Breve reflexão |
Vão ficar surpreendidos quando receberem um total de doze aerogramas e verificarem que a correspondência está incompleta. Acabei a escrita e o relato da chegada a Carmona com o meu regresso ao hotel e ida para o vale de lençóis. A madrugada ia já avançada e as pestanas começavam a dar sinal de fraqueza com uma frequência exagerada. Fiz-lhes a vontade. O dia de hoje foi relativamente tranquilo, tendo apenas como anomalia o facto de não haver luz eléctrica na vila. Segundo me disseram, verificou-se uma avaria no gerador e estão à espera que chegue uma peça para substituição. Estivemos à luz do petromax no Briosa Bar, quando lá fui com o médico a seguir ao jantar. E continuo a petromax aqui no meu quarto, iluminado por um candeeiro que me fornece uma luz forte e clara, não tão boa como a eléctrica, mas mesmo assim suficiente para iluminar perfeitamente os meus aposentos e me permitir uma escrita confortável. Se o gerador não se tivesse avariado, certamente ainda não estaria aqui a escrever-vos, porque hoje era dia de cinema em Quimbele. Sem electricidade, deixei o médico, com quem andei durante quase todo o dia. Emprestei-lhe o meu rádio, para ele se entreter a captar as ondas curtas e refugiei-me no meu gabinete de escritas, no sossego destas quatro paredes, para ficar mentalmente convosco. A caminho da metrópole já vão os doze primeiros desta carta. Como vão todos numerados no canto superior direito, continuando a sequência já iniciada há uns tempos, ser-vos-á fácil arquivarem os aerogramas pela ordem correcta. Quanto a mim, não me fazem falta, porque guardo as cópias a químico. Porque é que os enviei sem ter chegado ao final da correspondência? Para evitar ficardes aí sem notícias minhas durante demasiado tempo. Não tenho o direito de vos deixar uma semana inteira sem estas folhas amarelas, como aconteceu na semana anterior. E agora, porque estou desfasado cerca de uma semana, retomemos o registo da nossa ida a Carmona. |