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Egas Salgueiro e a Empresa de Pesca de Aveiro – As minhas memórias

Navio Hospital Gil Eanes

É incontornável não referir o Gil Eanes. Mesmo eu fiz uma viagem recente a Viana, não só para o revisitar e tirar mais umas fotografias, mas para contactar com a Fundação Gil Eanes, onde há muitos voluntários da EPV, que me tem dado muito jeito, neste meu trabalho de pesquisa.

Nesta faina da pesca do bacalhau, cedo se começou a sentir a necessidade de um navio de apoio à nossa frota de pesca, conhecida por White Fleet durante a Segunda Grande Guerra.

Em 1923, o governo republicano adaptou o cruzador Carvalho Araújo para apoio hospitalar à nossa frota. Embora sem as condições necessárias, lá foi cumprindo a sua missão.

No ano anterior, os marinheiros portugueses eram hospitalizados no navio francês “Saint Jeanne d’Arc”, do qual recebiam a necessária ajuda humanitária.

Anos antes, ainda nos começos da Primeira Grande Guerra, dos navios alemães apresados em Lisboa, foi escolhido o “Lahneck”, rebaptizado com o nome de Gil Eanes, o famoso navegador algarvio. Era um navio mercante a vapor. Zarpou do Tejo em 1927, para apoio nos Bancos da Terra Nova. Porém, nem sempre se dedicou a essa missão, tendo sido algumas vezes desviado para outros tipos de serviço. Como serviço de apoio à nossa frota pesqueira, fez apenas quatro viagens, entre 1927 e 1937. No regresso carregava bacalhau seco nos portos da Terra Nova, para a CRCB (Comissão Reguladora do Comércio de Bacalhau) em Lisboa, mantendo todavia um oficial superior de marinha com as competências de capitão do porto.

A partir de 1937, começou a ser mais regular essa assistência, embora outros problemas tenham surgido, causados pela situação de guerra que então se vivia. Os Aliados descobriram que o radiotelegrafista do Gil Eanes era um espião ao serviço dos Alemães, o que iria comprometer a invasão do Norte de África. Depois de terem equacionado o afundamento do navio, acabaram por o abordar, prendendo o espião a 1 de Novembro de 1942. Tanto este, como o novo Gil Eanes, desempenhavam duas funções importantes. Como navio-hospital, estava dotado com uma equipa de médicos e enfermeiros, sala de operações, raio-X e outras situações necessárias, como, por exemplo, tratamento dentário. A outra função era a de apoio logístico, transportando o correio e fornecendo isco e combustível. Foi também navio capitânia, navio rebocador e quebra gelos. Era enorme a alegria dos pescadores quando sentiam a sua presença.

Vários historiadores referem que também faria algum controle de cariz político e laboral.

Em 1955, o velho Gil Eanes foi substituído por uma nova embarcação, construída nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo. Cedo se verificou que a máquina que o movia estava desajustada relativamente à sua capacidade. Não alcançava mais do que 9 nós, para cobrir uma área de 900 milhas quadradas e com mar revolto não conseguia aguentar-se de «capa», ou seja, a sua potência era insuficiente para o manter aprumado à vaga. A partir de 1963, passou a fazer viagem de comércio, como navio frigorífico e de passageiros, realizando a sua última viagem de assistência à frota, em 1973, ano em que efectuou uma viagem diplomática ao Brasil, como embaixada flutuante de Portugal, nas recepções oferecidas pelo então embaixador Prof. José Hermano Saraiva.

Após uma paragem de 18 meses, em 1975, reiniciou a actividade como unidade frigorífica, fazendo cargas de bacalhau seco, da Noruega para Lisboa, ao serviço da Comissão Reguladora do Comércio do Bacalhau. Ainda nesse mesmo ano, foi requisitado pelo Governo português como navio Hospital para prestar apoio às populações, na fase final do processo de independência de Angola. Finda a sua actividade, em 1984, foi adquirido pela Câmara de Viana do Castelo. Após obras de reabilitação, está ancorado como património da Fundação Gil Eanes, admite visitas e funciona como Pousada da Juventude, sendo hoje um ex-libris da cidade de Viana do Castelo.

Navio Gil Eanes. Clicar para ampliar.

Navio Gil Eanes, actualmente pousada da juventude e museu, um ex-libris da cidade de Viana do Castelo.

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Fontes de informação:

MARCOS, João Laruncho de São −, Memórias de um pescador, Ílhavo, 2008.

Fotografia do autor, obtida por ocasião da visita ao navio.

 

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04-05-2018