Henrique J. C. de Oliveira, Os Meios Audiovisuais na Escola Portuguesa, 1996.

 

A formação dos docentes


Um aspecto que ressalta da análise dos dados recolhidos pelas percentagens relativamente reduzidas é o que diz respeito à formação dos docentes. Embora estes dados tenham já sido analisados simultaneamente com os relativos à apresentação dos diferentes recursos educativos, importa agora apresentar um quadro com a síntese de todos valores obtidos e extrair as respectivas ilações.

O quadro 48 fornece-nos a síntese dos elementos já analisados sobre as principais áreas de formação abrangidas pelo inquérito aos docentes. Se alguns aspectos são de importância reduzida e, como tal, menosprezáveis, outros há que são de elevada importância para o ensino actual e deveriam constituir uma preocupação de actualização por parte dos docentes.

O primeiro aspecto relevante presente no quadro 48 é o que diz respeito à formação e actualização dos docentes na área dos recursos audiovisuais. De um total de 349 inquiridos, verifica-se que a percentagem de professores que indicaram nunca ter recebido qualquer formação audiovisual é ainda bastante elevada, alcançando 44,1%. Poderá isto significar que ou os professores não estão ainda sensibilizados para a importância dos recursos audiovisuais no processo de ensino-aprendizagem ou que esta área não tem sido suficientemente contemplada pelas acções de formação e actualização dos profissionais do ensino.

Dentro dos recursos audiovisuais de mais fácil utilização e com um certo impacto junto dos nossos alunos, como é o caso dos diaporamas e das gravações em vídeo, as percentagens de professores que indicaram nunca ter recebido qualquer tipo de formação atinge valores bastante elevados: 60,5% para os diaporamas e 72,5% para a utilização e exploração didáctica de gravações em vídeo.

SIM

%

NÃO

%

Formação Audiovisual rece­bida

195

55,9

154

44,1

DIAPORAMAS: Utilização e criação

138

39,5

211

60,5

VÍDEO: Realização/montagem

48

13,8

301

86,2

VÍDEO: Utilização e exploração didáctica

96

27,5

253

72,5

COMPUTADOR: Processamento de texto

179

51,3

170

48,7

COMPUTADOR: Utilização de programas de desenho

54

15,5

295

84,5

COMPUTADOR: Folhas de cálculo

64

18,3

285

81,7

COMPUTADOR: Programação (Linguagens de)

23

6,6

326

93,4

COMPUTADOR: Edição Electrónica (DTP)

12

3,4

337

96,6

COMPUTADOR: Utilização de software didáctico

54

15,5

295

84,5

COMPUTADOR: Utilização de aplicações multimédia

14

4,0

335

96,0

Quadro 48: Formação recebida pelos docentes e áreas de formação, independentemente dos níveis de ensino.


Se os 86,2% em relação à realização e montagem de programas didácticos em vídeo não nos causa qualquer surpresa, dado que esta actividade envolve um elevado número de aspectos que nem sempre estão ao alcance da maioria dos docentes, o mesmo já não poderemos dizer relativamente à exploração didáctica de videogramas já existentes. 72,5% de professores que nunca utilizaram o videogravador em situação de aula afigura-se-nos um valor excessivamen­te elevado, cujas causas deveriam se objecto de análise num trabalho específico, centrado exclusivamente na utilização do videogravador como recurso pedagógico e abrangendo um significativo número de docentes de diferentes regiões do País.

Verificámos através do primeiro inquérito aos conselhos directivos de todas as escolas do distrito de Aveiro que o videogravador é um dos sete recursos existentes a 100% nos estabelecimentos de ensino a partir do 2º ciclo do ensino básico. Se esta mesma situação se não verificar em todos os distritos do País, pelo menos o videogravador deverá manter-se dentro dos recursos com percentagem elevada de dotação. Assim sendo, como explicar uma tão reduzida percentagem de utilização do videogravador pelos docentes, como a que obtivemos em relação ao distrito de Aveiro? Será uma consequência da falta de salas minimamente preparadas para uma utilização eficaz do videogravador? Inexistência de gravações adequadas nas escolas? Falta de uma mediateca? Ou dever-se-á apenas a causas relacionadas com os próprios docentes?

Em relação às novas tecnologias, verificámos já que estas têm uma difícil penetração no ensino, especialmente quando se trata de meios tecnológicos mais avançados e recentes, como é o caso do CD-I e restantes sistemas multimédia. Se a sua entrada só muito dificilmente se verifica na escola portuguesa, não será de admirar que acabem por passar quase ignoradas de uma boa percentagem dos docentes. Todavia, em relação ao computador, verifica-se que, mesmo em relação à sua utilização como meio de processamento de texto, 48,5% dos professores indicou ainda não ter recebido qualquer formação, o que significa que, apesar do computador ser já, actualmente, um recurso bastante vulgarizado, quase metade da classe docente ainda não teve um contacto efectivo com ele.

 

Parece poder concluir-se dos dados por nós recolhidos que alguns aspectos deverão ser tidos em conta a nível do ensino: em primeiro lugar, importa que as escolas portuguesas sejam minimamente dotadas com os recursos actualmente mais importantes para um ensino atraente e evoluído, de molde a evitar-se um desfasamento abissal entre a escola oficial e a escola paralela; em segundo lugar, que a distribuição desses recursos se processe de uma maneira mais racional, em função das necessidades reais das nossas escolas e evitando-se as dissimetrias por nós encontradas, como sejam, por exemplo, escolas sem qualquer apetrechamento ao lado de outras com elevado número dos mesmos recursos. Não é que o elevado número do mesmo recurso seja um aspecto negativo, pois é sempre vantajosa a existência de aparelhos acima das necessidades de uma escola; o que é negativo é a sua total ausência em algumas escolas. O que pretendemos dizer é que a quantidade de material deve estar de acordo com as características das escolas e com as suas necessidades de utilização. Por outro lado, deverá evitar transformar-se as escolas em depósitos de recursos que, no momento em que são fornecidos, constituem já recursos tecnologicamente ultrapassados e com reduzida ou nenhuma utilidade, não passando de material obsoleto e digno de figurar em museus.

Mas se as escolas deverão ser devidamente apetrechadas com material adequado e actual, deverá nelas existir também uma adequada organização e gestão que permita rentabilizar esses recursos para a educação. Esta organização rentável e eficiente passará pela existência de salas minimamente preparadas para a utilização dos modernos recursos audiovisuais, pela existência de professores simultaneamente responsáveis por esses recursos e dinamizadores, capazes de sensibilizar os restantes professores para a sua importância como meios de aprendizagem, e pela existência de mediatecas, que permitam uma gestão eficaz do software existente, evitando-se que esteja disperso pela escola e quase ignorado, tornando-se difícil a sua utilização por professores e alunos.

Para que todos os aspectos acabados  de  referir possam obter o máximo de eficácia, torna-se indispensável que, nas acções de formação que actualmente se realizam, geralmente frequentadas pelos professores com o objectivo quase exclusivo de obter créditos para a transição de escalão, não sejam esquecidos os recursos educativos, não só os de natureza audiovisual mas, inclusive, as novas tecnologias, de modo a uma sensibilização dos docentes para a sua importância e vantagens em todo o processo de ensino-aprendizagem, não só para a situação exclusiva da situação da aula, mas também para todo o conjunto de actividades visando a sua preparação, sem o que a escola portuguesa não poderá acompanhar a evolução cada vez mais acelerada que se verifica na modernas sociedades ocidentais, em que o professor não é mais um simples transmissor de conhecimentos, mas antes e cada vez mais um facilitador da aprendiza­gem. Esta função será tanto mais eficaz quanto maior for o seu grau de actualização perante as novas tecnologias e formas de conhecimento, que, não raras vezes, são já trazidas pelos nossos alunos da escola paralela.

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