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Egas Salgueiro e a Empresa de Pesca de Aveiro – As minhas memórias

Os dóris

Para abordar este tema, que me é familiar, li o excelente livro “Dóri – Um pequeno herói” do Sr. Capitão Marques da Silva. Tão interessante o livro que presentemente se encontra esgotado.

Familiar, porque na EPA a carpintaria tinha um estaleiro para construir dóris. Como já disse, prometi ao meu neto construir um à escala 1/10, de 4 tábuas e 2 velas. E por isso estou a fazer o estaleiro, mas é um assunto que tem de ser abordado, quando ouço:

– Pai, o que é um dóri?

– O barquinho onde todos os pescadores apanhavam o bacalhau na pesca à linha e souberam engrandecer a sua profissão de homens do mar.

E os mestres carpinteiros que os souberam construir com dedicação e profissionalismo, como foi o caso do nosso Mestre Sardo. Aliás, todas as Secas tinham a sua carpintaria. E eu habituei-me a andar por lá, já a reparar as modernas máquinas, como as serras de fita e as tupias.

Pormenor do interior de um dóri obtido numa exposição em Viana do Castelo.

Estes dóris já os franceses os usavam na ilha de Saint Pierre, de costado liso e arredondados. Nós, os Portugueses, sempre usamos dóris de um só homem.

Já em 1937 o Creoula tentou dóris maiores, de 2 homens, mas foram rejeitados pelas companhas. Os dóris com um comprimento total de 5,30 m, boca de 1,5 m e pontal a meio de 0,60 m, tem o fundo com uma pequena flecha, pelo que não é totalmente plano. Usa um cordame à proa e à ré, que serve para o içar e arriar. Cada baliza é formada por duas peças, que são unidas formando a caverna que assenta no fundo. São quatro, duas por vante e duas por ré.

Chegam ao navio e o capitão faz o sorteio, um por cada pescador, na ordem dos trinta. Empilhavam-se no convés, em cima de um picadeiro de madeira, à ré, a meia nau e à proa, remos ao lado, com a rolha aberta do buraco do esgoto e a respectiva vela. Eram presos a fortes olhais, não fosse o mar levá-los.

O navio, assim, estava aparelhado, mais atravancado, menos airoso, mas mais respeitado. Todos tinham um número pintado nas amuras e o nome dos navios nas alhetas. Era um navio bacalhoeiro!

Passado o cabo Raso, os dóris ficavam com outro aspecto. O mar salta por cima da borda, deixando-os mais luzentos e bem molhados. Já falei da palamenta, que era distribuída nos dóris, mas não é demais insistir no “agulhão”, pois tirando o sino do navio, era o único instrumento de navegação. Aliás, não só as bússolas, como faróis de navegação, eram calibradas e adquiridas na Casa Garraio, no Cais do Sodré, que tão bem conhecia. Quando a iluminação deixou de ser a petróleo, para ser eléctrica, nós, na oficina eléctrica, “electrificávamos” estes faróis de navegação, sempre fornecidos em cobre ou latão. O contra-mestre distribuía ainda as âncoras dos dóris, isto é, os pequenos “ferros do almirantado” com que os dóris eram ancorados, durante a pesca.

Ao mesmo tempo, eram distribuídas a cada pescador cinquenta braças de cabo de sisal de 8 mm, a que chamavam “rodo”, e dez braças de 12 mm, para a boca da proa.

Existem na Net excelentes fotografias de pescadores a pescar bacalhaus nos seus Dóris.

 

 

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04-05-2018