Atlântico Norte, a Laguna de Alavário e o porto de Aveiro – pp. 30-32


VII – Da abertura da barra

O convite feito a Reinaldo de Oudinot, incluía também seu genro, Luís Gomes de Carvalho, por ser oficial da arma de engenharia do exército de Portugal, entidade que até à proclamação da República 1910, sempre e só incluíra, unicamente, os filhos de famílias nobres ou distintas, fossem escorreitos ou não, física ou intelectualmente, de tal modo que, mesmo o Príncipe Regente, à época, teria dificuldade em nomear o Oudinot, sem o oficial de engenharia que era o genro.

Ora este homem, fora um súbdito francês aparecido entre nós, Portugal, cerca de 1761/62, sem que nada dele se saiba antes da sua chegada, senão vagamente que, fora engenheiro do exército de França, quando este país, era o centro do mundo civilizado.

Assim, não só pelo seu porte como conhecimentos demonstrados, por despacho de 03-09-1763 fora integrado no exército de Portugal, porém e apenas como ajudante da arma de infantaria. Daqui, a convocatória a Reinaldo de Oudinot associado ao genro.

De verdade sabe-se apenas que, este francês quando chegado a Portugal se casara, de cujo matrimónio houve uma filha Maria Paula de Oudinot que casara com Gomes de Carvalho, e este obviamente genro de Oudinot.

Ora o Reinaldo Oudinot, para atender ao contrato, alojara-se em Aveiro, ou talvez, suponho eu, em algum barraco em S. Jacinto, dado à época, haver já, várias artes de xavega naquela costa que, como bem sabemos, eram constituídas por, além da rede e barco, também de um palheiro onde a companha pernoitava, pronta e ás ordens para fazerem os lanços do ensejo, que se aprestam / 31 / aos crepúsculos, no declínio do Sol sobre a superfície das águas, matutino e vespertino.

E também não terá sido ali, em conversa com algum arrais pescador, que sempre os houve espertos e sabedores, embora sem palavras para se expressar e a quem ouvira dizer, que na costa a água nem sempre correr para o mesmo lado, pois umas vezes e acentuadamente ao sul, porém outras vezes para norte.

Quem estragara o futuro da Laguna fora o Príncipe D. João, ao retirar de Aveiro o Oudinot, mandando-o para a Madeira, acudir as trágicas cheias dos rios e ribeiros na época das chuvas, a inundarem Funchal.

Estou em crer que, se o tivessem mantido na Laguna, a barra nunca teria sido, senão aberta pelo sul da muralha e então sim, teríamos tido o porto de Aveiro, com barra aberta desde 3 de Abril de 1808, para sempre, ad aeternum.

Mas em seu lugar ficara o engenheiro militar Gomes de Carvalho, que a única coisa que teria na cabeça era o chapéu de três bicos e, de certeza, espada em bainha com castão de marfim e ouro, de encantar.

Noção do que e para que, seria o molhe de meia laranja, imaginado pelo sogro, não vejo jeito de ele saber ou imaginar, pois quem abre uma barra no areal, por norte da muralha, não merece ter o seu nome fixado em artéria da cidade.

Valera que, as isóbaras da alta pressão dos Açores, se deslocarem ligeiramente mais a sul, pelo que a barra abrira nas imediações da Vagueira, onde se manteve cerca de 50 anos.

Até que em Abril de 1855, com o entusiasmo político e dinâmica subsequente, levara à construção parcial da estrada a caminho da barra, onde apenas existia o molhe, projectado por Oudinot, porque a abertura da Laguna ao Oceano, ainda andava ao tempo, abrir e a fechar pela Vagueira.

No entanto, fora a partir daqui que, o povoado da Gafanha da Nazaré iniciara a sua dinâmica, a dar a grande cidade que hoje é. / 32 /

Em 29 de Junho de 1858, porém fora incumbido das obras da barra de Aveiro o Engenheiro Silvério Augusto Pereira da Silva que, dinâmico e obstinado, mas também pouco lúcido, isto já no período das inovações e descobertas, como as luzes, telégrafo e outros inventas, desatara a escavar areia, abrindo a barra outra vez por norte da muralha.

E, para acabar de atar os molhos, ou talvez, melhor dito, por estarmos a tratar de coisas do mar, permitam que eu repita o que dizia o meu avô, Manuel Pelicas, que fora a vida inteira, mestre de iate costeiro: Em cima de barda, arrocho!

Pois o Engenheiro Silvério Pereira não só reabriu outra vez a barra por norte da muralha, como instigara o tribuno José Estêvão a solicitar à Câmara dos Deputados e ao Governo um farol, que fora construído e inaugurado em 31 de Agosto de 1893 por Bernardino Machado, sendo Ministro das Obras Públicas, como que, para a barra de Aveiro, fosse a única coisa que faltasse, um farol, a ver-se a 25 milhas ao largo da costa, a chamar atenção que ali era a barra de Aveiro.

É coisa de bradar aos céus, o farol fora edificado onde, ia jurar, Reinaldo Oudinot tinha reservado para a barra passar, isto é, pelo sul da muralha que projectara e fora construída.