Tornou-se chocantemente óbvio que a nossa tecnologia excedeu a nossa
humanidade.
Albert Einstein.
Em
números anteriores da revista tenho procurado estabelecer uma distinção
entre as causas naturais das catástrofes e as resultantes da intervenção
dos humanos sobre a natureza. Referi ter-se chegado a um ponto de
oportunismo inqualificável, em que alguns se aproveitam das catástrofes
para delas tirar proveito pessoal. Transmiti suspeitas de haver por
detrás de algumas catástrofes já não apenas um aproveitamento, mas mesmo
uma intencionalidade criminosa, “para alargar o mercado e criar novas
oportunidades de negócio”. Algumas catástrofes poderiam ter sido
provocadas. Procurei ainda alertar para o perigo de determinados
empreendimentos de alta periculosidade estarem entregues a empresas
privadas que negligenciam a manutenção, pondo em risco a vida de muitas
pessoas. Citei como exemplo o caso da central nuclear de Fukushima, no
Japão, que explodiu há mais de um ano e ainda hoje provoca sérios danos
não só para os japoneses como para o mundo.
Pensei que estaria tudo dito sobre a matéria e poderia encerrar
definitivamente o tema. A leitura de um importantíssimo livro de uma
jornalista norte-americana de nome Naomi Klein, veio lançar novas achas
para uma fogueira já de si tão devastadora que parecia impensável
poderem aumentar. No entanto é o que ela mostra no livro “A doutrina
do choque – capitalismo de desastre”, publicado em 2009. Nele se
confirma a ideia de que as catástrofes, tal como as crises económicas,
as guerras, a destruição e o caos, poderiam estar a ser uma prática
intencional destinada a criar condições para a criação, já não tanto de
determinados empreendimentos isolados e oportunistas, como tenho
referido, mas fazendo parte de uma estratégia global de avanço do
próprio capitalismo ou, pelo menos, um determinado tipo de capitalismo,
pela autora denominado “capitalismo de desastre”. Como exemplo cita o
comentário de um empresário de uma firma de segurança no Iraque após a
invasão deste país pelos E.U.A..
“Para nós o medo e a desordem ofereciam grandes promessas”. O ex
operativo da CIA, de 34 anos, estava a referir-se a como o caos no
Iraque, após a invasão, tinha ajudado a sua desconhecida e inexperiente
firma de segurança privada, a Custer Battles, a sacar cerca de 100
milhões de dólares em contratos ao governo federal. As suas palavras
poderiam ser usadas como slogan para o capitalismo contemporâneo – “o
medo e a desordem são os catalizadores de cada novo salto em frente.”
Esta
nova forma de capitalismo em vigor, é tão aberrante que a jornalista
recusa mesmo a designação de capitalismo para o sistema que está a
denunciar e que representa, de certo modo, a derrota do capitalismo
produtivo tradicional tal como era conhecido até há pouco.
(...) Um termo mais preciso para descrever o sistema que apaga as
fronteiras entre o Grande Governo e os Grandes Negócios é
corporativista, não é liberal, conservador ou capitalista. As suas
principais características são enormes transferências de riqueza pública
para mãos privadas, muitas vezes acompanhadas por uma explosão de
dívidas, um abismo que não pára de se alargar entre os ricos
deslumbrantes e os pobres descartáveis, e um nacionalismo agressivo que
justifica gastos ilimitados com a segurança. Mas devido às claras
desvantagens para a vasta maioria da população deixada de fora da bolha,
outras características do Estado corporativo tendem a incluir a
vigilância agressiva (mais uma vez com o governo e as grandes
corporações a trocarem favores e contratos), encarceramentos em massa,
liberdades civis cada vez mais diminutas, e muitas vezes, embora nem
sempre, tortura.”
Segundo a autora, a pretexto da liberalização do mercado, isto é, do
livre comércio entre as nações, os boys ou neocons da
escola de Chicago apenas pretenderam anular as regras que, mal ou bem,
sustinham o capitalismo de resvalar para uma fase selvagem, a actual.
Desta forma abriram as comportas e a avalanche de oportunismo e
selvajaria rebentou pelo mundo fora através de fórmulas até então
consideradas fraudulentas. Permitiram aquilo que, secretamente, eram os
seus três objectivos principais: privatizar os bens dos Estados, retirar
direitos aos trabalhadores e especular livremente. Isso permitiu a uma
minoria poderosíssima arrecadar tão chorudos lucros como nenhuma vez na
história tinha sido possível. E isso enquanto a imensa maioria da
humanidade sofria a maior miséria ou a morte por subnutrição. Mas esta
gente é insaciável. Ameaçam indiscriminadamente todos aqueles que ousem
fazer-lhes frente. Nem que para isso tenham de recorrer a métodos que
podem pôr em perigo a própria vida na terra.
Neste
inicio de milénio a humanidade encontra-se numa encruzilhada perigosa.
Está confrontada com o seguinte dilema: ou deixar perigosas tecnologias
capazes de dizimar a humanidade nas mãos de alguns idiotas fanáticos e
irresponsáveis, mas extremamente poderosos, ou cortar o mal pela raiz,
isto é, com este sistema.
A
todos nós esta causa diz respeito. O que aqui se descreve não se aplica
apenas a um qualquer lugar lá nos confins da terra. De acordo com esta
perspectiva, o que estamos passando é apenas mais uma dessas catástrofes
que esse grupo anda a tramar pelo mundo fora.
Ainda sobre Fukushima. Três notícias de última hora
Notícias de recentes revelam que as instalações ainda existentes estão a
afundar-se no solo perigosamente, correndo o risco de desabarem a
qualquer momento e mergulharem no mar. Tal constituiria uma catástrofe
de tal ordem que não só o Japão seria afectado, mas todo o mundo.
"A
precária situação da instalação nuclear japonesa de Fukushima Daiichi
continua a agravar-se, de acordo com um importante funcionário japonês.
Durante uma entrevista recente, Mitsuhei Murata, ex-embaixador do Japão
para a Suíça e Senegal, disse que o terreno sobre o qual fica a unidade
4 está-se afundando e que toda a estrutura poderia estar à beira de um
colapso. O Bloco 4 tem actualmente mais de 1.500 barras de combustível
nuclear gasto e um total de 37 milhões de curies de radiação mortal que,
se libertados, poderiam deixar a maior parte do mundo completamente
inabitável.”
(Ameaça de uma catástrofe nuclear em Fukushima, Cubadebate, 17 de
Outubro de 2012.)
Notícias censuradas nos E.U.A. provenientes da costa oeste relatam a
presença de radioactividade em algumas destas zonas costeiras que já
teria provocado 14 000 mortes.
“As
consequências da catástrofe nuclear de Fukushima 2011 são maiores do que
as reconhecidas, na medida em que os cientistas estimam em 14 mil as
mortes nos Estados Unidos por causa da precipitação radioactiva do
Japão, de acordo com um relatório de Dezembro 2011 da Revista
Internacional de Serviços de Saúde.”
(Notícia censurada nº 3: A precipitação de Fukushima" Cubadebate, 28 de
Outubro de 2012)
Outras notícias revelam que, embora os responsáveis tentem minimizar os
perigos, as instalações continuam a derramar constantemente líquido
radioactivo para o mar provocando a contaminação dos peixes na costa do
Japão, estando mesmo em causa a sua captura.
A
Tokyo Electric Power Co.
(TEPCO),
disse a jornalistas nesta sexta-feira, o que não pode confirmar-se,
que a radiação tinha parado de vazar da central nuclear atingida por um
terramoto e tsunami em Março de 2011. Disseram ainda que os níveis de
radiação na água e no fundo do mar ao redor da central estavam
diminuindo. Um recente artigo na revista académica Science revelou que
40 por cento das espécies que habitam o fundo marinho na área mostram
níveis de césio-134 e 137 que ainda são mais elevados do que o normal.
("Os
donos da central de Fukushima podem estar lançando radiação no mar".
Rússia Today, 26 de Outubro de 2012).
Lembra-se que as causas naturais de toda esta tragédia na central
nuclear de Fukushima no Japão no ano passado, foram um terramoto seguido
de tsunami que invadiu e destruiu as instalações. Porém as causas mais
prováveis para a amplitude que atingiu o desastre tem sido imputada à
localização imprópria do complexo, construído à beira mar, ao inadequado
projecto de segurança e à negligência na manutenção dos equipamentos
completamente obsoletos, que são propriedade de uma empresa privada
norte-americana.
Nunca
é demais repetir: há empreendimentos que, pelo seu risco, não podem ser
entregues à iniciativa privada e resumir-se a uma mera oportunidade de
negócio, onde o máximo lucro se sobrepõe a tudo, incluindo a vida de
milhares de pessoas, ou mesmo milhões.
2012-11-22 |