Mas voltando aos tempos e anos setenta do século XV, quando reinava em
Portugal Afonso V, desde 1438, sob a tutela de sua mãe D. Leonor, casada
com D. Duarte, do qual há
informações de, naquele tempo, já as ondas de maré entrarem na Laguna
dificilmente, apenas no colo das preias-mar, avolumar as águas doces dos
rios e invernias, e portanto
apenas a movimentá-las e obviamente a limpar, para não se putrefazerem e
regressarem ao Oceano.
Tal conclusão, retiro-a do caso ocorrido com o navio Cadramoz que, em
período de peste e fome, na região de Aveiro, já quando aqui no convento
de Jesus, vivia a Princesa e
futura Santa Joana, a Câmara Municipal ter mandado à Ilha da Madeira,
onde era corrente, haver trigo em abundância.
Ora o Cadramoz, não pode ter sido outra embarcação, imagino, senão de
fundo chato, isto é sem quilha, do tipo e género das que, nos séculos
nove ou dez, foram trazidas pelos
árabes para o Algarve, a coadjuvar as xávegas que, também como é óbvio e
sabido, são e sempre foram só utilizadas nas praias corridas e arenosas.
Estas embarcações de fundo e corpo mais fácil de construção, a tender
para o rectilíneo, com menos curvas e delgados, seriam obviamente, muito
mais duras e pesadas, quer a
manobrar, como no viver de quem as tripulava, por desajustadas aos
movimentos ondulatórios do Oceano, assim como aos remos e esforços no
remar.
Daqui infiro, ipso facto, não só o remo ter sido o primeiro sistema
propulsor de navegar em águas profundas,
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posteriormente ajudado por velame redondo, isto no século XV, ano
setenta, entre nós gente da Laguna, o Cadramoz ser simples unidade,
barco dito do mar, semelhante ao das
xávegas.
A sua saída da Laguna, vazio, não deve ter sido difícil e de grande
monta, quer por em águas interiores e praticamente paradas, todos os
ardis e habilidades tentadas, poderem
surtir efeitos.
A remos e de pendão armado, lá deve ter ido sul abaixo, coisa que todos
os santos ajudam, terra à vista até à Roca. Só a partir daqui e com proa
ao sudoeste, mais quarta menos
quarta, lá foram mar fora, mercê dos conhecimentos apreendidos pelos
pais de seus avós, com Manuel Passagno e os seus 20 conterrâneos
genoveses, no tempo do nosso rei D.
Dinis, a quem os nossos historiadores, lamentavelmente alcunharam de
Lavrador, chegando assim à Ilha da Madeira, publicitada em 1445.
Aqui por certo, com o barco carregado conforme o mestre permitiu e
entendeu, para só depois e então, iniciar o regresso, ao nordeste d'agulha, e não só mais lento e trabalhoso,
quer por os remos serem pesados como também, para cima a coisa toda
mudar.
Chegados ao mar da Laguna, que ao tempo seria dita e pronunciada entre
Alavário e Avieno, mas ainda não Aveiro, a tripulação ou companha
sentir-se-ia como em casa, tal
como era seu hábito de ainda pescadores, não apenas a pernoitar como a
viver, quase ad aeternum na sua bateira, onde seria a mulher a procurá-lo
para o amor e a procriação.
Aqui, imagino ter havido no Cadramoz qualquer coisa de estranho e
incidental, que o levara a arribar ao Douro.
Ainda que busque em mim termo de comparação, para encontrar o que
acontecera ao mestre do Cadramoz para arribar ao Douro, não encontro
motivo ou razão, porque a mim,
nas décadas dos anos 50 e 60, quinhentos anos depois, era por
impaciência e irritação, por ouvir que Aveiro, mercê das muitas
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e grandes obras que lhe eram feitas, tornara-se porto capaz de competir
com os melhores.
Do que sabemos da arribada do Catramoz, fora que os tripeiros, devida à
mesma peste que também os atingia, ao conhecerem o teor da carga do
barco, logo decidiram
descarregá-lo em proveito próprio.
Ora a Câmara de Aveiro, alertada pelo que iria acontecer, correra ao
Mosteiro de Jesus, onde vivia internada a Princesa Joana, que logo se
prontificara a interceder no caso. Não
como
a futura santa que viria a ser canonizada, mas como a princesa que, além
de filha do rei vigente, era irmã do duro e inflexível Príncipe Perfeito
e que, ela própria, ter já sido regente
do reino, durante o longo período em que seu pai e irmão andaram longe,
nas campanhas de África.
Fora esta carta, dirigida à Câmara do Porto que chegara ao nosso
conhecimento, descoberta por um verdadeiro historiador, João Gonçalves
Gaspar que, além do mérito em a
detectar e traduzir, teve também o merecimento de não lhe acrescentar
nem uma virgula ou ponto, para que eu, 500 anos depois,
pudesse compará-la ao comigo ocorrido, anos seguidos pelo mesmo motivo,
e acabar de hibernar no Douro.
Depois de tudo quanto tenho vindo a especular, sobre a construção do
molhe de Reinaldo de Oudinot e abertura da barra,
não posso deixar por concluir que, só depois desta edificação, a barra
de Aveiro passara a ser assinalada nas cartas de marear. Antes disto,
não suponho, pois tenho a certeza, os
navios navegando rente e ao longo da costa, na bordada do norte a partir
de Mira, ou na do sul, a partir de Ovar, em toda esta extensão, em busca
da barra, ou, melhor dizendo, da abertura na lomba por onde o colo da
onda de maré entraria na Laguna, o
que seria
tremendamente difícil, não só de encontrar, como também de lá estar à
hora e condições favoráveis, para entrar, especialmente vento e mar sem
grande ondulação.
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Ao longo dos séculos, estou em crer, quantas dezenas de navios ali,
primeiro encalharam, para depois, seguidamente, soterrarem na lomba e
ficarem sepultados eternamente.
Como é fácil de entender, mesmo por quem do mar só conheça e o julgue
pelo seu quebrar e rolar nas areias das praias, as suas ondas devem-se
ao atrito dos ventos soprando
sobre a sua superfície, a criarem-lhe, inicialmente, movimentos
circulares, que logo se transformaram em ondulatórios, consoante a
profundidade do mar no local.
Porém, os ventos, sendo correntes atmosféricas, a partir das altas
pressões para as depressões, sopram, variando constantemente a sua
intensidade e portanto a sua incidência a
não ser constante, antes variável, a provocar ondas também variáveis em
volumes e intensidade.
No entanto, a física, ciência que estuda e relaciona os corpos, seus
volumes movimentos e fenómenos, ensina-nos que «a matéria atrai a
matéria na razão directa das massas pelo
quadrado das distâncias», do que resulta as ondas pequenas e violentas
serem absorvidas pelas maiores, a resultar ficarem todas iguais ou
semelhantes.
Ora as ondas dos Oceanos, e cito estas por atingirem maior volume,
altura e força, começam no encrespar à superfície lisa e plana do mar,
que devido à acção incisiva do vento, de
intensidade e força variáveis, como são todas as correntes atmosféricas,
cria-lhes movimento ondulatório que se alarga e alteia, em função da
profundidade do mar onde se forma
e corre.
Porém, o que me é, não só estranho como secreto, por não conseguir
entender as ondas, serem por outro lado, cada uma delas, a sexta parte
de uma mesma massa de água do
mar, em divisão inexacta por seis, à última das quais soma o resto, que
desde tempos imemoráveis é conhecida pelo nome do Andaço do mar.
Enorme, de meter medo, não apenas ao quebrar como ao se
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desfazer, em cuja ressaca faz zumbido, como a querer mostrar a força da
sua diferença das ondas congéneres.
Porque será a formação e o aparecimento desta onda tão diferente em
volume e violência de todas as outras, porém formadas no mesmo mar,
revolto e tormentoso? Julgo-a ser
fenómeno, só explicável pela física, ciência que eu não domino, para
além das generalidades, apreendidas nos bancos do liceu.
Perdi horas, mirando-as e remirando de todos os ângulos e quadrantes,
sem nada mais conseguir observar, além do seu desproporcionado volume e
força, em relação a todas as
outras, a baterem no costado ou na proa dos navios, parecendo quererem
embarcar.
Algumas foram, além das simples ameaças, embarcando mesmo, ao ponto de
fazerem danos e avaria grossa, a motivar protesto à seguradora,
responsável pelos danos e
violências do mar, enquanto a viajar.
Porém o facto de eu ter dito que perdi horas, não passa de
força de expressão, por de verdade eu nada ter perdido, antes e só gasto
para chegar à rudimentar teoria de o Andaço ser: a sexta e última onda,
resultante da divisão inexacta de
uma enorme massa de mar tempestuoso em normal movimento ondulatório, à
qual soma o resto.
Mas, voltando ao que ainda era Laguna e não Ria e muito menos Porto de
Aveiro, por qualquer destes estabelecimentos pressuporem, entradas e
saídas não só à navegação,
como especialmente da onda de maré.
Assim, recordo ao sabor da memória, que pelos anos 30 deste mesmo
século, tendo eu 10 anos de idade e ligado à família de tripulantes de
navios bacalhoeiros que, chegados à
barra em meados ou fins de Setembro, tais como lugres ou iates, a calar
13 e 14 pés, ficarem 2, 3 e 4 luas frente à barra, à espera de condições
para entrarem, o que às vezes só
acontecia, em fins de Novembro e até em Dezembro.
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Se analisarmos o que fora estudado, projectado e feito, com a ideia de
transformar a Laguna num porto, mesmo abstraindo-nos da barra altamente
influenciada pelo processo
hidrodinâmico das correntes marítimas do oceano, verificaremos e
concluiremos terem sido meras consequências de erradas visões e
directivas que ali pontificaram. E, pior ainda,
de olhos vesgos, inclinados por amiguismos ou pessoas queridas e
simpáticas pela cidade, onde nasceram ou viviam. Além de menosprezarem a
máxima vinda, e a correr desde
o princípio do mundo, de que a mãe Natureza não gosta nem admite ser
desvirtuada.
Neste correr dos anos, ao sabor e ritmo da adolescência, a imaginar a
vida presente como a futura ser sempre igual, ao momento decorrente,
findas as aulas, a viver em Leça da
Palmeira, ao tempo em que os holandeses escavavam o estuário do Rio
Leça, abrir a primeira doca, no porto de Leixões e eu, chegado aos
finais do mês de Junho, ir de férias
grandes para a Costa Nova, até à primeira década de Outubro do mesmo
ano, a retomar as aulas.
Aqui, ao sabor da adolescência, e viver dentro de regras, não
necessariamente rígidas e inflexíveis, porém das impostas pela antiga
mediania da respeitabilidade social, sem excessos caseiros e muito menos
exteriores, sujeitos a
reprimendas imediatas dos pais, padrinhos ou professores, para ensinar o
mamífero que todos nós continuamos a ser, embora inteligentes, porém a
cuidar da enorme diferença,
de animal para animal que continuamos a ser.
Assim, vivendo felizes à nossa maneira de então, imaginando
o viver, que mesmo é dizer a vida ser sempre assim igual, a passar as
manhãs à beira mar, arrolaçados na areia para de quando em vez
mergulhar, aos saltos nas ondas a
quebrarem, ou a nadarmos exercitando-nos a criar resistência, para enfim
depois de cansados e até enregelados, ir de novo para areia quente a
amolecer.
Ainda aqui na borda do mar, aperceber-me da corrente d'água, nuns dias
a ir com força ao sul, enquanto noutros, porém
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mais raramente, a correr a norte e curiosamente nestes últimos períodos,
areia a fazer mais do que uma lomba, onde as ondas quebravam a fazer
lagoeiros, com todos, crianças e
adultos, a nadar afoitadamente.
Só cerca de 20 anos depois, em pleno Oceano Árctico e eu pescador,
consegui entender, não só o motivo deste fenómeno como de tantos outros,
incluindo a própria formação da
Laguna de Alavário.
Mas ainda na Costa Nova corriam os anos de 1936/1937 e nós
adolescentes, depois do jantar, que nesse tempo e para nós, era pouco
depois do meio-dia, refastelados com dois pratos de sopa e cozido à
portuguesa, íamos então para a Ria,
nus da cinta para cima, na enorme baleeira do Euclides Vaz, pois na
areia da praia era traje proibido pela policia marítima, ao rapazio com
mais de 14 anos e adultos.
Aqui, a bordo da baleeira, à roleta ao sabor da corrente de maré, na
enchente a correr para o sul, todos 6 ou 7 a dormir, até embater
atravessados nas estacas da ponte da
Vagueira, com um
ou outro acordar e gritar, toca acima. E ali então esperávamos,
aguardando a corrente de vazante que, nas mesmas circunstâncias a
dormir, regressávamos à Costa Nova.
E isto se não encontrássemos, ao longo da viagem, um ou outro moliceiro
atrevido, na faina da dragagem e apanha de moliço que, vendo aquele
grupo a sornar e dormir, não
levantasse a sua vara chibatando-a na água, a criar enorme aguaceiro
que, não só nos acordava, como nos deixava a gritar, chamando-lhes de
tudo quanto era mau e perverso e
nos vinha à cabeça.
Contrariamente, se depois de iniciada a soneca, água corresse de
vazante, a viagem tinha o seu termo contra a estacaria, porém
da ponte de duas águas, no topo leste do molhe do Oudinot a que, a maior
parte das vezes amarrávamos a boça da baleeira à estacaria, esperando o
retorno da maré. Porém outras
vezes, mais raramente, em virtude do muito trabalho que nos exigia,
consoante
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as circunstâncias e situação da maré, desemaranhávamo-nos da complicada
estacaria da ponte, aonde a corrente d'água era intensa, e passávamos
para o lado norte, rumo à
barra, pelo canal sul do triângulo regulador das duas águas, até à meia
laranja.
Aqui, ao chegar lá, armava-se o par de remos, a dar meia volta à
baleeira, esperando a reponta da maré, que nem sempre a calculávamos com
exactidão, o que implicava ali
ficarmos muito mais tempo do que o imaginado, assim a darmo-nos ensejo a
observar as obras da barra, cujo interesse nos tinha levado até lá.
Ora aqui, em espera da reponta da maré, que nos levasse à Costa Nova, às
vezes o tempo dava para tudo, desde observações como até discussões dos
vários pontos de vista,
dado os propósitos e interesses de cada um de nós ser ligeiramente
diferente.
Sem o hábito de leitura, apenas de alguns livros didácticos
obrigatórios, sem jornais, rádios, nem televisões, as conversas com ou
sem interesse limitavam-se ao ouvido em nossas
casas, onde o mais falado pelas matriarcas era a viagem de regresso dos
lugres bacalhoeiros e o estado da barra para entrarem em Aveiro.
Claro que nem todos se interessavam pela mesma coisa, e havia os que
puxavam a comentar o livro que, de momento estavam a ler. Mas porque,
pelo menos naquele tempo,
houvesse mais cabulice que estudiosos, logo eram obrigados a calar-se.
Porém, interessados todos ou não, no propósito que nos levava ali, era
observar e saber a situação das obras da barra e o estado desta, que
mais não fosse, só para alimentar as
conversas
caseiras. Além de também dar-nos ensejo a constatar que, a cerca de 100
metros a oeste de nós, a barra cerrar em toda a sua largura por, mesmo
com água morta ainda de
vazante, mas a chegar ao fim e à reponta da maré, a ligeira ondulação
vinda de fora, continuava a quebrar e a cerrar de norte a sul.
Cerca de onze anos depois das minhas peripécias na baleeira do Euclides,
nas tardes e sornas da Costa Nova, e eu já então
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marinheiro, a passar e a sofrer as passinhas do Algarve, como dizia a
minha mãe, que era a matriarca e com quem eu muito aprendi, a querer
dizer de Herodes para Pilatos, neste
caso de Leixões para o mar de Aveiro, depois de descarregada toda a
carga e peixe, e postos os navios Santa Joana e Santa Princesa no mínimo
calado de 16,5 pés, em linha
batida, acabarmos por hibernar no Douro, frente à Arrozeira.
Enquanto isto, os supostos técnicos e peritos, cujos nomes, estou quase
certo, haverão de ser afixados na esquina de um
qualquer arruamento da cidade, como já a outros acontecera, parecendo
terem sido glorificados mais pelos erros cometidos ou
dado seguimento, como fora o caso da maqueta da barra ter sido feita
com base num pobre e defeituoso modelo, no Laboratório de Engenharia
Civil em Lisboa, que entre outros
conselhos fora sugerida a construção de um terceiro molhe na costa,
a cerca de 100 metros ao sul do molhe do Oudinot.
Embora tal construção não me mereça censura, a sua edificação fora
extemporânea, pois em vez de ter sido a primeira coisa a fazer, como
acontecera, deveria ser a última.
Logo que este terceiro molhe fora iniciado, as condições da barra
pioraram e tanto mais quanto mais fora crescendo, e isto a ser alertado
pelos Pilotos da Barra, entre os quais
alguns deles
sendo Capitães da Marinha Mercante, isto é, com boa formação técnica e
grande experiência do mar, porém tidos, pelos licenciados em engenharia
civil ou mecânica, como cartas
fora do baralho. Sem receio de errar, era capaz de pôr as mãos no fogo
por eles, que sabiam, mais e melhor os efeitos da quebra das ondas e
respectivas ressacas na barra, do
que quaisquer outros observadores.
É bem certo não haver infalíveis, porque
errare humanum est. Porém, chefe
equilibrado e responsável, não pode nem deve fechar-se no seu casulo de
comando, antes relacionar-se e até
ouvir os
seus comandados, aceitando-os como colaboradores, não para
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lhes seguir as opiniões, mas intimamente para as comparar e até burilar
relativamente às suas próprias.
De tudo quanto tenho vindo a escrever e comentar, desde o projecto
imaginado e projectado por Reinaldo de Oudinot, em 1802, em função do que
o povo, na sua angústia e
simplicidade, chamava de barra, que era apenas então leve passagem, da
onda de maré, sobre a lomba, duas vezes diariamente, para oxigenar a
superfície e limpá-la dos
miasmas, a que água doce está sujeita, quando estagnada, a originar
doenças e estas, epidemias.
Entretanto os nossos fazedores de história, influenciando outros que as
recontaram, porém quanto a mim, mais responsáveis por mais actuais, já
no tempo em que a gramática, por
mais evoluída e actual, distinguia as palavras morfologicamente, entre
homónimas e homógrafas e estas das homófonas e até das populares e
regionais, como fora o caso de
Aveiro, onde a barra deixara de ser passagem à navegação entre dois
pontos fixos, mas apenas passagem da onda de maré nos dois sentidos, a
não permitir a encubação das
águas doces paradas, dos rios e invernias. Assim, aceitando a ideia
irrefutável de que entre Ovar e Mira jamais existira qualquer barra por
onde se movimentasse a navegação,
mas apenas ser a onda de maré, porém nem todas, por estas não terem
sempre a mesma altura, para superar a lomba e entrarem na Laguna.
Óbvio que no início, quando a lomba era mais rasteira, entrariam todas
as ondas, barra dentro, porém a lomba fora aumentando e crescendo, até
que hermeticamente a cerrou.
Só agora os responsáveis e mandantes da barra me parece terem chegado à
conclusão que o único segredo desta barra está no seu molhe norte e que,
enfim, irá ser prolongado,
mar adentro e a barra pelo seu sul.
Porém, permitam-me mais uma lembrança ou recomendação, de alguém que na
vida nada mais fez, senão observar e estudar o mar, que agora, depois de
tantos erros e
disparates, não será coisa fácil de concluir.
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De
lana caprina seria, quando o francês o imaginou e quis fazer, assente
em areia seca e a barra pelo sul do seu paredão, sem triângulo dito
regulador das correntes d'água, a
roubar espaço para manobras e cais de atracações.
Agora, a cada palmo que o molhe norte avance mar fora, por indispensável
às boas condições da barra, são dois palmos que se afunda mar abaixo,
quer pelas suas bases
assentarem em areias movediças, como pelos tremeliques da ondulação,
além das pancadas das vagas, na mole de pedra e cimento do pesado
paredão.
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