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Em Trancoso alguém falou de uma bebida que ninguém conhecia e lá
fomos até ao Castiço prová-la. Era uma bebida adocicada e de
elevado teor alcoólico e bebemos duas rodadas. E na conversa
soube a sua composição de que prometi guardar segredo. E quase
logo a seguir ficou combinada uma visita à Cogula, um lugar de
muitas indústrias como a latoaria e a produção de azeite e
aguardente. E lá fui. |
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Fui recebido no Centro de Interpretação da Cogula, onde recebi um
livro sobre a Freguesia e comprei ainda uma colecção postais que
reproduzem 20 aguarelas em exposição. Logo me avisaram que a 28 de
Agosto foi feita uma maratona fotográfica em que se tentou retratar
a aldeia tal como ela é. E com atraso também participei nesta
maratona pois casas e igrejas não faltam. De facto, no cimo da
aldeia, junto á Igreja de S. Silvestre há uma bela paisagem e pode
ver-se a Marofa. Tirei também fotografias dos muitos objectos em
lata aí expostos da autoria de António José Apolinário. Neste
negócio de latoaria, há ainda produção de caleiras por Leonel e
Francisco Maltez. No Centro de Interpretação há também reproduções
em madeira dos equipamentos e objectos agrícolas agora em desuso,
feitas por José Horácio.
Ao entrar na Cogula, reparei nos estaleiros da central de Betão da
Chupas & Morrão e próximo estava um outro da Betão Liz. Logo à
entrada vemos um lagar de azeite, agora movido a electricidade, mas
que antes era movido pela força motriz das águas do ribeiro.
Informam-me que há ainda dois moinhos, estando ainda um em
funcionamento. Pouco depois, bem cuidada, vi a casa do Dr. Luciano
Pinto de Campos, agora utilizada para turismo de habitação e o
Centro de Interpretação. Pouco depois encontramos muitas casas
apalaçadas, agora abandonadas pois os seus donos deixaram de as
habitar, sendo uma delas a casa do pároco, que também não a habita.
Recordam-me o papel protector dos quatro Juízes Conselheiros, que
moviam influências para que a aldeia tivesse acesso a todas as
vantagens da civilização como foi o caso da electricidade.
Entramos no café, bebemos uns finos imperiais e sabemos que o
negócio é fraco e não dá para fazer dele um restaurante. Ao lado,
está desactivada por falta de quem o queira dirigir a Sociedade de
Instrução e Recreio Cogulense. Pior ainda, foi a transferência mal
justificada da velha Farmácia Crespo, fundada por um homem de Castro
de Aire, que veio à boleia nos 20 para a fundar. É o fruto da nossa
incivilizada governação pois, infelizmente, esta malfeitoria está a
acontecer por todo o lado.
Subindo a rua, encontrámos a loira e lindíssima Tatiana, uma criança
traquina de dois anos. A avó, a Sra. Isabel, admirada por se ter
deixado fotografar, começou uma longa conversa sobre as muitas
coisas úteis que guarda em casa, preservando riquezas antigas que
alguns herdeiros pouco assisados deitam fora. Mostrou-me ainda
cruzes na parede da casa que mostram a presença judaica. Fiquei
também a saber que produz queijo de cabra que vende por encomenda.
Junta-se esta produção à de vinho e azeite que fazem a riqueza
agrícola da Cogula.
Há ainda produção de velas pela família Amado que com uma carrinha
as vende pela região, mas antes transportava-as em machos, fazendo
jornadas de três dias. Conversando com o patriarca da família, vi
como conhece bem o Jarmelo e os Monteiros, terra do meu pai. Tem
também uma mercearia onde trabalha a mãe.
A escola tem ensino pré-escolar e primário, não faltando crianças
para a encher, mas os empregos, por força da crise, continuam
precários, obrigando à emigração dos pais. Para os mais idosos,
propriedade da Santa Casa de Misericórdia de Trancoso, há um centro
de dia com valência de centro de noite que emprega 12 pessoas.
Já de saída, vi a pequena oficina de Rui Castro Pena, um vidreiro
que na emigração aprendeu a trabalhar o vidro, produzindo peças
maravilhosas como nos mostrou feliz a mulher, que aqui vive rodeada
de flores, uma marca da terra.
Aires Antunes Diniz |