Maria Benilde Cancelas Giestas, José Luciano de Castro, In: Aveirenses Ilustres. Retratos à minuta, Edição do X Encontro de Professores de História da Zona Centro, Aveiro, 1992, pp. 7-9.


José Luciano de Castro
(1834-1914)

José Luciano de Castro Pereira Corte Real nasceu em Oliveirinha, concelho de Aveiro, a 14 de Dezembro de 1834. Era filho segundo génito do último morgado da Casa de solar da Oliveirinha, Francisco Joaquim de Castro Pereira Corte Real e de D. Maria Augusta de Meneses Silva e Castro. Descende assim de uma família nobre que, por linha materna, se vai cruzar com a do Marquês de Pombal. Em 1865 casou com D. Maria Emília Seabra, tendo-se então radicado em Anadia, onde virá a falecer a 9 de Março de 1914.

Licenciado em Direito pela Universidade de Coimbra, consagrou-se como importante jurisconsulto, mas também como jornalista e excelente orador, tendo sido sobretudo um afamado chefe político e ilustre homem público.

Ainda quando estudante em Coimbra, interessou-se pelo jornalismo, tendo colaborado em "O Observador", que mais tarde adoptaria o nome de “O Conimbricense". A sua paixão pelo jornalismo bem como o seu talento não lhe permitiram ficar por aí e a sua naturalidade aveirense levou-o a interessar­-se também pelo jornalismo local, tendo sido uma das figuras mais representativas que inspiraram, orientaram ou dirigiram os órgãos de opinião da cidade de Aveiro.

"O Campeão do Vouga", primeiro jornal aveirense fundado por Manuel Firmino de Almeida Maia em 1852, tem desde início como colaborador José Luciano de Castro. Além de colaborador, o seu papel predominante neste jornal foi o de inspirador e guia e, mais tarde, o de patrono. Desde início se dispôs a cooperar neste arrojado empreendimento do seu conterrâneo, tendo sido graças à sua intervenção que se resolveu um dos mais graves problemas por este enfrentado: a falta da soma estritamente indispensável para o seu lançamento. A mãe de José Luciano de Castro terá emprestado um cordão de ouro, que ficou como penhor das quinze moedas com que o jornal se fundou.

Desde a fundação que aí escreve artigos, mas despede-se do jornal passados dois meses. No jornal "O Observador", revelaria os motivos que o levaram a dar um passo tão inesperado: a censura dos seus artigos por pessoas que estavam bem longe de o poder fazer"; diz ainda, "se alguma vez a minha consciência oprimida soltava um brado enérgico, esse brado era logo abafado. "

Esta atitude reflecte o seu desagrado e desilusão face a uma situação que considera degradante para a sua actividade como jornalista, mas não se desliga dela. José Luciano de Castro e José Eduardo de Almeida Vilhena fundam o segundo jornal aveirense, "Aurora" , cuja existência efémera decorreu entre 1 de Março e 1 de Setembro de 1855.

José Luciano de Castro dedicou-se durante cerca de 50 anos ao jornalismo, onde teve como tribuna parlamentar uma posição de relevo, que acompanhou todas as fases da sua carreira de ininterrupta ascensão. Como colaborador efectivo, foi redactor de vários jornais: "Comércio do Porto”, "Progresso", "Nacional" e "Jornal do Porto", em cuja redacção emparceirou com Ramalho Ortigão. Foi responsável ainda pela fundação de uma importante revista de jurisprudência, "o Direito". Publicou importantes e interessantes trabalhos, como: "A Questão das Subsistências" (1856); "Legislação sobre a Liberdade de Imprensa" (1859); "Discursos" (1863, 1872,1877); mas muitos outros se poderiam citar.

Citando as palavras de Anselmo de Andrade quando se refere a José Luciano de Castro, "O notável estadista ocupou na revolução de Setembro um posto igual aos que ali tinham Lopes de Mendonça e Latino Coelho, esses dois inolvidáveis mestres da palavra escrita com os quais competia por vezes em primores de estilo, mas a quem excedia quase sempre no vigor da paixão, que são as duas musas mais inspiradoras do jornalismo político."

Importante jornalista, José Luciano de Castro é antes de tudo um político e um homem de acção, desde cedo atraído para a carreira política, para onde o chamavam os seus poderosos recursos de orador e publicista. Estadista notável, chefe do Partido Progressista, foi um dos seus fundadores em 1876, sendo o seu presidente quando a república se implantou, cargo que ocupava desde 1885, tendo nessa altura sucedido a Anselmo José Braamcamp.

Quando chefe do partido Progressista, alternou com o chefe do partido Regenerador no desempenho do cargo de Presidente do Conselho de Ministros durante o período do Rotativismo. Parlamentar distinto, muitas vezes ministro e chefe do governo, encontrava-se na Presidência do Conselho quando se deu. o Ultimato de 1890 e enfrentou a crise financeira que levou os alemães e ingleses a disputarem as colónias portuguesas em África. Muito se lhe deve na obtenção do tratado de reforço da aliança com a Inglaterra, para defesa do império colonial cobiçado pela Alemanha, de que resultou a assinatura do tratado de 1891.

Deputado da Nação, Conselheiro de Estado, Vogal efectivo aposentado do Supremo Tribunal Administrativo e governador da Companhia Geral do Crédito Predial Português foram também cargos que desempenhou.

No desempenho de todos estes elevados cargos, sempre de forma notável, teve constantes e enérgicas intervenções políticas dignas de um verdadeiro e distinto estadista, considerado como um dos mais ilustres da monarquia liberal.

Acerca de José Luciano de Castro diz David Ferreira: "...dominado por intensa paixão política, a sua ambição pelo poder conduziu-o constantemente a atitudes contraditórias, que desmentiam, no governo, os compromissos assumidos na oposição." Exaltado e elogiado por uns, atacado por outros, o certo é que, citando ainda o mesmo historiador, "quer no governo, quer fora dele, foi o homem que mais permanentemente dominou a política portuguesa nos últimos 30 anos da monarquia.”

O conselheiro José Luciano de Castro, nas cartas dirigidas a D. Manuel II, mostra que "tinha duas chapas, com as quais ia mantendo a sua supremacia e destruía tudo o que lhe não agradava: - se o ministério era da sua feição, dizia ao rei que tudo ia bem, caso contrário, dizia ao rei que a República avançava a passos rápidos e assim manteve desde o regicídio a sua influência no Paço e a autoridade de um sincero conselheiro." (citei João Jardim de Vilhena).

É vastíssima a bibliografia acerca desta ilustre figura, ao mesmo tempo notável e discutida da política portuguesa, na qual foi militante activo durante cinquenta anos. Quer se fale de José Luciano de Castro como jornalista, jurisconsulto, orador ou político, até porque estas actividades se desenvolvem em paralelo durante toda a sua vida, ele surge como "um dos homens que concorreram para que Portu­gal fosse sempre grande."

Ouçamos o que sobre ele diz Júlio de Vilhena:

"O Conselheiro José Luciano de Castro pode ser considerado como estadista, como orador parlamentar e como jurisconsulto. Ninguém expunha com mais lucidez uma questão jurídica, ninguém relatava com mais precisão um processo complicado."

António Cândido, considerava-o como o mais perfeito conhecedor de homens que em Portu­gal em tempo algum floresceu: " muitas vezes o ouvi predizer com segurança a revolução social"

O Conselheiro Adriano Antero, sábio jurisconsulto e historiador, define-o da seguinte maneira: " Foi um santo na sua vida particular, um génio e uma verdadeira glória da Pátria na sua vida pública... De uma vastidão de conhecimentos enorme, de uma memória verdadeiramente assombrosa, de uma táctica parlamentar especial e finíssima... de uma energia moral severa, mas inquebrantável no meio das maiores dificuldades e de uma aptidão de trabalho inexcedível para todos os ramos, José Luciano de Castro foi certamente o modelo brilhante de um estadista completo."

Maria Benilde Cancela Giestas
Professora de História,
Secundária Dr. Jaime de Magalhães Lima,
Aveiro

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BIBLIOGRAFIA

Arquivo do Distrito de Aveiro, vol. VIII, 1942, pp. 59-65; vol. X, 1944, pp. 243-259.
Aveiro e o seu Distrito, n.° 5, 1968, pp. 61-72, n.° 21, 1976, pp. 25-26.
Dicionário Enciclopédico Koogan, Larousse, Selecções do Reader's Digest, vol. II, Lisboa, pág. 1101.
Dicionário de História de Portugal, Dir. Joel Serrão, vol. II, Livraria Figueirinhas, Porto, p. 17.
Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura, vol. IV, pág. 1455, Editorial Verbo, Lisboa.
Enciclopédia Portuguesa Ilustrada, dir. Maximiano Lemos, voI. II, pp. 651-652, Porto.
Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol. VI, pág. 249.


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