Acesso à hierarquia superior.

Castelo Mendo - Turismo acidental

 

CasteloMendo. Clicar para ampliar em alta resolução,
Aspecto de Castelo Mendo. Clicar  na imagem para ampliação em alta resolução.

O frio cortava o ar quando me aproximei numa manhã de fim de inverno, Cheguei cumprimentei muitos turistas e poucos habitantes, mas eu teimava em dar as boas tardes. Já sabia que em Castelo Mendo não havia nenhum comércio, nem sequer um guia, como logo verifiquei, quando vi uma mulher a dar algumas e escassas informações a um grupo de turistas. Também a mim as deu quando desci e logo me pediu dinheiro para a festa de Nossa Senhora de Fátima no dia 13 de Maio, que num mundo globalizado aqui substitui a Festa Tradicional ao Divino Espírito Santo.

 

Disse-me que a terra só tem 27 pessoas, todas elas de idade e a caminho do fim da vida pois tudo se acaba. Repetia. Acabou por me informar que o cemitério tinha sido alargado para acolher os muitos habitantes falecidos, mas antes foram-se espalhando por todo lado, Guarda, Lisboa, Coimbra, Suíça e até de Salamanca. Aqui vive uma mãe de dois gémeos e de uma menina com um avô de Pousade e uma avó de Castelo Mendo, que me falou da Ti Lurdes do Alípio, que ia de Pousade vender roupas na Feira de Pínzio.
 

Clicar para ampliar.

Pouco depois o senhor Manuel informou-me que os habitantes eram 50, dos quais uma menina em idade escolar que por isso vai todos os dias para Vilar Formoso. E a escola lá está sem ninguém. Encontrei-o quando vinha do campo, queixando-se do vento frio e cortante e logo me tirou as dúvidas acerca de uma estranha construção, uma cisterna, infelizmente vítima do vandalismo dos que a enchem de lixo.


Encetámos então uma conversa frutuosa pois me confirmou que as pedras que aqui faltam estão agora nas casas da aldeia, que deixou de ser sede de concelho em 1855, passando então a pertencer ao concelho de Sabugal, mas em 1870 passou para o concelho de Almeida. Teve foral
desde 1229, por iniciativa do Rei D. Sancho II, confirmado depois por D. Dinis em 1281 e revogado em 1510. Nasceu na sequência do Tratado de Alcanices que alargou a fronteiras para leste e como toda esta região, Castelo Mendo foi acarinhado pela acção governativa de D. Diniz. O foral que organizava Castelo Mendo dava-lhe o privilégio de ter mercados ou feiras que o abasteciam, mas tudo isso desapareceu na voragem do tempo. Até o pequeno comércio que existia à entrada da vila desapareceu e já nada resta na memória das gentes. Ninguém me falou das antigas indústrias artesanais como as do ferro e da madeira. Agora só há a Casa do Corro que só abre quando o turista encontra a dona. Ninguém me falou das cabras e das vacas que aqui existiram e que eram pela descrição jarmelistas, ou seja do Jarmelo aqui tão perto que, como Castelo Mendo, também resiste à desertificação. E contra esta forma de destruir a vida das aldeias e mais ainda contra a incúria dos homens e mais ainda os governantes que nada decidem, escreveu Amorim de Carvalho uma monografia de Castelo Mendo, tentando contrariar o triste destino que agora faz morrer o mundo rural.

 

O senhor Manuel mostrou-me também o Mendo e a Menda, figuras de gente que parecem viver para sempre, numa estranha cumplicidade de casal, que representam um amor eterno diz-se em
 

www.portugalnotavel.com/2011/01/aldeia-historica-de-castelo-mendo-almeida/


acesso em 5 de Março de 2011. Explicou-me também o que aconteceu a Miguel Augusto de Sousa Mendonça, assassinado em 1840 aos 37 anos pelos seus soldados e enterrado em Castelo Mendo perto da Igreja de Santa Maria, uma das Igrejas mais importantes do bispado egitaniense. E enquanto falávamos apareceu um grupo de turistas acidentais, sedentos de informação histórica, mas nada lhe era oferecido.

 

Estamos assim perante a necessidade de uma clara aposta no turismo para que deixe de ser um mero acidente estar aqui, afirmando-se como o resultado da valorização do seu património. Para isso, há que incentivar a presença de empresários que invistam, mas claro que isso impõe que as portagens estranguladoras dos fluxos turísticos não venham como mau agoiro criar mais barreiras à sobrevivência e desenvolvimento desta terra amiga e bem nossa.

 

Aires Antunes Diniz

In: “Notícias”, 16 de Março de 2011, pág. 10
 

Um elemento de Castelo Mendo. Clicar  para ampliar.
Um elemento da população. Clicar  para ampliar.

 
Página anterior Página inicial Página seguinte