Existe uma crise endémica aguda no modelo de agricultura alentejana –
extensiva e de sequeiro – há décadas praticada no Alentejo, cujo modelo
de organização, exploração e gestão estão completamente ultrapassados,
sem futuro e muito dependente de diversos factores, tais como: elevados
custos de exploração, directos e indirectos; falta de valor
acrescentado; pouca produtividade; dependência do clima e dos subsídios;
pouca diversificação da produção e, principalmente, falta de criatividade
e de inovação na exploração de novos modelos de exploração da terra e de
novas culturas, que possam gerar sustentabilidade futura para os
empresários agrícolas e para o Alentejo.
Os subsídios atribuídos à agricultura e ao mundo rural, desde os anos
oitenta, não foram entendidos pela grande parte dos agricultores como
ajudas estruturantes para a criação de infra-estruturas e reformulação
do modelo da agricultura. Os apoios em subsídios à produção de cereais,
produção de ovinos e bovinos e à obtenção de equipamentos agrícolas foram por muitos
agricultores utilizados incorrectamente; por vezes vieram contribuir
para o aumento do seu endividamento e para o desequilíbrio financeiro
das suas actividades, em muitas situações, para a inviabilidade das suas
explorações. Com a redução dos subsídios, de ano para ano assistimos ao
agudizar da agricultura alentejana, em todo o Alentejo, mas
principalmente no Baixo Alentejo, apesar de nesta província alentejana
termos terras de excelente qualidade e muito produtivas
–
caso das
terras de barro de todo o perímetro de Beja, e regadio em alguns
concelhos limítrofes
–
e outras terras mais pobres, caso de toda a zona
do campo branco, onde o modelo de produção terá de ser alterado e
recriado. A produção vem caindo de ano para ano, sem que se vislumbrem
alternativas ao modelo agrícola desde há décadas existente no Alentejo,
ou seja, desde o Estado Novo, quando a mão-de-obra disponível era
abundante, barata e à jorna, sem restrições de exigências salariais ou
sociais, e o escoamento da produção estava assegurada, noutros tempos,
quando as grandes casas agrícolas proliferavam em todo o Alentejo. Com a
emigração de parte da mão-de-obra na década de 1960, houve a necessidade
de alguma mecanização na agricultura, tendo-se assistido a algum
desenvolvimento pela introdução e alteração dos meios de produção, que
geraram um aumento da produtividade; mas o modelo agrícola pouco
evoluiu, continuando assente no modelo extensivo e de sequeiro, onde o
escoamento da produção continuava assegurado.
Com o 25 de Abril e as alterações das condições salariais até então
praticadas, a obrigatoriedade de suportarem encargos sociais com os
trabalhadores agrícolas, aumentando os custos de produção e,
posteriormente, a chegada da chamada reforma da Política Agrícola Comum,
quando a agricultura alentejana deixou de ter assegurada a produção a
preços rentáveis e passou a ter de se confrontar com os preços de
mercado e com a diminuição dos apoios europeus ao nível dos subsídios
atribuídos nos primeiros anos, as dificuldades começaram a aparecer e
muitas das explorações reduziram a sua actividade, enquanto outras deixaram de
produzir. Tendo também contribuído para isso os incentivos dados pela PAC – Política
Agrícola Comum – para o abandono de determinado tipo de actividades,
também a idade avançada dos agricultores, sem que simultaneamente fossem
criadas políticas para atrair as gerações mais novas, para que
estivessem motivadas e preparadas para agricultura, e para as reformas
estruturantes que eram necessárias fazer.
As dificuldades da agricultura alentejana são muitas, mas, acima de tudo,
sente-se a falta de competitividade e de preparação no mercado nacional
e global, com os efeitos dos preços praticados pelos que comercializam os
produtos agrícolas. Das grandes casas agrícolas do distrito de Beja são
muito poucas aquelas que actualmente existem, cujos factores
explicativos são diversos, mas a que não será alheia a falta de
capacidade de gestão, de inovação nas suas diversas vertentes, e as
ofertas alternativas e mais apelativas no mercado de trabalho para os
jovens
Torna-se por isso indispensável criar condições para que venham para a
agricultura alentejana empreendedores. Para isso os cursos da Escola
Superior Agrária de Beja e de outras escolas agrícolas devem adaptar e
melhorar os seus cursos e curriculum às reais necessidades da
agricultura alentejana, devem fazer parte dos cursos estágios e períodos
de trabalho prático na agricultura, de preferência em empresas de média
dimensão, que sirvam de escola, onde exista a oportunidade de trabalhar
na organização, preparação e gestão das suas actividades económicas, e
também financeiras, já que sem a experiência prática e a preparação
adequada dificilmente se formam agricultores para enfrentar o presente e
criar novos modelos e novas culturas tão necessárias para a agricultura
alentejana. O estudo das culturas, das terras, da influência do clima
deve ser efectuado em conjunto com entidades empresariais com
experiência em Portugal e no estrangeiro, para daí se tirarem conclusões
sobre que tipo de culturas devem ser produzidas, em que condições, em
que meses do ano (Outono/Inverno, Primavera ou Verão), que tipo de
produção intensiva ou diversificada, quais os mercados para escoar a
produção, quais os meios e equipamentos necessários para trabalhar,
quais os investimentos a fazer e os recursos financeiros para os
financiar.
Todavia, há uma certeza: a agricultura tradicional nos moldes em que era
praticada no Alentejo morreu e não vai voltar.
Agora a realidade agrícola sustentável tem de atender a outras
vertentes, a uma maior especialização com dimensão económica, à
diversificação, que passará por investimentos ligados às características
dos solos, à sua qualidade e aptidão para determinadas culturas, à
localização dos mesmos, e, a partir deles, elaborar projectos
diversificados, cereais, oleaginosas, rações para a produção gado,
regadio nas suas diversas vertentes, a vinha, a produção de azeite, a
gastronomia, a criação de gado bovino, ovino, caprino, caça, pesca, etc.
Qualquer destes sistemas de produção, além de recursos humanos técnicos,
terá de ter uma direcção com manifesta capacidade de gestão, não só
operacional como estratégica, conhecedora dos mercados, e da clientela,
sendo que a actividade terá de ter uma elevada componente de
mecanização; a produção intensiva e extensiva deverá ser aproveitada e
rentabilizada, necessitando em qualquer destes sistemas de produção de
valores importantes em investimento, tanto ao nível do investimento nos
activos fixos, como no activo circulante, com fundos de maneio
necessários e suficientes para os respectivos ciclos de produção.
Nesta perspectiva, a produção agrícola alentejana terá futuro. |