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             VOLTAREMOS

                                       In memoriam de Manuel Geraldo

 

Nuno Rebocho

 

apodrece a medula do tempo: choram silêncios
sobre o chão da memória onde já nenhum trigo loira. são corvos
as andorinhas do alqueva que esgotam o candeio. são trevos
de tristeza que ondeiam nos cumes da desesperança
e vamos morrendo. matam-nos. matam-nos. matam-nos.
calam-nos a raiva com a peçonha de promessas
e até as lebres se escondem na inquietude (apenas
vamos morrendo sobre a campina).


e tanto caminhámos e tanto esperámos e tanto mordemos
a margem da angústia vigiando o futuro com os braços tensos:
tanto trocámos as voltas à derrota para que o tempo medrasse
como trufas escondidas no sangue dos montados. como cantes
de desassossego desafiando solidões fomos ganhões
para empar a dor o vinho da revolta escorria da ceira dos dias.


desistir? nunca. nunca desistiremos porque as boletas
resistem ao abandono e os azinhos renascem como sombras
onde as raposas espreitam. sabemos que os loendros vingam
lá onde os silêncios cantam e onde a campaniça chora
sons de mágoa embalando o sul. nunca desistiremos de plantar
a raiva. nunca desistiremos de mondar futuros
que os estorninhos sempre entornam sobre a planície.


há-de voltar a voz mais forte que o suão da desesperança:
virá depois do frio para incendiar o mendro. virá depois
do pousio. depois do cansaço cantarão os ranchos
sobre o chão da memória:
e lá iremos seguindo por esses campos fora.

 

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