Ruela Pombo, A Rainha D. Maria I, Vol. XVII, pp. 264-267.

A RAINHA D. MARIA I

(ECOS DA SUA MORTE)

Abertura:

TENHO aqui, na minha colecção de folhetos, um, no qual consta a notícia do quebramento dos escudos − na cidade de AVEIRO pela morte da Rainha D. Maria I.

Como o assunto não seja suficiente para encher quatro páginas do Arquivo do Distrito de Aveiro, peço licença aos meus bons Leitores para apresentar-lhes também, embora em resumo, a descrição das cerimónias fúnebres, cívicas ou religiosas, que, pelo mesmo motivo, foram realizadas no Rio de Janeiro, no Porto, em Braga e em Viseu... (1)

Na cidade do RIO DE JANEIRO

Faleceu a Rainha D. Maria I a 20 de Março de 1816 na cidade do Rio de Janeiro, aonde, com felicidade relativa e prudência patriótica, a Corte Portuguesa se havia acolhido para se livrar das garras furiosas de Napoleão Bonaparte.

A cerimónia da quebra dos escudos, com todo o rigor da pragmática, efectuou-se no dia 27, oitavário do óbito.

Foram quebrados não 3 mas 4 escudos nas praças de Santa Rita, do Capim, do Rossio e da Lapa do Desterro.

No tomo II das suas Memórias... do Reino do Brasil, o cónego LUÍS GONÇALVES DOS SANTOS (o padre Perereca) dá notícia da morte e do funeral da Rainha D. Maria I, com abundantes minudências ou particularidades rigorosas. / 265 /

Na cidade do PORTO(2)

A triste notícia da morte da Rainha D. Maria I chegou à cidade do Porto no dia 15 de Julho e, no mesmo dia, o tenente-general Governador, Excelentíssimo Filipe de Sousa Canavarro, deu as ordens para que se fizessem as cerimónias militares do estilo.

Mandou postar, na praça de Santo Ovídio, uma bateria de três peças, para dar uma Salva Real de vinte e um tiros, medeando o espaço de um quarto de hora.

A primeira salva, que ressoou pela Cidade, causou geral tristeza em toda a população, sem distinguir classes...

O ilustríssimo Senado da Câmara também recebeu a devida comunicação oficial; e, no dia 16, fez as participações ao Cabido, Comunidades Religiosas, Paróquias e Igrejas para que os sinos, nas torres, tocassem a finados, de manhã, ao meio dia e ao sol posto.

No dia 17, pelas 10 horas da manhã, saiu da Real Casa Pia, aonde a Câmara fazia interinamente as suas vereações, o BANDO PÚBLICO para dar a saber aos moradores da Cidade e do Termo o luto que deviam tomar pela morte da Rainha.

Nas Praças e Terreiros, conforme o uso e costume, foi lido o Pregão em alta voz...

A quebra dos escudos efectuou-se na tarde do dia 19: o 1.º, na Praça Nova, defronte da nova Casa que, havia pouco tempo, o Senado tinha comprado para fixar a sua residência; o 2.º, no Largo de S. João; e o 3.º, no Largo da Feira.

Nos dias 4 e 5 de Agosto, celebraram-se na Sé Catedral as exéquias religiosas.

Pregou Frei José de Lima, eremita calçado de Santo Agostinho.

Na cidade de AVEIRO

A 19 de Julho, chegou à cidade de AVEIRO a notícia da morte da Rainha D. Maria I...

− «No dia 20, o Senado da Câmara anunciou ao Público esta infausta notícia por um BANDO...

No dia 30 de Agosto, à tarde, se celebrou o quebramento dos escudos, na forma seguinte: Juntaram-se, na Casa da Câmara, o Senado e Cidadãos, / 266 / vestidos de rigoroso luto, capas compridas, chapéus desabados e só com a aba da frente levantada, fumos caídos, e varas pretas...

Na frente, ia um piquete do Batalhão de Caçadores número 10...

Servia de Alferes da Bandeira João Agostinho Barbosa de Novais, pessoa da Nobreza, que montou em um bem ajaezado cavalo todo coberto de preto, com a Bandeira também preta na mão direita, indo uma grande parte dela de rastos pelo chão, guiada e conduzida pelo Porteiro da Câmara; e, dos lados do cavalo, dois homens de Vara, todos vestidos de luto...

Iam também o Alcaide da Cidade com Vara branca; dois Almotacés; Vereadores; e os três Cidadãos da Nobreza, escolhidos peta Câmara, Pedro de Sousa Brandão de Albuquerque Ribeiro Bacelar, Bernardo Barreto Feo e João Crisóstomo Gravito de Veiga e Lima, levando os escudos, cobertos de fumo...

Em último lugar: − O Senado com o seu Presidente, o Doutor' Juiz de Fora Pedro José Bruno Biscaia da Silva; o Governador Militar da Cidade, Francisco Xavier da Silva Pereira; o Regimento de Milícias...

No Largo do Espírito Santo, achava-se um tablado alto com escabelo no meio, todo coberto de preto...

A banda de música do Batalhão ia tocando uma marcha com propriedade alusiva àquele triste acto...

Subiu ao tablado Pedro de Sousa Brandão de Albuquerque Ribeiro Bacelar, com o Meirinho dos Órfãos, a quem aquele entregou o chapéu; e, descobrindo-se todos, disse:

Chorai, Nobres: chorai, Povo! que é morta a Nossa Rainha Dona Maria Primeira...

Bateu com o 1.º escudo e o quebrou, e o Meirinho pegou nos fragmentos e recolheu-os em uma bolsa preta, que para isso levava o Porteiro...

Cobriram-se todos e seguiu o Cortejo, na mesma ordem, para a Praça, onde estava outro tablado; e quebrou o 2.º escudo Bernardo Barreto Feo...

No Largo da Vera Cruz, quebrou o 3.º escudo João Crisóstomo Gravito da Veiga e Lima...

Recolheram-se à Casa da Câmara na mesma ordem em que dela saíram; e cessaram os sinais que nos sinos da Câmara e Igrejas continuamente se fizeram...

Era bem divisado nos semblantes de todos as fiéis vassalos o sentimento da morte de tão benigna soberana...» / 267 /

A quebra dos escudos em VISEU

Realizou-se no dia 31 de Julho em Viseu a cerimónia da quebra dos escudos pela morte da Rainha D. Maria l....

Foi quebrado o 1.º no Largo de Cimo de Vila, diante das Casas do reverendo Cónego João Alexandre, pelo cidadão Bernardo da Silva Cardoso e Melo, pessoa da primeira nobreza e distinção.

No Rossio de Santo António, quebrou o 2.º escudo Miguel de Almeida Tovar de Meneses....

No Terreiro das Freiras, quebrou o 3.º escudo o cidadão António de Lemos e Sousa Moniz Caldeira....

Foi esta Procissão em todo o giro acompanhada por uma Guarda de Capitão do Regimento de Infantaria n.º 11.

Exéquias na cidade de BRAGA

As exéquias Religiosas, em sufrágio da alma da Senhora Rainha Dona Maria l, realizaram-se em Braga na tarde de 26 de Agosto de 1816, com Vésperas e Matinas cantadas; e, na manhã de 27, com Laudes e Missa.

Assistência: − Irmãos da Mesa da Santa e Real Casa da Misericórdia; a Câmara Municipal; a Relação Metropolitana; a Oficialidade de Infantaria número 15; a principal Nobreza; concurso de muito Clero, tanto secular como regular...

Honrou todos os actos o Excelentíssimo e Reverendíssimo Senhor D. Frei Miguel da Madre de Deus, Arcebispo e Senhor de Braga, Primaz das Espanhas.

Recitou a Oração fúnebre − eloquente, erudita e patética − o muito reverendo Padre Frei António de Santa Catarina, Religioso dos Menores Observantes da Província da Piedade.

P.e RUELA POMBO

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(1)Relação Do modo como se quebrárão os Escudos na Cidade de Aveiro pelo fallecimento da Augustissima Senhora D. Maria I.
        Na Impressão Régia, s. a. n. d., 4 págs. inums., que incluem também a Relação das Exequias celebradas em Viseu e em Braga. São um apenso à "Gazeta de Lisboa" n.º 216, de 11 de Setembro de 1816.

(2)Narração do que se passou na cidade do Porto por occasião da morte da Senhora D. Maria Primeira, Rainha de Portugal, Brazil, e Algarves. &.&.&.
      Lisboa: Na Impressão Regia. Anno 1816. − Com Licença. S. a. 16 págs.

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