HOMEM
CRISTO E O LICEU DE AVEIRO
(actual Escola Secundária Homem Cristo)
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Mais
adiante, já quase no final da segunda coluna, volta a recordar a
importância do edifício como instituição de ensino para a cidade
de Aveiro:
«...
O liceu não representa para nós uma casa qualquer, grande ou não
grande, bela ou não bela. O liceu é já hoje uma tradição
histórica que importa venerar, sob pena de sermos considerados no
país um povo indigno e bestial. O liceu é um monumento, e os
monumentos, onde há civilização, onde há liberdade, onde há uma
nímia ideia do que seja adiantamento e progresso, não se derrocam
nem se estragam; aperfeiçoam-se e conservam-se. O liceu é um
título de gratidão que tem Aveiro para com o espírito brilhante
mais brilhante desta terra, e Aveiro que foi tão ingrata com o
eminente tribuno enquanto vivo, que lhe tem sido tão pouco grata
depois de morto, não pode tocar na obra desse grande patriota sem
se degradar, sem se abandalhar de todo.
Foi
José Estêvão que planeou o liceu. Foi José Estêvão que o fez
com o seu espírito, com a sua dedicação extrema. José Estêvão
amou aquilo. E haveis de ser vós hoje, ó vândalos, que haveis de
espezinhar a obra de José Estêvão? E há-de esta cidade consentir
que se toque no que foi anelo e amor
do
nosso grande tribuno? E não há-de haver aí um povo, uma imprensa,
qualquer força moral da nossa terra que se oponha com toda a
energia a um vandalismo tão vergonhoso e cruel? (...)»
Este
segundo artigo, que deveria constituir o fim da tomada de posição
de Homem Cristo sobre o problema da desactivação do liceu,
dando-lhe outras funções, termina com a sua promessa de entrar na
liça: «Pois entraremos na liça. Não valemos nada, bem se sabe.
Mas às vezes basta meia gota de água para que transborde o copo.
(...) Não terminaremos, porque nunca mais largaremos de mão esta
questão importantíssima.»
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No
quinto artigo saído no jornal «O Povo de Aveiro», n.º 306
de 25 de Novembro de 1887, verificamos que a polémica acerca
da mudança do liceu estava bastante acesa, tendo-se acentuado
«fortemente a opinião pública contra o projecto da mudança
do liceu». Neste mesmo número, Homem Cristo rebate as
opiniões surgidas em alguns jornais e o artigo termina com a
transcrição de três manifestos: manifesto da academia, da
representação pública e da representação da comissão
José Estêvão. |
No
primeiro documento, a classe académica toma a defesa da
manutenção do edifício como local de ensino e incita as pessoas a
não permitirem essa mudança. Dessas palavras passamos a
transcrever uns breves excertos:
«Pretende-se,
sob o falso pretexto de que a actual não satisfaz as necessidades
do ensino, construir uma casa para exercício da instrução
secundária, transferindo-se o liceu do majestoso edifício em que
hoje se encerra. (...)
O
nosso fim por enquanto é incitar-vos à resistência permitida
pelas leis do país contra essa resolução inesperada dos poderes
públicos. É erguer bem alto um protesto solene contra o que
reputamos um erro de consequências inevitáveis. É varrer a
afronta que se quer arrojar à memória sagrada de José Estêvão.
É tentar impedir que se complete a desonra da terra, que derrotou
junto da urna o maior orador deste século. (...)
Cidadãos:
Não
acrediteis esses razões subtis. A casa do largo municipal provê as
necessidades do ensino. É um monumento. É um santo legado dum
patriota exímio. É herança sagrada de José Estêvão e isto diz
tudo.»
O
manifesto da academia termina com uma sequência de assinaturas e o
convite aos cidadãos aveirenses para assinarem a representação
que se encontra em toda a cidade, oferecendo a resistência que lhes
impõe a sua dignidade, o seu dever e a sua gratidão.
Os
dois manifestos seguintes apresentam um teor idêntico ao primeiro.
Limitamo-nos aqui a transcrever um pequeno excerto da tomada de
posição da comissão José Estêvão, enviada «ao Ilustríssimo e
Excelentíssimo Senhor Presidente da Comissão Executiva da
Junta Geral»:
«Como
v. Exª sabe tão bem como nós, o liceu actual é um título de
gratidão que possui a cidade de Aveiro para com o seu filho dilecto
e querido. Ninguém ignora a dedicação que teve José Estêvão
por aquele edifício e por aquela instituição e o amor que toda a
vida lhe votou. Ir-se desviar hoje do seu primitivo destino, é
matar as tradições gloriosas que lhe andam ligadas, e renegar o
legado do mais puro e abençoado espírito que surgiu nesta terra, e
desrespeitar uma casa que já é um monumento e praticar por
consequência um vandalismo e uma profanação que ao espírito
ilustrado e patriótico de V. Exª há-de repugnar
primeiro do que a nenhum outro.»
E
as palavras da comissão José Estêvão terminam com uma
sequência de frases apelativas, visando cimentar fortemente a
ligação entre a estátua de José Estêvão e o liceu que se lhe
ficou a dever, situado a uns escassos metros de distância no mesmo
largo da câmara:
«Deixai-nos
que a estátua de José Estêvão se erga defronte do nosso liceu.
Deixai-nos que o bronze e a pedra atestem o patriotismo do morto e o
patriotismo dos vivos. Deixai-nos que os dois monumentos,
o amor dum homem e a gratidão dum povo, sejam a nossa glória comum
nos dias de festa que se avizinham aí.
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