Achegas para a Historiografia Aveirense - 1988

Festa da Senhora da Alumieira

A festa da Senhora da Alumieira realiza-se na Segunda-feira de Pascoela, naquela localidade, que fica, como todos sabem, a seguir a Mataduços.

Os romeiros – não seria melhor chamar-lhes foliões? – a meio da tarde, em grupos de familiares e de amigos, transportando cestos e garrafões, punham os pés a caminho e, pelo Cais de S. Roque, seguiam pela linha do ramal do Vale do Vouga, em direcção à Mina; daqui passavam pela ponte do caminho de ferro da C.P. ou desciam por uma rampa que fica ao lado daquela ponte, atravessavam para o lado de lá da Ribeira de Esgueira e iam abancar nos terrenos de Mataduços, nos pinhais sobranceiros à linha da C.P.; se, por ventura, os cestos do farnel pesavam muito, ou havia dificuldade de caminhar por do grupo fazerem parte crianças ou pessoas idosas, ou, ainda, se o grupo tinha saído de casa com grande atraso, ficava-se mesmo pela Mina, principalmente, à sombra do belo eucaliptal que lá existia, e do qual muitos terão boas recordações pelos bons bocados que por lá passaram…

E que lindo era o pôr-do-sol, visto daquele local!...

Outros romeiros seguiam pela estrada de Esgueira e quedavam-se pela fonte e tanques do Olho-de-Água e pelos terrenos adjacentes.

Eram comida quase obrigatória, neste dia e nesta tarde, os chicharros de par – que também eram conhecidos por «companheiros da alegria» – cozidos com favas e batatas novas, cozinhado que havia sido acabado de fazer na precisa altura da saída de casa, sendo as panelas e os tachos embrulhados com jornais / 29 / para a comida não arrefecer... E, normalmente, não faltavam no farnel os bolos de bacalhau e um tacho de arroz, pois o farnel era não só para a merenda, como também para servir de jantar.

Não faltava também – pois não podia faltar! –, o folar da Páscoa e uns bolos caseiros que, com a melhor pinga que cada um conseguia obter, regalavam não só os do grupo, como, também, os amigos dos grupos vizinhos, com quem se trocavam esses acepipes.

E pelo costume de se acampar em lugar mais ou menos certo, já se sabia quem os levava de categoria, e aonde se devia fazer a prova.

Se havia que fazer promessa àquela Santa, os romeiros que tinham tal devoção, saíam muito mais cedo de casa, de forma a chegarem a Alumieira muito antes de sair a procissão, pois, na altura em que começavam os preparativos para isso, já era difícil transitar entre a passagem de nível de Mataduços e a capela da Nossa Senhora da Alumieira.

Dentro dela, e no largo, a multidão era grande e não permitia que se cumprissem, com devoção, as promessas feitas àquela Santa.

O regresso à cidade fazia-se pela estrada, muito à noitinha, e quando as luzes públicas já estavam acesas.

O caminho demorava mais tempo a percorrer do que na ida, pois fazia-se em ranchos, com cantigas e brincadeiras, sendo certo que muitos dos foliões já vinham muito bem compostos e em condições de se deitarem logo que chegassem a casa.

Os tempos mudaram-se e as pessoas mudaram também.

Aveiro passou a ser uma cidade cosmopolita, em que há muita gente que nós não conhecemos, nem sabemos donde é, o que alterou os nossos usos e costumes; e até os automóveis e camionetas e as malditas das motorizadas tiraram à romaria da Senhora da Alumieira a alegria sã e familiar que então se gozava.

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