Peças vitais

Como já puderam ver, ocupei uma boa parte da manhã a verificar com cada grupo as características dos abrigos e as melhorias a fazer. Já perto do fim da manhã, recebo a fraca notícia de um mecânico:

— Meu alferes, temos problemas com a motobomba. Ontem, quando o pessoal foi à água, avariou a meio do enchimento dos bidões. Estive ontem a desmontá-la e acabo de verificar que uma das peças está totalmente danificada e sem recuperação. E não tenho material de substituição.

— É fazer a requisição para a sede da companhia.

— Já me adiantei, meu alferes. Fui ao camarada do rádio e pedi-lhe para falar para Quimbele. Também lá não têm a peça de que preciso. Vão pedi-la.

— Estamos lixados! Quando acabarmos a comissão, temos cá a peça! Vamos ter de improvisar. Vais-me fazer um favor: vais ao cozinheiro pedir-lhe as latas de cinco litros do óleo alimentar. Arranja alguém para te ajudar. Cortas parte da tampa superior, de maneira a deixar a pega a toda a largura. E enchem-se os bidões à mão com estes baldes improvisados. Para ser mais rápido, levem mais pessoal no unimogue.

Uma hora depois, aparece-me novamente o mecânico no edifício do comando:

— Meu alferes, parece que a divina providência deu em nos tramar!

— A divina providência somos nós. O que há desta vez?

— Estamos também sem motosserra. Partiu-se a corrente e já não tem concerto.

— E o que queres que te faça? Não há machados na arrecadação? Faz uma nota de tudo o que faz falta para requisitarmos à Companhia. E, a propósito: estava um unimogue com problemas...

— Já estamos à volta dele. Hoje de tarde vai ser o meu passatempo. O alferes sabe que connosco não há avarias que resistam... desde que não sejam peças importantes e que existam para substituição. Conseguimos sempre resolver os problemas e pôr as viaturas a andar.

— Pois, já sei que os mecânicos são uma máquina! E espero que consigas sempre resolver as avarias e que não nos faltem peças vitais.

— Meu alferes, não, a gente cá não utiliza peças vitais. Têm de ser das fornecidas para o modelo de unimogue que cá temos.

— Claro, é isso mesmo. O que eu quero dizer é que é necessário que não nos falte material para reparar as viaturas.

O resto do dia passou-se praticamente sem tempo para aborrecimentos e tédios. Parte do pessoal esteve absorvido com o trabalho de melhoramento dos abrigos. Outros acharam que não tinham nada que melhorar e optaram pelo mais fácil. Foram jogar a bola ou ocupar o tempo como melhor lhes aprouve, apesar de lhes ter feito sentir que todos os abrigos têm sempre melhoramentos para fazer. Quanto a mim, ocupei-me a acompanhar e apoiar os que estavam preocupados com a segurança. E aproveitei também para aprender um pouco de mecânica. Embora pouco perceba, a minha companhia e pedidos de esclarecimento serviram de estímulo para o trabalho, sem contar que isto também me ajudou a passar o tempo.

Creio que não há nada mais a dizer relativamente ao dia 20, uma segunda-feira, começo da primeira semana de permanência a sós no Alto Zaza. Voltemos, pois, a folha da minha agenda, que os dois dias seguintes foram recheados de peripécias. Aliás, não foram só esses dois; toda a semana teve pequenas ocorrências que fugiram da rotina e que espero não voltem a suceder. Delas falaremos em breve. Por agora, vou interromper este aerograma, melhor dizendo, esta série de aerogramas. Vou descansar o pulso e desentorpecer as pernas. Vou ter com o pessoal que está a jogar futebol. Entretenho-me a vê-los jogar durante algum tempo, até à hora do almoço. De tarde, retomo a escrita, para ver se consigo pôr os meus relatos em dia. Até mais logo.

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