O abastecimento de água

Por volta das 16 horas, estava um grupo a carregar os bidões num unimogue. Era preciso ir ao riacho buscar água para a cozinha e para os depósitos de abastecimento, todos eles formados por diversas baterias de bidões interligados, colocados em plataformas de madeira junto da cozinha.

— Alferes, vamos com o pessoal à água. Não quer vir? Aproveitamos para tomar um banho no riacho.

Aceitei o desafio do furriel Rodrigues. Antes de saltar para a viatura, dei as minhas indicações ao Donato, o único furriel que ia ficar no aquartelamento:

— Vou com o Rodrigues e alguns soldados ao rio. Quero conhecer o local onde nos abastecemos. E aproveito também para tomar um banho. Se houver algum problema, que não deve haver, o Donato assume o comando. De mais a mais, não tenciono demorar-me. Será o tempo mínimo indispensável para o pessoal encher os bidões.

O abastecimento da água faz-se a uns quinhentos metros do destacamento, numa linha de água que fica num vale, na base da colina em que se encontra o planalto do Alto Zaza. São uns quinhentos metros de trilho bastante íngreme, que se faz com certa lentidão e cuidado, para que os bidões não se voltem e caiam da viatura. Como os bancos foram retirados do centro da caixa para dar lugar aos bidões, os soldados vão sentados no chão, encostados aos bidões e com as armas sobre os joelhos. Embora a distância seja curta e as probabilidades de ataque reduzidas, nunca se anda sem a companhia das cartucheiras e das G3.

A água corre fresca e abundante, com uma ligeira coloração castanha, devido à argila que abunda em todo o território e que dá à terra angolana uma tonalidade avermelhada, que contrasta com o verde brilhante da vegetação.

Enquanto alguns soldados montam a segurança ao local, outros tomam banho e enchem os bidões, revezando-se nas actividades. Junto de nós, mulheres de GEs e miúdos andam na água. Andamos todos em pelote, mas ninguém repara em ninguém. É natural e habitual! Repararíamos se alguém andasse aqui bem vestido ou andasse enroupado dentro da água.

Foi um momento agradável de convívio entre soldados e nativos. Permitiu-me refrescar e ficar a conhecer as condições do local.

A linha de água é bastante frequentada pelos GEs e mulheres. É aqui que efectuam o abastecimento de água para a sanzala, usando os mais diversos tipos de vasilhas. É junto da linha de água que os nativos têm as lavras, que lhes fornecem os alimentos, de entre os quais se destaca a mandioca. É aqui que as mulheres vêm com os filhos pequenos às costas lavar a roupa. E o sistema que utilizam é em tudo muito semelhante ao que se passa com as lavadeiras de Portugal. Só o cenário e a cor das mulheres são diferentes. Os comentários e as risadas de boa disposição, resultantes das conversas a que não prestamos qualquer atenção, são em muitos aspectos idênticos aos das mulheres da metrópole.

Quando regressei ao quartel, estava também a chegar o grupo que fora a Camutebe buscar a viatura acidentada. O aparato do acidente fora maior que os estragos. Colocado o unimogue sobre as quatro patas, veio pelos próprios meios. Mas sem o guincho da berliet teria sido impossível retirá-la da posição crítica e do local em que esteve durante quatro dias.

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