No edifício do comando

Parte da manhã de quinta-feira passei-a no edifício do comando, no gabinete do capitão, para resolver o problema do levantamento do acampamento da Quimabaca. Foi até bom ter aceite a sugestão dos furriéis de vir a Quimbele trazer o correio. Poupou trabalho ao comandante de companhia. Ou a ele ou ao alferes Valério. Foi menos uma mensagem a cifrar e a mandar para o destacamento. E, para mim também, foram menos uns largos minutos a trabalhar com o livro das cifras e o papel quadriculado, para descodificar a mensagem. Este é um trabalho muito monótono. É muito mais aborrecido do que fazer palavras cruzadas. E então, quando nos enganamos na colocação de alguma letra! É um autêntico quebra-cabeças. Quando isto me acontece, prefiro recomeçar a decifração do princípio, do que estar à procura da quadrícula onde me enganei. E mesmo quando tudo bate certo, é por vezes necessário um certo exercício mental, para tentar perceber exactamente o que a mensagem diz, especialmente quando as mensagens, quase sempre em estilo telegráfico, omitem alguma palavra-chave.

Antes da conversa com o capitão, passei ainda pela secretaria, para cumprimentar o Sargento e o pessoal que lá trabalha. São pessoas que só vejo de vez em quando, quando vimos à civilização. E, mesmo assim, é preciso que o rei faça anos ou esteja algum santo para cair do altar. Mesmo assim, sempre que posso, procuro passar pela secretaria para cumprimentar o pessoal militar de carreira, o primeiro e o segundo sargento. São pessoas que têm quase sempre novidades interessantes. Ainda se lembram daquela vez em que recebi a notícia de que passávamos a ter o décimo terceiro mês e que fôramos aumentados? Não há como conversarmos com o pessoal militar de carreira, especialmente os sargentos, para ficarmos a par de tudo. São eles as engrenagens militares mais importantes para que a actividade se vá desenrolando. Pelo menos, são os elementos ideais para resolvermos as questões burocráticas e a quem devemos recorrer, quando surgem dúvidas.

No gabinete do capitão Alberto, a conversa andou quase exclusivamente à volta da retirada do meu pessoal da Quimabaca.

— Então como é, capitão Alberto? De acordo com o plano de actividades, na próxima sexta-feira temos de regressar à base.

— Levas a Berliet e fazes o inverso.

— Faço o inverso? O inverso de quê?

— Agora é fácil. Fazes o inverso do que fizeste quando para lá foste. Agora é fácil. É só desmontar o que montaste. É muito mais fácil e muito mais rápido.

— Nesse aspecto, tem toda a razão. É só carregar a tralha que levámos e desmontar as tendas. A trabalheira foi no início: marcar os locais, distribuir as áreas do aquartelamento, montar o refeitório e a cozinha, criar o plano de defesa, elaborar as escalas de serviço, em suma, a trabalheira habitual. Sigo hoje para cima e levo comigo a Berliet, não é?

— Não. Não é. Não podes levar ainda a Berliet. Precisamos dela, Tem andado em serviço.

— Então como é que faço? Sem ela não tenho onde trazer a tralha.

— Não trouxeste contigo o furriel Rodrigues? Não era ele que estava ontem contigo no cinema?

— Era.

— Então é fácil. Vais hoje para cima e deixa-lo cá com metade dos teus homens. Amanhã, começas a desmontar o acampamento. Ao fim da manhã, já lá deves ter o furriel com a viatura. Carregas e regressas aqui à base. Nada mais simples!

Estive ainda cerca de uma hora na conversa com o capitão. Não vou agora aqui pôr-me a relatar tudo quanto abordámos. Não há tempo para isso nem tem qualquer interesse dizermos que falámos dos recenseamentos, do sucesso da operação e de outras coisas que não são para aqui chamadas.

Antes de descer até ao fundo da vila, de ir saber da minha máquina e beber um fino, resolvi passar pela messe de oficiais. Quando entrei no quarto onde costumo dormir e guardar as minhas coisas, e que agora é o meu quarto permanente, enquanto permanecer em Quimbele, tive uma surpresa agradável. Estava lá o médico? Claro que não. A esta hora estava ele a fazer serviço no hospital. Então quem? Algum alferes destacado noutro sítio que já não vias há muito tempo? Também não! Então quem? Já vão ver!

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