Neste capitulo, iremos tratar não só dos principais produtos da terra −
batata e milho −, como ainda dos diferentes instrumentos de trabalho
relacionados, em maior ou menor escala, com a agricultura. Também porque
muitos elementos foram recolhidos com a ajuda do meu informador, para
tornar menos monótono o desenvolvimento desta matéria e, ao mesmo tempo,
fornecer alguns dados de interesse linguístico, procurarei dar-lhe uma
forma dialogada, transcrevendo grande número de respostas obtidas em
longas conversas com o meu informador que, graças à sua paciência,
consegui registar. Como a recolha total e ipsis verbis de tudo me
era impossível (para isso o ideal seria a utilização de um gravador),
vi-me obrigado a pedir-lhe que repetisse muitas das suas frases.
Bastantes vezes vinham diferentes, o que me obrigava a ter de
transcrever por mim mesmo a ideia por ele expressa. Por isso, terei de
introduzir, em certos passos, palavras minhas na sua fala, que irão bem
destacadas e entre parênteses, distinguindo-as assim das que pertencem
efectivamente ao meu informador. Creio, por este meio, poder dar um
pequeno aspecto do que foi o meu inquérito e fornecer alguns elementos
da própria fala local que, doutro modo, ficariam lamentavelmente
perdidos.
As culturas mais importantes da região são, essencialmente, a da batata
e do milho, tendo ainda havido, em tempos, a da cevada. Há dois ou três
anos, foi muito cultivado o amendoim, que, tal como a batata, se
produzia em grande quantidade. Simplesmente, o seu gosto um pouco
diferente do normal e, por isso, desagradável − segundo uns, sabia a
escasso − fez com que a sua cultura tivesse diminuído consideravelmente.
− Quando é que se semeia o milho e quais os cuidados que é preciso ter
com ele? − perguntei ao Ti Melro.
− O milho, home, semeia-se à volta de treze ou quinze de Março. Depois
do milho estar de palmo, é mondado e sachado. Depois de já estar a
querer butar a bandeira, bota-lhe a gente adube e rega, para ele criar
espiga. Tem de se partir depois a bandeira para o milho não ficar tão
alto e o bento não balançar tanto com ele.
− Um momento, Ti Melro, há bocadinho, falou em bandeira. O que é isso?
− A bandeira, home, é a cana do milho.
− O Ti Melro tinha dito que era necessário partir a bandeira para o
milho não crescer muito. E, depois disso, o que é que se tem de fazer?
−
Depois, espera-se qu' amadure e apanha-se com uma foicinha. Bota-se no
tendal ('lugar onde o milho é acamado') às carradas. Depois esmanta-se e
traz-se a espiga p'rá eira. (A cana fica no campo a secar para depois
poder ser guardada no «cabanal» e servir de alimento para o gado. Quanto
às espigas, vão para a eira, onde ficam a secar ao sol).
− Mas se chove, o milho fica todo encharcado, Ti Melro...
− Não, home, quando chove põem-lhe por riba umas esteiras.
− E depois de seco, o que é que fazem?
− Vem então uma desbulhadeira para desbulhar.
Quanto à batata, é semeada nos princípios do ano, após a terra ter
sido cavada ou lavrada e convenientemente adubada. É colocada com
intervalos regulares de pouco mais de um palmo. Quando tem a altura de
alguns centímetros, é semeado o milho entre os espaços. Uma vez criada,
é arrancada e apanhada, ficando apenas o milho que, entretanto, nascera
nos espaços que separavam cada batata.
Além da cultura da batata e do milho, existe também muito feijão,
semeado por meados de Junho, «polo S. João», como disse o meu
informador.
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