Achegas para a Historiografia Aveirense - 1988

Mulheres polícias

A Polícia de Segurança Pública destacou para Aveiro um grupo de mulheres-polícias, todas muito elegantes nas suas fardas, para, especialmente, dirigirem o trânsito, missão de que elas se têm desempenhado com regular eficiência.

A existência desse corpo policial feminino fez com que me acudisse à memória um quadro da revista AO CANTAR DO GALO que o Grupo Tricanas e Galitos levou à cena em 1936.

Logo a seguir à abertura, aparece no palco um jornalista lisboeta, o PONEY, o qual, tendo tomado conhecimento do surto de desenvolvimento por que Aveiro estava a passar, resolveu vir observar de visu (foi assim que ele disse ao polícia 33, primeira autoridade com quem deparou), esse desenvolvimento e perguntando-lhe se ele não queria ser seu cicerone.

O 33 respondeu-lhe que isso não era da sua conta, mas, sim das POLÍCIAS DE TURISMO; e que ele, jornalista, até estava com muita sorte, porque vinha a chegar a chefe das mesmas, – toda ela amabilidades, – a quem se devia dirigir, conselho que o jornalista aproveitou, dizendo-lhe que desejava aproveitar-se dos seus serviços.

A chefe pôs-se imediatamente às ordens do PONEY, dizendo-lhe: – «Os serviços de assistência aos turistas, em Aveiro, estão primorosamente organizados. Assim, foi criado um corpo de polícia turística – de que sou a chefe – o qual tem a nobre e especial missão de mostrar a todos os visitantes as nossas belezas, quero dizer, os encantos desta pérola oceânica, engastada nas margens da sua ria nostálgica.»

O PONEY apresentava-se na sua qualidade de jornalista e admira-se da existência do corpo das polícias de turismo, pelo que a chefe se propõe mostrar esse corpo, dizendo-lhe: – «As minhas agentes, destinadas a acompanhar os turistas, falam todas as línguas: o Francês, o Inglês, o Espanhol e até o Chinês

Esta afirmativa causa admiração e entusiasmo no jornalista, que exclama: – «Mas isso é formidável!»

A chefe apita e, no palco, entra um grupo de raparigas gentis e elegantes, / 215 / devidamente fardadas, as tais que formam o Corpo das Polícias de Turismo e que fazem a sua apresentação cantando:

Polícia para turista

Sabiamente organizada

Numa missão altruísta

Muito bem orientada.

 

Sabemos Geografia

Onde ficam monumentos

A caldeirada de enguia

Com todos os condimentos.

 

Belo turismo

Informações...

Muito bairrismo

Sem restrições...

Convidativas

Sempre cá dentro,

E muito activas

Pelo nosso centro.

 

Somos leais cicerones

Nas nossas informações

Para mostrar aos mirones

Onde há os bons mexilhões.

Acabada que foi a cantoria, a chefe diz ao PONEY que pode escolher, de todas as suas agentes, aquela que mais lhe agradar para lhe servir de guia durante a sua estadia em Aveiro. Este acha difícil a escolha, e passa-as em revista, lentamente.

A primeira, diz-lhe: – Yo lo puedo mostrar muchas belezas a usted... ao que o PONEY responde: – Yo lo creo senhorita… usted es un nido de gratias…

A segunda intervém: – Pardon, monsieur. Regardez-moi; je vous en prie, regardez-moi... a quem o PONEY responde: – Oh! Comme elle est gentille. C'est un bijou; Je vous aime mademoiselle. Je crois que je vous aime à la brute...

A terceira agente, inconformada, diz-lhe: No, no. Look at me. I mant you fall dawn in Ive wite me, a que o jornalista responde: yes darling. You are charming and y prefer you. Oh, Céus! se prefiro...

Esta resposta entusiasma a agente que brada: Kisse-me! / 216 /

O PONEY abraça-a e vai para beijá-la; porém, a chefe, irritada, intervém dando voz de SENTIDO, ao que todas as agentes obedecem, e motiva o dito do jornalista: Agora que íamos tão bem lançados... voltamos à primeira forma.

Ainda uma quarta agente se lhe dirige: Chan ká chei yang ei u? A esta, o PONEY responde: Oh! filha, tenho muita pena mas não percebo patavina de Chinês.

A chefe informa que fala unicamente o Português, mas, como aveirense de lei, supõe poder mostrar-lhe, com todos os pormenores os encantos da sua terra.

O PONEY aceita a oferta, dizendo que, de língua, prefere a portuguesa e as de bacalhau, cantando em seguida:

Que polícias tão galantes,

Tão correctas, sem falácia;

Têm vozes aliciantes,

«Solo conocen las gratias».

 

Transbordam tal simpatia,

Tão perto do nosso alcance,

Que esfuziante alegria

«Honny soit qui mal y pense».

 

Neste lance – Deus cupido!

«To be or not to be»

Não sei se fico perdido

«Ti chi fun tará á tá li».

Ao que as agentes respondem, em coro:

Muitos «mercis»

A Vocelência

«Nuestros» perfis

Em continência.

Sempre discretas

Aqui «all right»

E mui selectas

«per fi un saite».

Mandadas retirar, o PONEY repara que as agentes, ao passarem por uma senhora muito distinta, a saudaram com todo o respeito e muita consideração, / 217 / pelo que pergunta à chefe de quem se trata. Esta informa-o ser a D. Câmara, a quem o apresenta.

O PONEY diz ter muito gosto em conhecê-la, pessoalmente, pois tem ouvido as mais honrosas referências à sua pessoa e à cidade que ela representa.

A D. Câmara, depois de agradecer ao jornalista o seu interesse, e o da Imprensa lisboeta, em conhecer a cidade, ao que o jornalista diz ser dever de todos os Portugueses, continua:

... – Aveiro! Mãe de filhos que Deus abençoou e que brilharam pelos seus talentos e virtudes, nas ciências, na arte, na política, na oratória, na imprensa, enfim, em todos os sectores dos merecimentos humanos. Foi mãe de José Estêvão, o colosso do século passado na oratória parlamentar, na oratória forense, na arte da guerra, na cátedra, cujo nome ainda refulge em todos os cantos desta pátria amada!

E, depois de uma interrupção do PONEY, continua:

Guarda as ossadas de Melo Freitas, de Gravito, de Morais Sarmento, e de tantos outros mártires da Liberdade que, digam o que disserem, foram os precursores das grandes ideias políticas e os mais importantes padrões da civilização que desfrutamos e alcançámos e cuja defesa é hoje a nossa constante preocupação!

Nova intervenção do jornalista e, D. Câmara continua:

A minha terra, a sua ria, as suas tricanas – verdadeiras beldades –, as suas marinhas de sal! Como me comove falar da minha terra! Vem V. Ex.ª visitá-la: como lhe agradeço!

Tendo a chefe perguntado ao PONEY a sua opinião sobre a D. Câmara, este respondeu estar entusiasmado com o grande amor que ela tinha pela sua terra e admirava que ela fosse tão nova ainda. Estava encantado.

A chefe explicou-lhe que a nossa Câmara, porque acompanha sempre o progresso, mantém inalterável a sua juventude.

Esta observação da chefe pode ser feita em relação à actual Câmara, que tantas e tão importantes coisas tem feito, quer na cidade, quer no restante do concelho, para o seu progresso!

Está cada vez mais jovem e mais activa!

Bem haja...

 

A chefe conduz o PONEY em direcção ao Parque da Cidade, entregando-o à Seta que tem a seu cargo a missão de indicar o caminho para lá chegar e, nele, acompanhar os visitantes.

Neste percurso encontra o Padeiro, a Peixeira, as Leiteiras à espera que lhes fiscalizem o leite, a Mulher das Camarinhas e os Brasileiros que, também, vieram visitar Aveiro.

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