Henrique J. C. de Oliveira

VI - REFLEXÕES CICLÍSTICAS E NÃO SÓ...
ou
DA DIALÉCTICA AMOROSA ENTRE UM MIÚDO E UMA BICICLETA

Ciclismo

Há na vida do Homem acontecimentos bons e maus, que ocorrem pelas mais diversas razões. Felizmente que a tendência geral consiste em guardar na memória as boas recordações, deixando os acontecimentos funestos bem escondidos no canto mais recôndito da memória. 

E ainda bem! As tristezas não pagam dívidas. Se tal sucedesse, passaríamos, todos nós, a maior parte do tempo a carpir-nos, ainda que dívidas não tivéssemos. As tristezas não pagam dívidas e os pensamentos devem ser positivos, para que possamos pedalar mais descontraidamente ao longo desta corrida que é a vida. Todavia, por vezes, há alguns acontecimentos funestos que fogem à regra geral. Tal como o azeite misturado na água, teimam em vir à superfície. Talvez para melhor nos fazerem apreciar, por contraste, os bons momentos e as coisas boas deste mundo.

Mas, e voltamos a esta conjunção bastante adversa e pouco tranquilizante, a verdade é que os acontecimentos funestos ocorrem pelas mais diversas razões, mesmo sem necessidade da aliança da duas poderosas forças que já referimos. Há, para mal da Humanidade, forças funestas que ocorrem imprevistamente, sem necessidade da maluqueira bélica do Homem. Precisam de provas? Estão a ver onde quero chegar? Para não nos alongarmos e voltarmos a ciclar, vejamos os dois exemplos que passo a recordar-vos.

Quando a Terra que pisamos fica com excesso de pressão nas entranhas, o que é que faz? Precisamente o mesmo que nós, só que de maneira por vezes mais desagradável e desastrosa! Alivia-a frequentemente de maneira pouco amigável. E lá se vai tudo quanto lhe anda no dorso. Lá se vão as cidades e as vidas dos que as construíram!

Quando o deus das meteorologias se zanga, se enfurece e se põe a soprar desalmadamente com quantas forças tem, lá vem um tufão ou um ciclone feminino, que devasta regiões inteiras, arrasando em poucos segundos o que o Homem levou dias, meses e anos a construir. E a propósito, já repararam que todos os ciclones, tufões e fúrias quejandas do deus dos ventos têm nomes femininos? Porque será? Por reminiscências da punição que Eva fez recair sobre Adão?

O acontecimento funesto que agora nos interessa foi o resultado apenas da convergência daquelas duas forças poderosas de que anteriormente falámos. O miúdo da nossa história não conseguiu fugir-lhes, apesar de, assiduamente, ouvir os ralhetes da mãe, cujo coração há muito a avisava e a levou a reparar receosamente no namoro entre ele e a bicicleta: «Não mexas na bicicleta. Deixa-a estar quieta, que ainda te aleijas!»

A verdade é que o namoro foi ficando cada vez mais frequente e os ouvidos cada vez mais insensíveis aos avisos da mãe, que lhe entravam por um lado e saíam pelo outro.

Mas, afinal, o que é que se passou? Já falámos de milhentas coisas, de ciclones e de tufões, e continuamos na mesma!

Têm toda a razão! Começam a ficar impacientes e desejosos de saber qual o acontecimento funesto, que impediu o miúdo de aderir a uma nova modalidade desportiva, radicalmente diferente do ciclismo.

Será que pegou na bicicleta, que estava muito descansada ao canto da sala, foi para a rua e se enfiou contra algum dos raros carros que então circulavam nas ruas da vila? Ou será que, ao andar na rua, naquela bicicleta de puro sangue inglês, mas de pneus vazios, se estatelou no chão e foi parar às urgências do hospital?    >>>

 

 

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