectivo Director de Turma?

A vantagem mais evidente da metodologia que aqui sugerimos consiste na economia de esforços e de tempo para cada um dos professores. Mas importa salientar também outra vantagem de enorme valia: passar a existir uma unidade educativa mínima no modo como, a diferentes níveis, os professores da mesma turma orientam as suas decisões e as suas acções.

 

O programa, o professor e os exames nacionais.

Os exames nacionais, é inegável, têm efeitos condicionantes sobre as práticas curriculares dos professores, tendendo a pressionar no sentido de as centrar sobre os conteúdos e objectivos de natureza cognitiva e, ainda, no sentido de fazer diminuir as preocupações com o respeito pelos ritmos diversificados de aprendizagem dos alunos e com uma pedagogia diferenciada que apoie adequadamente os alunos com dificuldades de aprendizagem.

Mas tem que ser assim? Pensamos que não, embora também admitamos que, nas circunstâncias do mundo actual com a consequente mudança do papel cultural e social da educação, a avaliação das aprendizagens a nível nacional poderá revestir outras modalidades que não a do exame feito nos moldes tradicionais.

Os exames nacionais – é também inegável – tendem a pressionar o professor no sentido de uma aplicação mecânica dos programas, devido ao receio de tomarem decisões que venham a colocar os seus alunos em desvantagem na situação de exame (por exemplo, ter aprofundado menos uma dada temática). E a verdade é que a existência de uma relativa unidade no modo como, a nível nacional, os programas são leccionados é uma condição indispensável para que as próprias provas sejam elaboradas com segurança. Significa isto que a existência de exames nacionais impossibilita a assumpção, pelo professor, do seu papel de adequar o programa ao contexto da sua aplicação e aos alunos a que ele se destina? Também pensamos que não. Basta que sejam dadas ao professor indicações claras que lhe permitam balizar, com segurança, as suas escolhas e decisões relativamente ao modo de cumprir o programa adequando-o ao contexto e aos seus alunos.

O Ministério da Educação, através do Departamento do Ensino Secundário em colaboração com os professores e as escolas, está empenhado em definir com clareza os núcleos significativos de objectivos e conteúdos considerados essenciais, de modo a que, dados a conhecer aos professores, estes possam:

a) centrar a sua acção nesses núcleos e desenvolver, em relação a eles, uma pedagogia diferenciada que evite a discriminação dos alunos com dificuldades de aprendizagem;

b) fazer uso da sua autonomia de reelaboração curricular, adequando o programa ao contexto e aos alunos com respeito por tais núcleos, sem receio de vir a prejudicar os seus alunos. ■

(DES)
 

Aliás, Escola Secundária José Estêvão

 

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