F. Ferreira Neves, Escultura de Artur Prat, Vol. XVII, pp. 284-287.

«O ÚLTIMO ALENTO»,

ESCULTURA DE ARTUR PRAT

No cemitério central de Aveiro, feito em 1835, existe um mausoléu de forma invulgar, tendo sobre o tecto de pedra uma interessante alegoria da morte, feita de bronze e medindo cerca de dois metros e meio de altura. Uma lápide colocada na fachada deste mausoléu diz-nos que ele é de Artur Prat e sua família.

O autor desta escultura é o falecido artista Artur Prat, que a denominou «O último alento». Esta obra de arte compreende duas figuras: uma simbolizando a vida; outra simbolizando a morte. A vida é representada por uma mulher nova, formosa e robusta, em pé, segurando na mão esquerda uma tocha acesa voltada para a terra − o último alento; a seus pés estão esparsas flores: rosas, martírios e saudades, representando os componentes da vida, e sobre elas uma foice.

A morte é representada por um esqueleto envolto em ampla túnica, situado, atrás da mulher e curvado para ela, segurando na mão esquerda uma ampulheta alada e erguendo o braço direito para o céu.

A maquette da escultura foi feita em Lisboa, no ano de 1914, por Artur Prat, e a escultura foi fundida em bronze também em Lisboa.

Na base do monumento encontra-se a assinatura A. C. Prat com a data 1914; por baixo da assinatura a inscrição: Venâncio & C.ª, fundidores, 1923.

Artur Prat foi um pintor e escultor já quase desconhecido na actualidade; por isso, dele vamos dar algumas breves notas biográficas para elucidação dos vivos e vindouros.

Artur Prat era brasileiro por nascimento, mas português por naturalização e educação. Nasceu na cidade de Pelotas, em 7 de Setembro de 1861, e faleceu em Lisboa em 15 de Agosto de 1918. Era filho de D. Emília da Fonseca, brasileira, e de José Prat, espanhol da Catalunha. Com dez anos de idade veio do Brasil para Portugal com seus pais e seu único irmão José da Fonseca Prat, e estabeleceram residência em Aveiro. / 285 /

Aqui fez Artur Prat exame de instrução primária, continuando em seguida em Lisboa os preparatórios para a matrícula na Escola Politécnica, que frequentou durante um ano. Matriculou-se depois na Academia das Belas Artes, de Lisboa, onde fez o curso com distinção.

Logo a seguir, e mediante concurso público, foi nomeado professor e director da Escola Industrial de Portalegre, onde exerceu acção tão notável que foi louvado e premiado. Mais tarde foi transferido a seu pedido para a Escola Industrial Marquês de Pombal, de Lisboa, e posteriormente para a Escola Industrial de Coimbra, onde esteve até o ano de 1904.

Até esta data já Artur Prat se tinha distinguido como pintor, pois concorrera com alguns quadros a diversas exposições no Grémio Artístico, de Lisboa, e à Exposição / 286 / Universal de Paris, em 1900. Animado, porém, de imenso desejo de se aperfeiçoar e aprender com os grandes mestres da Arte, Artur Prat partiu para Paris em 1904 e lá fixou residência durante oito anos.

Nesta cidade fez extraordinários progressos na pintura, e o número dos seus quadros foi aumentando. É de notar que não procurou especializar-se num só género; pelo contrário, era ao mesmo tempo retratista, paisagista e animalista.

Artur Prat estava-se preparando para uma demonstração pública do seu valor artístico. Com efeito, no dia 2 de Março de 1906, inaugurou-se em Paris a primeira exposição portuguesa de pintura, feita por ele, na Galérie des Artistes Modernes. NeIa figuraram mais de sessenta quadros, compreendendo retratos de pessoas notáveis, paisagens francesas, e algumas paisagens dos rios Vouga e Mondego.

Esta exposição chamou a atenção do mundo artístico parisiense, da Imprensa, e de grande número de pessoas de elevada categoria social e intelectual.

Em virtude do êxito desta exposição, o rei D. Carlos concedeu a Artur Prat o oficialato da Ordem de Avis.

Em Dezembro deste mesmo ano foi inaugurada em Paris, no Palais Royal, a exposição do Museu Colonial Português, tendo sido a parte decorativa em pintura totalmente executada por Artur Prat.

No mês de Junho de 1907 fez este a primeira exposição portuguesa de pintura em Londres, nas Bruton Galleries, Bond Street.

A estas exposições referiram-se largamente as seguintes publicações:

A Ilustração Portuguesa, de 19-3-1906;

O Mundo Elegante (publicado em Paris), de 10-3-1906;

La Vie Illustrée, de 2-3-1906;

La Revista de Paris, de 3-3-1906;

La Revue Diplomatique, de 23-12-1906;

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The Queen e The Crown, respectivamente de 13 e 20 de Julho de 1907.

A partir de 1908, Artur Prat dedicou-se também com muito entusiasmo à escultura; alguns dos trabalhos que fez neste género ficaram em França.

Tendo-se-lhe abalado muito a saúde, regressou então a Portugal em meados de 1912, e instalou o seu atelier em Lisboa, na Avenida de António Augusto de Aguiar.

Aqui fez ainda várias esculturas, entre as quais diversos bustos, as três estátuas monumentais representando a Pintura, a Escultura e a Arquitectura, que sobrepujam o palacete da Ordem dos Engenheiros, em Lisboa, e, para o terraço do mesmo, o vaso monumental de granito, com lindos e inspirados grupos finamente cinzelados, representando as quatro estacões do ano.

Como seu irmão José viveu sempre em Aveiro e aqui constituiu família, Artur Prat vinha com frequência a esta cidade, e por aqui se demorava por vezes.

Logo que regressou de Paris a Lisboa, mandou construir em Aveiro, que ele considerava sua terra natal, um mausoléu para nele serem guardados os seus restos mortais e os de sua família.

Foi para encimar este mausoléu que ele fez em 1914 o grupo alegórico «O último alento» a que atrás nos referimos.

Em 1917 Artur Prat adoeceu gravemente, e passado proximamente um ano, faleceu em Lisboa, aos 15 dias de Agosto de 1918. No dia seguinte, o seu cadáver foi trazido para Aveiro, e sepultado no jazigo que havia mandado construir.

A alegoria da Morte foi aqui colocada depois de 1923, mas esteve ainda coberta durante muito tempo até 1927. Na acta da sessão da Câmara Municipal de Aveiro, de 22 de Dezembro de 1927 lê-se o seguinte passo:

«Foi presente um ofício de José da Fonseca Prat, participando que já se acha exposto ao público o grupo simbólico em bronze que encima o mausoléu de seu falecido irmão Artur da Fonseca Prat.»

As referências que fazemos aqui a Artur Prat são também homenagem à memória deste, que, não sendo natural de Aveiro, sempre por esta cidade mostrou entranhado afecto, a dotou com uma obra de arte notável e valiosa, e nela quis dormir o sono eterno.

Aveiro, Outubro de 1951.

FRANCISCO FERREIRA NEVES

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