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Ontem senti
saudade
Daquele tempo da meninice
Apesar de já passada alguma idade
Lembrei-me agora na velhice
Levantávamos bem cedo
Para ir à Vila fazer governo
Íamos sempre sem medo
Fosse verão ou mesmo inverno
Mãe e filho montados na muar
No conforto de uma albarda
Muito o macho tinha que andar
Por veredas e pouca estrada
Comprar café, açúcar e linhas para coser
No alforge levava trigo da colheita
P’ra trazer alguma coisa para comer
A transacção comercial assim era feita
Um bocado de pão no talego
Toucinho frito era o conduto
Para o estômago ter sossego
Pouco importava o produto
Eram longos os caminhos
De regresso ao meu monte
Entre estevas pedregulhos e espinhos
E lonjura a perder no horizonte
Cruzava-nos com lavradores e pastores
Cada um nos seus afazeres
Para eles os meus louvores
Pelo seu respeito pelas mulheres
Todos respeitavam o alheio
Com a maior das lisuras
Não só por causa do paleio
De algumas famosas criaturas
Ir à Vila o quebrar da rotina diária
Daquele isolamento rural
Só quando muito necessária
Ou um filho doente e muito mal
Éramos pobres em bens-materiais
Muito ricos em honestidade
A herança dos meus pais
Para a nossa vida ter continuidade
Manuelopes, 2012
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