Atlântico Norte, a Laguna de Alavário e o porto de Aveiro – pp. 8-12


II – Ser marinheiro e também pescador

Além disto, como já antes referi, o caso de, além de ser marinheiro, também pescador, mas do mar largo e alto, não só a proporcionar-me, ver e observar a corrente do Golf Stream, em si e ao vivo, mas mais do que isto, estudá-la auto didacticamente, não apenas o seu curso, como também os seus efeitos e pormenores.

Ora este Golf Stream, chegado à excrescência que é a Ilha da Terra Nova, em relação ao continente americano, onde começa o Oceano Glacial Árctico, com parte dele por ser água mais quente, assoalhar-se sobre a superfície fria do Árctico, pressionando-a a se afundar contra o fundo sólido e rochoso, a iniciar aqui, uma corrente fria no sentido do Equador, como a compensar pelo fundo, a quantidade que, à superfície o Golf Stream lhe retira ininterruptamente.

Entretanto e ainda no Árctico, a outra parte da Stream que não consegue na sua totalidade, sobrepor-se em toda a imensidão das águas frias e geladas, que formam aquele Oceano Glaciar, animada pela rotação da Terra no sentido oeste leste, vai-o condicionando até embicar na península da Escandinávia, norte da Europa, que a obriga a seguir a sul, e passar na Ibéria, com o nome de corrente das Canárias, em direcção ao Equador.

Ora tudo isto não passaria deste genérico esquema, se eu, profissionalmente, não tivesse de perseguir os cardumes de canídeos, a viverem na confluência das correntes de água quente e fria, tentando capturá-los.

Nesta situação, em vez de perder o meu tempo, só analisar os astros e seu cariz, calculando as condições de tempo para o dia seguinte, mais do que isto aplicava a minha atenção a / 9 / calcular, qual a linha de rumo em que fugiam ou se deslocavam tendenciosamente os ditos cardumes de bacalhau, que eu perseguia e pescava, como seu grande predador.

Fora então que, repentinamente me lembrei, os peixes só nadarem de cabeça metida contra a corrente d'água, e que no meu caso, os cardumes quando os consegui seguir, sempre terem desaparecido, na direcção do centro das baixas pressões próximas, que formadas no Equador, acompanhavam usualmente o Golf Stream a seguir para o norte.

Embora e, nesse momento, não tenha pensado ter descoberto a pólvora, fora para mim, muito mais do que isso, pois abriu-se no meu entendimento, a razão das piscinas no mar da praia da Costa Nova e a própria formação da Laguna de Aveiro, que erradamente, e não sei porquê, deram para a chamar de Ria.

Compulsar a história em busca de fontes documentais e arqueológicas que nos falem e digam alguma coisa da formação, primórdios e evolução da muito velha laguna, nascida na reentrância costeira, entre as serras de Espinho e Boa Viagem, é, quanto a mim, obra impensável, por impossível de concretizar.

Qualquer observador atento, ainda que só por curto lapso de duas gerações, aos fenómenos e mutações produzidas nas nossas praias de mar, antes de transformadas nas actuais costas rochosas e alcantiladas, pela intromissão de toneladas de pedregulhos, para ali atirados pelo homem, em protecção ao avanço do mar, concluiria que os oceanos, neste caso o nosso Atlântico, devido ao seu progressivo crescimento em altura e em função do normal aquecimento do Globo Terrestre, não param de subir e comprometer grande parte do que, nós homens programamos e fizemos, ao longo dos tempos, sem quaisquer estudos, ou pelo menos, noção da evolução, incluso o aquecimento do Planeta, que é aqui que está o busílis do problema.

O aumento de temperatura da Terra é norma e natura indiscutível que, até acelera a evolução de todas as espécies / 10 / animais, vegetais e até minerais, não obstante ainda aparecerem alguns pretensos doutores, cujo saber resulta, exclusivamente de estudos didáctico pregados por outros nos salões das escolas, baseados apenas em supostos registos termo laboratoriais atmosféricos locais, compilados ao longo de anos, sem ter em atenção e comparativamente o aumento em todos os continentes da desertificação e nos mares, o aumento do seu volume.

Dos seres vivos, animais e vegetais, não são precisas muitas décadas para se constatar a evolução, com umas a definharem-se e outras a notar-se a evolução.

Quem não reconhece que os mamíferos hominais se têm desenvolvido quer em altura, elegância e até intelectualmente, por as hormonas das várias gerações e força de novas culturas fixado outras resistências residuais.

Mas parecendo desviado da Laguna, cujo meu fim e intenção é dela falar, especulando e explicando a sua formação.

Fundamentar o aparecimento deste nosso incidente costeiro arenoso, aparentemente contra natura, na acção erosiva e carreadora das águas, que das serras, especialmente da Lapa, se despenham com relativa mansidão e se lançavam então, directamente no Atlântico, será, quanto a mim, ignorar em absoluto a força e o impacto, quer da arrebentação das ondas, da ressaca e da corrente d'água ali na praia, como sobreavaliar o caudal do Vouga e seus afluentes, além de minimizar a dureza granítica e xistosa dos seus leitos e margens.

Posto isto, numa altura em que, dobrado o cabo dos anos, já não dá gosto e muito menos gozo, exibir saber que me distinga ou realce, tentarei, no entanto aqui, desenvolver o tema da Laguna, sua formação e evoluir, assunto que sempre me cativou e ao qual dedicámos e demos o melhor da nossa atenção, usando nisto entretanto, a par de saber, também alguma imaginação.

O documento histórico, mais longevo que se conhece a falar das coisas da Laguna, remonta a Janeiro de 959, em testamento da / 11 / Condessa Mumadona Dias, ao Convento de Guimarães, onde são doadas as suas terras e marinhas em Alavario, nome essencialmente latino que deve ter evoluído exactamente como todos os vocábulos, mercê da simples e fácil dicção do povo, que obvio a primeira coisa que perdera fora o prefixo AI. Além de justo comprovante e bastante de há cerca de mil anos a exploração de sal na Laguna, ser já então, actividade economicamente rentável, de importância reconhecida e digna de ser doada.

Antes disto porém e em concreto, nada mais sabemos, julgando até nada existir de credível e capaz de servir de base à história deste ponto notável, mas terrivelmente instável, da costa portuguesa. Na sua falta porém, e por não me pesarem pergaminhos, de geofísico, hidrógrafo ou historiador, que não sou nem quero parecer, mas bem estribado em observações, analises e respectivos efeitos comparativos, em centenas de milhares de locais diferentes e de consequências semelhantes, ao longo da corrente que tem inicio no lado leste do Pólo Norte, a se estender ao longo da costa nordeste do Canadá, pelo Mar de Baffim, estreito de Davis, baia de Hudson e Costa do Lavrador, do qual recebe o seu nome, e que ao chegar ao Estreito de Belle Isle, no extremo norte da ilha da Terra Nova, se subdivide em dois ramos, um dos quais banha o Golf de S. Lourenço, descendo pela Nova Escócia, a morrer no Mame, norte dos E.U.A.

O outro ramo, mais caudaloso, passa em frente a Bell Isle, seguindo a sul, a banhar e estender-se pelos bancos do leste da Terra Nova, atingir toda a costa sul da ilha, para se ir afundar e submergir, na fundura, ao sul dos bancos, a caminho da zona equatorial, como a compensá-la, por baixo e em águas frias, o que por cima sobre aquecidas, se esvai, no Golf Stream.

À imagem do ocorrido com a corrente do Lavrador, o mesmo ou semelhante se passa, com a corrente dita do Spitzberg, também nascida no Pólo, porém no lado oeste do que, em função do movimento curto e rápido da Terra nas zonas polares, a corrente é lançada para leste, a passar no arquipélago das Spitzbergs e atirada / 12 / contra a costa leste da Groenlândia, ao longo da qual desce, para sul até ao Cabo Farwell, onde no extremo, carregada de imensos campos e ilhas de gelo, se afunda completamente, contra a pujança do Golf Stream.