DATAM do
período da «reconquista cristã», os chamados «votos de Santiago ou do
rei Ramiro».
Na luta
gigantesca contra os mouros que, em 711, invadiram a Península, nessa
campanha memorável em que a Religião e o Patriotismo andaram intimamente
unidos,
−
desempenharam
papel de muito relevo duas figuras que pertencem à História: D. Pelaio,
o vencedor de Covadonga e primeiro Rei das Astúrias, e D. Ramiro, o
esforçado capitão que, com um punhado de valentes soldados, se apoderou
de muitas terras da antiga Galécia, que tinha por limite o rio Douro.
Reza a
Tradição que, na véspera da batalha de Clavijo, o
Apóstolo Sant'Iago aparecera a D. Ramiro, prometendo-lhe a
vitória contra as hordas sarracenas; e, segundo a mesma Tradição, ao ferir-se o combate, soou em todo o acampamento cristão
o grito «Por Sant'Iago!» e o pequeno exército comandado por
D. Ramiro alcançou uma retumbante vitória.
Em acção de graças por tão brilhante e inesperado feito de
armas, D. Ramiro e os seus guerreiros tomaram o compromisso
de oferecerem, todos os anos, a Sant'Iago de Compostela, «de
cada geira de terra uma medida do melhor fruto dela».
Tal compromisso parece ter sido tomado em 834, da era
cristã.
Com o rodar dos séculos, sofreram os «votos do rei Ramiro várias modificações e deram lugar a muitas reclamações, algumas delas assaz justificadas.
/ 80 /
A princípio, conforme refere Mgr. FERREIRA nas
«Memórias... da Cidade
do Porto», em Portugal estes votos eram pagos nas
dioceses de Braga, Porto e Bragança, pertencentes à velha Galiza, por
ficarem ao norte do Douro. Os Prelados e Cabidos destas Dioceses
recebiam este tributo, por um acordo com o Arcebispo e Cabido de
Compostela.
A obrigação dos «votos de Sant'Iago» estendeu-se, depois, às terras de
Santa Maria (Gaia e Feira), que, pertencendo ao Bispado de Coimbra até
1124, nesta data passaram para a Diocese do Porto, por uma concórdia
entre D. Hugo, Bispo do Porto, e D. Gonçalo, Bispo de Coimbra.
Sobre o pagamento dos «votos» estabeleceu-se, mais tarde, uma convenção
entre o Rei D. João I e as partes interessadas; e a «Ordenação do
Reino» chamava «civil e secular» a esta obrigação, que consistia no
pagamento «de duas rasas de milho por parte de cada lavrador que tivesse
uma junta de bois.
O Estado recebia o terço destes tributos, que terminaram por Decreto
de 23 de Julho de 1822, publicado pelas Cortes Constituintes.
(Obra citada,
pág. 105).
*
* *
No último quartel do século XVI (1586), a pequena freguesia de Duas Igrejas, do Termo da Feira, contava sete casais voteiros, isto é, obrigados ao pagamento dos «votos de Sant'Iago
ou do rei Ramiro».
Passo a mencioná-los, reportando-me e transcrevendo o que
está exarado no «Tombo dos Votos», Livro n.º 788, do Arquivo
Distrital do Porto.
Freguesia de Duas Igrejas, Feira
1) O Casal do Fundo de Vila e do Mosteiro de Arouca, em que mora Gonçalo Francisco, Pedro André e António André;
paga 2 alqueires de centeio e 2 de milho.
2) O Casal do Cimo de Vila e do Mosteiro de Grijó, em
que mora Pero Anes, Francisco André e Jorge André; paga 1
alqueire de centeio e 1 de milho.
3) O Casal do Cimo de Vila e do Mosteiro de Grijó, em
que mora Pero Enes e Jorge Enes de Guate; paga 1 alqueire de centeio e 1
de milho.
4) O Casal da Cal do Morgado Jorge
Moniz, de Angeja,
em que mora Maria Gonçalves, de Arrifana; paga 1 alqueire de
centeio e I de milho.
5) O Casal do Souto e do Morgado Jorge Moniz, de Angeja,
/ 81 /
[Vol. lII - Nº 9 - 1931] em que mora
Bastião Alves e Frutuoso Fernandes; paga 1
alqueire de centeio e 1 de milho.
6) O Casal da Eira e do Morgado Jorge
Moniz, de Angeja, em que mora Braz
André; paga 1 alqueire de centeio e 1 de milho.
7) O Casal de Joaninho e do Mosteiro de Grijó, em que
mora Frutuoso Alves; paga 1 alqueire de centeio e 1 de milho.
Soma
− dezasseis alqueires».
Padre M. F. DE
SÁ
|