SALA I

Quem entra hoje no Museu de Arte Contemporânea encontra-o disposto, duma maneira. geral, como o deixou Columbano.

Na primeira sala, a que poderíamos chamar a dos Românticos, se essa designação não fosse demasiadamente imprecisa tratando-se de pintura, expõem-se os quadros mais antigos, as obras de 1850 a 1880 ou mesmo mais aquém.

No topo mais alto, como a presidir àquela geração, está uma Virgem na cadeira, tão rafaélica de seita, de atitude e de cor que a gente se desola quase ao saber que ela foi, / 9 / afinal, pintada pelo professor de quase todos os demais artistas ali presentes, A. M. Fonseca de quem é também um pequeno grupo de bronze Adonis combatendo o Javali, colocado em frente.

Dominando a sala, pelas suas vastas dimensões, mas mais ainda pelo encanto que dela se desprende, está essa tela graciosíssima do visconde de Menezes, O Retrato da mulher do Artista (Vid. p. 5). Do mesmo autor existem no Museu vários retratos, entre os quais um de Antero de Quental.

Mas sigamos por ordem:

De um e outro lado da porta de entrada, meia dúzia de quadrinhos, iguais a tantos outros daqueles tempos, de F. Metrass, Anunciação e de um pintor medíocre que a piedade filial de Columbano valorizou: Manuel Maria Bordalo.

Uma Vista da Amora, de Tomaz da Anunciação, é finamente descrita, numa visão meticulosa. Mas o antigo professor da Escola de Belas-Artes era sobretudo um animalista notável, como o mostra essa admirável tela sua: Vitelo. (Vid. p. 4)

Do honesto paisagista João Cristino, um (quadro Cinco Artistas em Sintra tem, pelo menos, um valor documental, pois dá-nos os retratos de: Anunciação, Metrass, Victor Bastos, J. Rodrigues e o próprio autor. (Via p. 4)

Flores e frutos de vários pintores (Cristino, Chaves, Leonel) com um sabor a passas e o perfume extinto, grandes composições académicas chamadas de história (J. Rodrigues, Metrass, Lupi) em que se cristaliza um sem número de preconceitos de escola e nalguns dos quais nos aparece, sem interesse, esse profundo e discreto retratista que foi MigueI Ângelo Lupi, de quem se devem admirar, na sala seguinte, o impressionante retrato da Mãe de Sousa Martins (Vid. p. 3) e uma nova aquisição de qualidade: O Retrato de Marquesa de Belas.

Alfredo Keil, representado no Museu por cinco quadros, aparece-nos, ao lado dos professores e dos consagrados do seu tempo, como um exemplo de que em arte os amadores muitas vezes ultrapassam os pontífices. Dois delicados Interiores de Queluz, a Praia Grande bem sentida e sobretudo uma Volta da Romaria, rica de perspectiva aérea, num entardecer de serranias.

Do mesmo artista possui ainda o Museu um interessante quadro que reproduzimos (Vid. p. 6) em que figura a esposa do pintor e que está quase escondido ao cimo duma escada.

Não nos demorando com algumas paisagens feitas no atelier e um ou outro quadrito de um certo interesse anedótico, falta-nos apenas chamar a atenção para um quadro excepcional, nesta primeira sala. Trata-se do quadro a que se tem chamado O Pântano, do pintor e arquitecto Alfredo de Andrade, que dirigiu em Itália a restauração / 10 / de monumentos e gozou ali da maior consideração.

Na realidade, o pintor chamou a esta sua obra Manhã e pintou-a o mais tardar em 1863, data em que a ofereceu à Academia de Belas Artes para obter o grau de académico de mérito. É uma admirável visão precursora do ar livre, a contra-luz e vale ainda porque representa uma primeira tentativa de dissociar as cores, que precedeu a técnica dos impressionistas, do próprio Monet como de Pissarro.

É, além disso, uma larga mancha de luz expressa com o mais fundo sentimento da natureza, em que os primeiros planos foram tratados de maneira pointilliste.


SALA II

Aqui alternam os mestres portugueses e franceses do fim do século XIX, nossos contemporâneos, em suma, pois que se alguns desapareceram há mais de quarenta anos, outros são ainda vivos.

Um Drama da Terra (V. p. 16) fala-nos discretamente dessa arte tão impregnada da forte rusticidade naturalista, à maneira de Bastien-Lepage, assim como uma obra de Albert Besnard, fresca e tocada com desenvoltura representa no Museu a feição virtuose do impressionismo (V. p. 15)

Um Retrato do Visconde de Va1mor pintado por Bonnat não acrescenta nada à sua excessiva reputação; mais adiante, uma cena de beira-mar, duma finura de técnica e de um equilíbrio raro, O barco desaparecido (V. p. 11) é obra de um pintor português vivo, Sousa Pinto que tem a honra de se ver representado no Museu de Arte Contemporânea de Paris, o Luxembourg.

Mestre Jean-Paul Laurens mostra o que são as suas composições de história, correctas e frias, com uma Cena de Inquisição, colocada entre uma excelente Paisagem dum artista quase esquecido, Defaux, e uma obra de mocidade desse grande pintor do ar livre que foi Silva Porto: Margens do Oise.

Data do período da sua estada em França como pensionista, ávido de interpretar a frescura húmida da paisagem como a viam esses pintores-poetas da escola de Barbison.

A obra de Silva Porto, numerosa e duma grande pureza ele cor, está hoje representada no Museu por cinco ou seis telas espalhadas. Nesta mesma sala vêem-se A Salmeja, vinda do palácio da Ajuda e um minúsculo Salgueiral; na sala seguinte, a Volta do Mercado, (V. p. 8), feirantes numa estrada batida de sol, entre piteiras, ao lado duma impressionante figura de Fiandeira napolitana cujo estudo preparatório a lápis existe também no Museu.

Uma tela única de António Ramalho, delicada, segura e precisa, mostra-nos o Escultor Alberto Nunes (V. p. 7) trabalhando / 11 / no seu estúdio. Alguns retratos de José Malhoa e Velas o Salgado, um pequeno estudo a óleo Esperando os barcos, de um mestre que foi um notável desenhador e ensinou na Escola do Porto algumas gerações de artistas, Marques de Oliveira (V. p. 10), mais dois retratos e um grande estudo, Os pretos de Serpa Pinto por Lupi, completam o conjunto.

SALA III

De obras mais recentes, em geral, contém além dos dois quadros de Silva Porto já mencionados, algumas telas de grandes dimensões, tais como: A Feira, de Carlos Reis, o professor-paisagista de quem se podem admirar na sala seguinte duas composições de figura Asas e Engomadeiras (V. p. 12); Amor e Psyché, obra do professor Veloso Salgado quando pensionista em Paris (1892) é um quadro claro, de cores e atitudes inefáveis como convinha ao assunto, naqueles tempos de mestre Bouguereau; são do mesmo pintor e da mesma época a Igreja Abandonada (Vid. p. 12) e a cena da Bretanha No Cemitério.

Uma Desolação do professor Luciano Freire merece bem o nome que tem; A Caminho da Fonte, de Condeixa, brinca aos quatro cantinhos, em frente de duas marinhas de João Vaz (Setúbal) e Falcão Trigoso (Algarve).

Dórdio Gomes, com a sua Sesta dos Ceifeiros dá-nos um forte estudo, em que concentra nas pequenas dimensões de um apontamento toda a emoção dos vastos plainos de Alentejo (V. p. 17).

Finalmente, um pintor de sérios merecimentos, que a morte levou na força da vida, Constantino Fernandes, está aqui representado por uma cabeça de mulher Inverno e um grande tríptico da vida do Marinheiro, (V. p. 14) em que se mostra já senhor de uma técnica calma e seguríssima. É do mesmo artista essa obra de probidade, o Retrato do pai do autor (V. p. 14) que se encontra na sala seguinte, uma admirável figura de verdadeiro ar livre.

No meio da sala, uma magnífica réplica da primeira grande estátua de Rodin, A Idade do Bronze.

 

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