[Vol. 1
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N.º 4 −
1935]
As «Memórias e Datas para a História da Vila de
Ovar», escritas em 1868 pelo DR. JOÃO FREDERICO TEIXEIRA DE PINHO, ainda hoje se consideram como
um trabalho de séria investigação, apenas ofuscado
pela paixão política quanto às figuras e acontecimentos do seu tempo. João Frederico deixou a impressão de ter percorrido todos os
arquivos e compulsado todos os documentos e marcou tão categoricamente
as suas afirmações, que ninguém mais se atreveu a investigar, nem a
duvidar da objectividade da sua obra. A fim de se pôr a coberto de
críticas, omitiu a citação das
fontes e lançou aos leitores este repto: «Quem duvidar, que
busque, como nós fizemos e seja esse o castigo da sua desconfiança».
Foi na convicção de que não poderia acrescentar ao seu trabalho mais que
as citações, que me abalancei à pesquisa dos
documentos em que ele o teria baseado. Qual a minha surpresa,
à medida que iam aparecendo materiais que obrigavam a rectificá-lo e a
contradizê-lo, e permitiam fazer nova história, a verdadeira história
que ele nem sequer entreviu! Em breve concluí que João Frederico, em vez
de estimular futuros investigadores, se tornara paradoxalmente o seu
maior entrave.
As «Memórias e Datas», que nunca viram integralmente a
luz da publicidade, estão divididas em quatro partes:
a) Considerações gerais sobre a Vila;
b) Primeira época
− Desde a origem da antiga Vila até à
sua transferência para Ovar;
c) Segunda época
− Desde a transferência da Vila e fundação da igreja de Ovar até ao presente;
d) Investigações subsidiárias
− Condado da Feira, Mosteiro
de Grijó e Comenda de Malta.
Em todas elas é preciso fazer cuidadosa revisão. Podemos
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aceitar a divisão da história de Ovar nessas duas épocas, mas
dando-lhes por baliza o foral de D. Manuel no século XVI, sem
falar em transferência da vila nem em fundação da igreja.
Quanto à primeira época, o autor das «Memórias e Datas»
guiou-se quase exclusivamente pelas referências do Elucidário,
de VITERBO, e do Catálogo dos Bispos do Porto, de D. RODRIGO DA
CUNHA. Raro colheu documentos inéditos e não soube integrá-los no quadro histórico. Não
ligou a devida importância ao
foral: deixando o que nele há de verdadeiro interesse, transcreve-lhe «por mui curiosa» a introdução, igual para todos, e chega a confundir Cabanões de Ovar com Cabanões de Segadães.
É pura fantasia tudo o que ele diz sobre as origens da vila e
que tão divulgado tem sido à sombra da sua autoridade. De todo esse capítulo só podem aproveitar-se os documentos, e
esses com a
maior reserva quanto à fidelidade da tradução ou transcrição.
Além de João Frederico, recolheram elementos para a monografia de Ovar, o falecido A. DIAS SIMÕES, autor do volume
Ovar-Biografias, e o rev. P.e MANUEL LÍRIO que já publicou dois
valiosos trabalhos − Os Passos de Ovar e Monumentos e
Instituições Religiosas −, além de muitos artigos dispersos por jornais
e revistas e sobretudo pela colecção do Almanaque de Ovar. A Monografia da Freguesia Rural de
Ovar de JOÃO VASCO DE CARVALHO, publicada em 1912 no «Boletim da Direcção Geral da
Agricultura», é de reduzido interesse histórico.
Os documentos fundamentais para a história desta vila até o século XVI,
vai reuni-los pela primeira vez o Arquivo do Distrito de Aveiro.
INTRODUÇÃO
A história comum das povoações rurais e marítimas do norte de Portugal,
traçou-a ALBERTO SAMPAIO em lúcidos estudos
que preenchem à maravilha o largo período em que nos faltam
testemunhos directos.
Antes da conquista romana, esta parte da Península era habitada por pequenos povos que, deixada a vida errante dos
tempos primitivos, se haviam agrupado em comunas politicamente autónomas, chamadas
civitates. Umas vezes, tinham um oppidum, espécie de praça forte que servia de centro de governo, de defesa e de habitação; outras, viviam
no seu território
em casas dispersas.
Dessas
civitates ou povos poucas memórias chegaram até
nós. Sabemos, no entanto, pela História Natural de PLÍNIO,
que, entre Douro e Vouga, habitavam os Túrdulos Antigos e
os Pésures: «A Durio Lusitania incipit: Turduli veteres, Paesuri: flumen
Vacca. Oppidum Talabrica». Dos oppida há ainda ruínas, hoje conhecidas
por cividades, citânias, castros ou crastos.
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Esta região da beira-mar era dominada do alto dos montes mais próximos
por uma série de castros, mencionados em antigos documentos e ainda
lembrados pela toponímia quando não pelo seu espólio: tais eram os da
Branca, Recarei (UI ou S. Martinho da Gandra), Santa Maria (Feira ou
Fiães), avil (Silvalde) e Pedroso. Que em época muito mais remota
estanciaram povos junto da antiga linha do litoral, lembra-o também a toponímia
e a tradição(1).
Com a implantação do domínio de Roma, no tempo de
Augusto, modificou-se estruturalmente o viver antigo: foram devassados
os castros, servidos pela grande via militar mencionada no Itinerário
de ANTONINO PIO; intensificou-se a vida rural e estabeleceu-se novo
regime de propriedade; a população adoptou pouco a pouco os costumes e a
língua dos invasores. A romanização foi tão completa que, volvidos
tantos séculos, ainda não eliminámos boa parte das instituições latinas.
À propriedade colectiva dos povos peninsulares, aplicaram os romanos
o regime latino da villa, unidade agrária e fiscal. Fez-se a sua demarcação com padrões; encabeçou-se essa unidade num
dominus que pagava o respectivo imposto e que por sua vez podia
reparti-la em sub-unidades pelos adscripti (servos acasalados) e
ingenui
(cultivadores livres). A vila recebeu nome romano, ordinariamente o do
seu possuidor adjectivado com um sufixo.
Em 409, vieram os suevos e uniram-se aos peninsulares
para formar um reino à parte, que em 585 foi absorvido pelos visigodos.
Essas levas germânicas adaptaram-se ao fundo étnico existente,
seguindo-lhe os costumes e respeitando o regime e os limites da
propriedade. A substituição dos nomes romanos pelos germânicos deu-se,
em geral, mais tarde, no período ástur-Ieonês. A estrutura romana chegou
assim quase intacta ao princípio do século VIII.
A invasão sarracena, em 711, veio originar profunda alteração, criando
desde logo em grande parte da Península uma nova organização social que
também se manteve por séculos. No norte não conseguiram os muçulmanos
estabelecer-se por muito tempo. Subsistiram aqui as vilas, apesar da
vizinhança e das frequentes incursões, e o povo regressava ao amanho da
terra, após a passagem dos exércitos destruidores. A raridade dos
topónimos de origem árabe é já indício de não ter
havido larga ocupação na nossa beira-mar(2).
É verdade que numa doação de 1005, referente ao mosteiro de Sever do Vouga, se lê: «uenerunt gentes hismaelitarum
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in serie colimbriense peruenerunt ad deuastandum patriam usque adeo urbis durio deuastarunt ciuitates et portelas per gladio
imperio sub regimine ipsas gentes deuastarunt omnes locos sanctos
eius». Mas o doador, o diácono Sandino Dias, carregou as tintas do
quadro: na época a que ele se reporta, continuaram entre Douro e Vouga
as doações aos mosteiros e os contratos de prédios entre particulares,
sinal de que, entre mortos e feridos, quase tudo se salvou
(3).
No entanto, se a invasão árabe não produziu aqui grande
influência directa, diz ALBERTO SAMPAIO que teve indirectamente a
maior importância por ser a causa que na sequência determinou grave
desordem em todas as relações sociais. As convulsões políticas afectaram
principalmente o senhorio das vilas. Os domini haviam fugido diante dos
invasores, como aquele D. Egas Erotes que deixou as suas terras de entre
Douro e Vouga e se refugiou nas de entre Douro e Lima onde esteve por muitos anos, como reza um documento de 1053: «consurrexerunt filii ismaelidarum super christianos et exiuit ipse domno egas
de sua terra ante ipsius gens ismaelitarum et peruenit in terram inter
urbium durio et limie». Ao voltarem na época da restauração,
encontram-se com nova compreensão dos direitos reais: o senhorio das
propriedades é incorporado na coroa com a soberania política. Os reis
ástur-leoneses fazem presúrias e deixam que os seus cavaleiros as façam.
Nos tempos de luta, estes afirmam-se senhores das vilas e chegam a
dar-lhes o seu nome, mas, estabelecida a normalidade, a coroa reivindica
os seus direitos. As propriedades do dominus ficam sendo reguengas; os
possuidores de parcelas continuam nas terras pagando as suas pensões; as
antigas sub-unidades tornam-se prédios independentes, em consequência
das doações régias.
«Assim se foi operando o retalhamento, até que no século
XIII apenas se ouve delas (das vilas) um, eco longínquo, termo
indeciso que se aplica vagamente ora a secções, ora a toda a Freguesia
rural, já em plena florescência. As duas instituições sucedem-se, mas
não se confundem: as vilas foram propriedade em todo o rigor da palavra;
a freguesia é uma espécie de comuna sem carta, que se forma em volta do
campanário. Precisar a data em que uma deixa de existir e começa a
outra, é impossível; transformações destas efectuam-se lenta e
parcialmente... Todavia em ambas o perímetro é em geral o mesmo,
e idêntica a população, proveniente da estirpe antiga das clientelas,
que desceram das citânias acasteladas».
Sucedendo às antigas vilas, as novas agremiações, que depois se chamaram
freguesias, impediram o desconjuntamento geral quando, a partir do
século VIII, se foram quebrando os laços políticos da sociedade
romano-visigótica. A igreja passou
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a ser o centro de unidade das freguesias, como o palatium o fora das
vilas e o oppidum das civitates. A soberania do dominus repartiu-se por
duas entidades: o rei quanto ao senhorio territorial, o abade quanto ao
domínio moral. A coroa era representada junto dos povos pelos juízes
para a solução de pendências e distribuição de encargos, pelos senhores
das terras ou ricos-homens que constituíam a corte ou séquito dos reis,
sobretudo na guerra, e pelos mordomos que «ao ofício de feitores
acumularam a cobrança das penas pecuniárias pelos delitos e crimes».
Não
quer isto dizer que datem dessa época as igrejas e paróquias. A
pregação cristã na Península e a simultânea erecção de templos começaram
de certo nos tempos apostólicos. Se é lendária a distribuição de
dioceses atribuída a Constantino Magno, não sucede o mesmo com a divisão
de bispados e paróquias feita no concílio de Lugo em 569, embora os
fragmentos das respectivas actas sejam posteriores.
A verba respeitante à diocese de Coimbra, que por
esse
tempo se estendia até o Douro, diz: «Ad Conibriensem, Conebrei (Condeixa ?), Eminio (Coimbra), Lutbine (Lorvão? Outro códice diz
Lurbine), Insula, Antunane (Antoã? Deverá ler-se Insula Antunane? Outro
códice diz Insulae, Astusiane), et Portucale Castrum antiquum (Caia»).
Essas paróquias formadas pela Igreja eram, porém, muito diversas das
freguesias que depois surgiram por espontâneo movimento popular.
As pequenas igrejas rurais foram sucedendo umas às outras nas vilas,
desde os primeiros séculos, respeitando-se em geral na sucessão os
respectivos oragos ou santos titulares.
Baseando-se nos padroeiros nomeados nas Inquirições, diz ALBERTO SAMPAIO
que «umas foram fundadas pelos senhores no governo romano e visigótico,
outras por eles juntos com os cultivadores, e o maior número só por
estes. No primeiro caso, o padroado passou extreme para a coroa; no
segundo, apenas a parte do senhor, continuando em poder do povo a que
dantes lhe pertencia; no terceiro, era de exclusiva propriedade do
último, e em seu poder se conservava no século XIII, quando não tivesse
havido usurpações». «Em geral, o (padroado) dos cavaleiros, ordens, mosteiros e dioceses resultava de compras,
doações obtidas da coroa ou de particulares, e também de violências
muito vulgares nisto».
Embora não dispense a frequente consulta dos trabalhos de ALBERTO
SAMPAIO, era preciso este resumo para a boa compreensão dos
documentos que vão seguir-se. Da obra do eminente investigador,
interessam-nos especialmente «As Vilas do Norte de Portugal» e «As Póvoas Marítimas»,
pelo duplo aspecto, agrícola e marítimo, em que a
gente da nossa beira-mar desenvolveu através dos tempos a sua
actividade.
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AS VILAS DE OVAR E CABANÕES
NOS SÉCULOS X E XI
Não pode afirmar-se que
todas as vilas mencionadas nos
nossos documentos da época neo-gótica datem da dominação
romana, mas é fácil demonstrar que as freguesias existentes ao tempo das
Inquirições provinham duma vila ou agrupamento de vilas, naquele antigo
conceito de unidades agrárias. O nome da vila mais importante ficou em
geral a designar a freguesia, e os das pequenas que se lhe anexaram bem
como os das sub-unidades (casais, quintanas ou quintas, vilares) e os
das glebas (bustelos, bouças, soutos, agros, várzeas, etc.) passaram
para os lugares da freguesia.
Ovar resultou da fusão de várias vilas próximas, sendo as mais
importantes a vila Ovar e a vila Cabanones.
Qual teria a precedência na ordem do tempo? Como vamos ver, é de
princípios do século X o primeiro diploma que directamente nos importa.
Se desse margem a disputas de antiguidade, melhor serviria à causa de
Ovar que à de Cabanões. Da investigação etimológica pouco podemos
concluir. Arredados os étimos de fantasia popular ou erudita, é lícito
lembrar com LEITE DE VASCONCELOS o genitivo Odvari, pois Oduarius foi
nome pessoal medievo, ou admitir que do rio Ovar, mencionado em doc. de
1026, 1081 e 1083, viesse o nome à terra, e deixar a investigação
vocabular para quando estiver mais adiantado o estudo das línguas ibéricas
(4). Cabanões parece de formação mais recente e aparenta-se
com outras designações toponímicas e com várias palavras da linguagem
comum. O autor das «Memórias e Datas» apropriou-se com infelicidade do
que diz Viterbo na palavra Cabaneros, pois não consta que as inquirições de D. Afonso
II chegassem a esta zona. A hipótese
favorita de João Frederico, «que os primeiros habitantes dos
antiquíssimos lugarejos de Cabanões e S. Donato foram cristãos-godos
tresmalhados, depois da funesta batalha» de Guadalete, não tem o menor
fundamento histórico.
O documento acima referido é do Livro Preto da Sé de
Coimbra e está publicado com o n.º 25 nos Portugatiae Monumenta Historica (Dipl. et Ch.). Além de importante para a história geral,
interessa a muitíssimas povoações desta região, por ser das mais antigas
e extensas listas de vilas e igrejas de entre Douro e Vouga.
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No segundo decénio do século X, governava a diocese de
Coimbra, que ainda então ia até o Douro, o bispo D. Gomado,
pessoa muito estimada pelo rei Ordonho lI de Leão. Tendo resolvido
renunciar ao bispado, acolheu-se ele com outros devotos ao ermitério
de Crestuma. Ali o foi visitar o rei com alguns nobres da sua corte,
entre os quais os condes Lucídio Guimarães e Rodrigo Luci, e todos lhe
quiseram dar prova de generosidade. Parece que foi o conde Lucídio quem
mais contribuiu para aumentar o património do convento. A carta, datada
em 12 de Junho de 922 (lIe idus iunii. Era DCCCCª LXª), enumera, além de
muitas outras, a igreja de Santa Cruz «in lagona de auuil» , a de S.
Tiago «in ripa de ul», a de S. Miguel na «uilla oliuaria», o mosteiro de
Santa Marinha «in ripa de antoana», a vila de Ossela «in terra de
eceurario», «et in porto de obal ecclesia uocabulo sancto donato et
sancto iohanne cum suos dextros integros et cum suas aiunciones».
Impossível arquitectar larga história sobre esta referência. Como
deverá interpretar-se o «porto de Ovar»? No texto do
documento fala-se em «portos» sobre o rio Douro nos quais se pagava
«nabulum et portaticum». Tratar-se-á aqui dum ancoradouro semelhante
sobre a ria? Mas em 978 a vila de Azevedo é localizada «ad ille porto de
sancto uincenti de peraria», e já o «porto» tem outra significação.
Quanto ao objecto da doação, o texto fala, no singular, duma igreja
dedicada a S. Donato e S. João e os adjectivos possessivos só a uma
podiam respeitar em correcto latim. Na linguagem tabelionar da época
cabem, porém, as duas igrejas que outros intérpretes reclamam, embora eu
os não acompanhe em considerar qualquer delas como paroquial com passais e tudo. João Frederico, não tendo conhecido o documento completo, transcreve
quase textualmente o que diz Viterbo
(palavra Igreja), e outros têm-se reportado a essa
transcrição. Ora, nos «dextros» e «aiunciones», não se contêm
necessariamente passais de pároco: bem podem esses termos designar
logradouros ou adros de simples ermida, chamada
igreja como outras enfaticamente se chamaram basílicas. Note-se, enfim, que o diploma fala
no «porto de Ovar» (ancoradouro de barcos, foz de rio, ponto de
passagem, entrada da terra, estrada ?), e não em Cabanões − o que mal se coaduna
com a
entidade paroquial de Cabanões à volta da igreja de S. João no
séc. X (5).
No último quartel deste século ocorreram, porém, neste tracto da
beira-mar, factos que talvez possam explicar como o nome de Cabanões
veio por muito tempo a prevalecer em
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notoriedade ao de Ovar. Foram as célebres incursões de Almançor, de que
não temos aliás documentação precisa quanto às datas e importância dos
estragos causados nestas povoações. Pelo ano de 987 assolou ele a cidade
de Coimbra e em 997 avançou até ao Porto onde recebeu tropas vindas de
Alcácer por mar, para a grande expedição que o levou até Compostela e
Corunha. Entre esses anos deve ter feito várias sortidas pelas terras
situadas entre Douro e Mondego e de certo não avançou para o Porto sem
deixar ocupada a nossa beira-mar(6). Diante das suas tropas fugiam os
nobres e pessoas abastadas, mas está demonstrado que elas não deixavam
atrás de si o deserto. Passado o terror dos primeiros dias, o povo
voltava aos seus trabalhos no campo e ia estendendo o cultivo às terras
abandonadas pelos ricos senhorios. Assim se explica que subisse de
importância uma aldeia composta de «cabaneiras ou choupanas», «habitadas
pelos proletários do campo, pelos jornaleiros, a que davam o nome de cabaneiros» (ALEXANDRE HERCULANO).
Na reconquista, como já se disse, havia presúria, e cada nobre ou
cavaleiro recém-vindo tomava o que melhor lhe parecia, ressalvados
sempre os direitos reais. As vilas eram como que refundadas ou
repovoadas pelos novos senhores, porque a gente que ficara quase se não
contava.
P.e MIGUEL A. DE OLIVEIRA
Continua vol. 2, pág. 21
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