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Memórias Entrelaçadas |
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17
A MÚSICA QUE ESCREVI
PARA A LITURGIA |
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I. Obras publicadas
1.
Cânticos para a liturgia (1.ª edição)
Comecei a compor música
para as celebrações litúrgicas por necessidade. Foi em outubro de
1978, na paróquia de Nossa Senhora da Glória, em Aveiro. O livro dos
salmos do ciclo A do padre Manuel Luís estava esgotado e não tive
outra solução. Em 1979 compus um “Tu es sacerdos” para a missa nova
do padre Fausto de Oliveira (como já contei no capítulo 13 – Isto
está tudo “entrelaçado”!).
Quando passei para a
paróquia de São Bernardo, em 1980, continuei a compor também por
necessidade: ou porque não havia (ou não conhecia) o cântico de que
precisava – eu queria o cântico próprio – ou o que havia era
demasiado difícil ou não gostava.
Nessa altura eu já
assinava o Boletim de Música Litúrgia da diocese do Porto,
onde aprendi muito com toda a sua reflexão, e a
Nova Revista de Música Sacra
de Braga.
Em São Bernardo levei a
cabo um trabalho ciclópico em todos os aspetos
/ 368 /
e também no do canto, que foi o primeiro que abracei. Uma das
prioridades urgentes era o ciclo do Natal, o tríduo pascal, as
festas do padroeiro São Bernardo (em 20 de agosto) e da Natividade
da Virgem Santa Maria (em 8 de setembro). Compus alguns cânticos
para estas celebrações.
E comecei a gostar de
compor!
Escrevi à mão centenas
e centenas de páginas, que assinava com o nome de João Beirão.
Ganhei uma destreza manual tão notável que parecia letra de
imprensa. Primeiro escrevia a lápis e depois passava a limpo com
esferográfica Bic, esfera grossa, cor preta. Ainda hoje faço assim.
Desde esse tempo só
utilizo em tudo o que escrevo essa esferográfica de cor preta. No
rascunho de textos utilizo o verde (e o vermelho para corrigir).
Estas memórias ando a rabiscá-las a verde, há vários anos.
O meu estudo e contacto
com a música vinha do tempo de seminário. Na segunda parte da década
de 1970, fiz novos estudos musicais, mais consistentes e variados,
de que saliento apenas a Harmonia, no Conservatório de Música de
Aveiro Calouste Gulbenkian, com o professor Emílio Matos. O
professor Matos era muito calmo, metódico e paciente. Descia ao
aluno. Encontro antigos discípulos dele que gostavam do seu ensino e
o elogiam.
Era docente na Escola
João Afonso de Aveiro, éramos colegas mas de áreas disciplinares
diferentes.
Mais tarde ofereci-lhe
os meus livros de poesia e contos e, claro, os “Cânticos para a
Liturgia” e o duplo CD. Visitava-o em casa, quando já não saía.
Tinha junto à cadeira onde se sentava uma mesinha com um monte de
livros que ia lendo. Era muito curioso e queria ter a cabeça sempre
a funcionar!
Quando me aposentei, no
ano 2000, publiquei a 1.ª edição dos “Cânticos para a Liturgia”, que
saiu em julho. Um dia, em 1990, o senhor D. António Marcelino
havia-me desafiado a editar tudo o que tinha composto e eu
decidi-me. Concedeu-me o “imprimatur” para a Diocese de Aveiro.
A apresentação do livro
foi feita em 28 de outubro (de 2000), com um programa que vale a
pena recordar. Às 17 horas, houve concerto coral na Igreja da
Misericórdia de Aveiro, e às 19 horas, na Sé de Aveiro, o senhor D.
António Marcelino presidiu à Eucaristia Festiva.
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A mesa administrativa
da Santa Casa assumiu o processo e através da pessoa do provedor, dr.
Amaro Neves, convidou todos os coros litúrgicos da diocese de Aveiro
a estarem presentes no concerto e a participarem pelo canto na missa
solene. Para isso enviei o guião dos cânticos.
No concerto, o Coro
Litúrgico de Milheirós de Poiares assumiu a parte central e
principal, os coros de Nossa Senhora de Fátima, de Santa Joana, de
São Bernardo e da Sé apresentaram um cântico cada um. No final,
todos os coros executaram o cântico de entrada da solenidade da
Imaculada Conceição.
Antes desse momento,
disse algumas palavras, de que saliento a ideia de que “foi movido
por um sentimento de partilha” que publiquei a minha música
litúrgica e esse “gesto de partilha” ganhava mais relevo no concerto
que estava a decorrer e na Eucaristia que celebraríamos depois, na
catedral.
E continuei: “Toda a
música que escrevi e está no livro procura ser expressão de fé (...)
no ato de a compor” e no “momento de a cantar”. E rematei: “Cantar a
fé é dos atos mais belos e expressivos para um crente. Sinto-me
feliz se contribuir, mesmo em pequena medida, para essa beleza”.
Depois de agradecer a
todos os coros a “sua presença amiga” e os “momentos de beleza e
espiritualidade” que proporcionaram aos presentes, quis distinguir o
Coro de São Bernardo, só pela seguinte razão: “Cantamos juntos há
exatamente 20 anos e liga-nos uma história de muitas alegrias. Foi
para vincar e selar essa longa amizade e a minha gratidão que lhe
dediquei o livro Cânticos para a Liturgia”.
/ 370 /
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Um só e grande coro canta:
Exulto de alegria no Senhor. |
Para introduzir a bela
antífona do cântico de entrada da solenidade da Imaculada Conceição
– “Exulto de alegria no
Senhor, e minha alma rejubila no meu Deus, pois com a veste da
salvação me revestiu, e com o manto da justiça me envolveu, qual
esposa adornada de suas joias”
– que todos os grupos cantaram formando um só grande coro, li o
poema “Saudação a Nossa Senhora da Glória” (“Os Dias Férteis”, 2009,
p. 100):
SAUDAÇÃO A NOSSA SENHORA DA GLÓRIA
Ave, Maria, ilha descoberta,
rosácea pura de luz e encanto,
teu rosto é perfume e é flor aberta,
barca para a glória sob o teu manto.
Ave, Maria, Senhora tão pura,
promessa de Deus aos homens, e graça.
Mulher bendita, Mãe de formosura,
protege os filhos no tempo que passa.
/ 371 /
Senhora da Glória da Sé de Aveiro,
Mãe e padroeira deste teu povo,
nós Te cantamos um hino cimeiro
de louvor e glória – cântico novo.
A Eucaristia na Sé foi
presidida pelo bispo de Aveiro, D. António Marcelino, que me honrou
com a sua presença durante toda a tarde. O Coro de Milheirós de
Poiares propôs os cânticos e todos os outros cantores estiveram e
cantaram na Assembleia. Depois da Comunhão, em atitude de louvor, de
oferta e de ação de graças a Deus, li o poema:
HINO
Senhor, que nos reúnes em teu mistério
e sobre nós derramas teu doce olhar,
que iluminas os olhos e és refrigério,
conduzes na terra nosso caminhar;
Senhor, que és Pai de bondade, és criador,
e nos amas em teu amor infinito,
que aceitas o cantar do nosso louvor
e escutas nossas preces e nosso grito;
Senhor, nós Te louvamos em nossas vozes,
nós Te cantamos na palavra dos hinos;
antífonas, refrães – são apoteoses,
sob os acordes do órgão cristalinos.
A palavra revelada, o rir dos sons,
o engenho dos homens, a arte sentida
– de tudo fazemos canto em vários tons,
para Te louvar, ó Deus, Senhor da vida.
/ 372 /
Depois da celebração,
foi servida a todos uma refeição fria, no Salão D. João Evangelista
(ao lado da Sé).
No dia 1 de novembro, o
“Correio do Vouga” fez-se eco deste evento e sobretudo das palavras
de D. António Marcelino, em crónica titulada “A música litúrgica tem
de provocar sentimentos” (p. 4).
O bispo de Aveiro
sublinhou na homilia a importância da assembleia animada pelo canto
litúrgico, “que não é um espetáculo; exprime vida, gera comunhão”.
Os coros, portanto, não existem apenas para cantar, mas
fundamentalmente para animar a assembleia, fazendo com que todos
cantem. |
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F.
Maia (Coro de Milheirós), bispo de Aveiro
e o autor |
Disse ainda que a
igreja deve ser “um espaço de repouso, de serenidade, de paz
interior, de oração”. “Escutar Deus é uma graça”, depois dessa
escuta “irrompe dentro de nós um hino de gratidão”. E cantamos!
Em carta de 24 de
novembro (de 2000), o padre doutor Manuel de Pinho Ferreira afirma,
entre variadas outras coisas: “as composições parecem-me muito boas
quer sob o aspeto técnico quer no aspeto litúrgico”. E acrescenta:
“Foi uma ajuda preciosa que deu ao Povo de Deus (...)”. Na parte
final da carta conclui que, ao contrário de outros compositores que
oferecem trabalhos difíceis para os coros amadores, os meus cânticos
são “belas composições acessíveis com construções harmónicas de rara
beleza”. Depois remata: “Até neste ponto, teve o cuidado de ser
útil”.
Alguns aspetos
importantes destes cânticos, apontados nas palavras de
“Apresentação” do livro:
– São cânticos
acessíveis, para que os coros amadores e as assembleias os possam
cantar;
– Respeitam os textos
litúrgicos, seguem os tempos e as celebrações
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litúrgicas, permitindo à assembleia exprimir a sua fé de acordo com
o ritmo e o dinamismo da Igreja;
– Cada cântico, porque
é o “próprio”, está colocado no seu domingo ou festa e no seu
momento ritual;
– A aclamação ao
Evangelho tem um tratamento não habitual – a música dos versículos
apresenta quase sempre uma forma ornada.
2.
Cânticos para a liturgia (2.ª edição)
Em julho de 2003,
também com o “imprimatur” do bispo de Aveiro D. António Marcelino,
“subiu à luz do dia e do templo” a 2.ª edição revista, corrigida e
aumentada dos “Cânticos para a Liturgia”.
Como a 1.ª edição, esta
oferece também cânticos do ordinário da missa, cânticos de entrada,
salmos responsoriais, aclamações ao evangelho, cânticos de comunhão
e hinos da liturgia das horas; está aumentada em mais de 50 novos
cânticos de todo o tipo, mas foram retiradas as antífonas da
salmodia e do cântico evangélico da Liturgia das Horas, mantendo-se
e aumentando mesmo o número de hinos. Cerca de dez cânticos novos
estão compostos
sobre textos poéticos
escritos por Eugénio Beirão, uns originais, outros parafraseando
textos bíblico-litúrgicos.
Também agora procurei
viver o ato de compor como um ato de fé. Isto ajudou-me a alcançar a
graça de continuar a manter-me em Igreja.
Dediquei esta 2.ª
edição ao Coro Litúrgico de Milheirós de Poiares.
3. Edição
de “12 Cânticos do padre Arménio”
Nesta mesma data (julho
de 2003), editei “12 Cânticos do padre Arménio”. O objetivo era não
se perderem essas obras, mas era também homenagear o seu autor, na
mesma semana em que, movido pela mesma intenção, o Coro de Santa
Joana trouxe à catedral de Aveiro, com um coro convidado, o
Requiem de Gabriel Fauré.
Aproveito para, em
rápido parêntese, evocar mais uma vez a ilustre figura que foi o
padre Arménio, transcrevendo apenas o texto que redigi dando conta
da celebração de uma eucaristia em sua memória, celebrada em 15 de
fevereiro de 2007.
/ 374 /
EM MEMÓRIA DO PADRE
ARMÉNIO
Ocorre amanhã/hoje, 15
de fevereiro, o décimo aniversário da morte do padre Arménio. Por
essa razão, um grupo de casais promove, na Igreja do Seminário de
Santa Joana Princesa, a celebração, às 19h15, de uma Eucaristia em
sua memória, aberta a todos os que quiserem participar.
O padre Arménio
distinguiu-se como sacerdote, pedagogo, pároco, professor e artista
e marcou, com a sua vida e os seus dons, várias gerações de
aveirenses. Nas décadas de 60, 70, 80 e 90, inundou os meios em que
esteve e trabalhou, nomeadamente paróquias, as crianças e os jovens,
os casais, grupos corais, o liceu, o seminário, o conservatório, o
CUFC, a universidade, com a sua alegria e otimismo, a sua palavra
fácil e entusiasmante, a sua sensibilidade e jeito para ajudar e
aconselhar os mais novos e os mais velhos, o seu saber e a sua arte.
Admirado por todos, continua a ser lembrado e amado por muitos.
Algumas frases de
aveirenses que, em jornais e livros, se lhe referiram com apreço e
gratidão, dão bem a imagem da importância da sua personalidade.
Partiu “como parte o
Anjo de Deus/ – deixando atrás um rasto de luz”. “Poeta de tudo o
que é belo, cantor de tudo o que é bom”.
“Músico de muitas
partituras”.
“Da música fazia
linguagem de Deus, que é preciso ouvir na beleza harmónica das notas
e na delicadeza dos sons”.
“Transfigurava, com o
seu sorriso e simpatia, com a sua palavra luminosa, com o seu
entusiasmo contagiante, tudo aquilo em que tocava”.
“O padre Arménio não
morreu! Está vivo na memória e no coração de muitos, está presente e
vivo na vida dos que com ele se cruzaram e con -viveram”.
É este Homem, escolhido
pelo bispo emérito de Aveiro, D. António Marcelino, como um dos
“grandes aveirenses”, que vamos recordar nesta Eucaristia de ação de
graças pela dádiva e generosidade da sua vida. Serão cantados
cânticos da sua autoria.
/ 375 /
4. Duplo CD
“Cânticos para a liturgia”
A minha obra seguinte
saiu em setembro de 2012 e foi o Duplo CD “Cânticos para a
Liturgia”, em edição de autor. Contém 35 cânticos do livro com o
mesmo título, de que estava em preparação a 3.ª edição, cinco deles
do ordinário da missa e os restantes relativos aos diversos tempos e
festividades do ano litúrgico. A gravação foi feita em 2010, no
auditório do Departamento de Comunicação e Arte da Universidade de
Aveiro, pelo Coro Litúrgico de Milheirós de Poiares, sob a direção
de Clarinda Ferreira, acompanhado ao órgão por Marília Canhoto e
Manuel Sousa.
Gostava de deixar aqui
dois testemunhos.
O primeiro é da irmã
Celeste Lopes, de Arronches, em postal escrito na Natal de 2012:
“Deliciei-me a ouvir o
CD. As melodias variadas e muito bem conseguidas. Uma harmonização e
execução melodiosas que fazem rezar e elevar para Deus. As vozes dos
solistas duma afinação exata e expressiva! Apreciei muito. Muitos
parabéns pelo contributo que dá a favor da “Música Sacra” em
Portugal”.
O segundo é do amigo
Jorge Rino, professor universitário jubilado, enviado em mail
de 18 de junho de 2013.
Diz ele:
“Já comecei a ouvir o
1.º CD com peças da sua autoria.
Parabéns – assim dá
gosto ir à missa.
Como não sou crente, só
vou a “missas circunstanciais” (casamentos, funerais, etc.) e dou um
significado próprio ao “santo sacrifício da missa” – quase sempre é
um verdadeiro sacrifício ouvir músicas desconchavadas, coros
desafinados e sintetizadores foleiros com sons disparatados.
Consequência: perco
toda e qualquer santidade ao rogar pragas a quem fez e interpreta
aquelas músicas”.
/ 376 /
5. Credo –
Profissão de fé
No mês seguinte,
outubro (de 2012), publiquei, em dois cadernos policopiados (versão
para coro e versão para órgão com acompanhamento escrito por
Domingos Peixoto), o Credo – Profissão de Fé.
Íamos entrar no Ano da
Fé (11 de outubro de 2012 a 24 de novembro de 2013) e era necessário
ter à mão mais um subsídio para poder cantar a Fé católica. E
fizemo-lo uma vez por mês, quer na paróquia de São Bernardo quer na
igreja da Misericórdia de Aveiro.
Depois, na 3.ª edição
dos “Cânticos para a Liturgia”, saída em dezembro de 2013, o Credo
foi integrado no local próprio do Ordinário da Missa.
6. Salmos
Responsariais – Livro do Salmista e Livro do Organista
Em dezembro desse mesmo
ano 2012 e em janeiro de 2013, foram publicadas as minhas melodias
para os “Salmos Responsariais”, com duas versões: o “Livro do
Salmista” (só com a melodia e o texto) e o “Livro do Organista”, com
os acompanhamentos para órgão escritos pelo professor Domingos
Peixoto.
Esta foi uma edição já
não de autor mas da Gráfica de Coimbra.
Da “Apresentação” que
escrevi para o Livro do Salmista, quero transcrever da p. 3 um
parágrafo apenas, pela sua pertinência: “ Considerando
que os salmos são, na sua origem, “cânticos acompanhados ao som do
saltério”;
considerando que são obras primas da poesia
universal; considerando sobretudo que exprimem os mais elevados
sentimentos do coração do homem para
com Deus e são também a revelação do coração de Deus ao homem,
o salmo da missa tem toda a vantagem em ser cantado – e bem cantado.
A assembleia canta o refrão, que deve ser assumido como uma
verdadeira resposta da sua fé. A prática da forma responsorial, em
bom clima de oração, é, portanto, a melhor maneira de cantar o
salmo”.
/ 377 /
Em 19 de janeiro de
2013, a Escola Diocesana de Música Sacra de Aveiro (EDMUSA) cumpriu
com os seus alunos, na paróquia de São Bernardo, a 5.ª sessão de
formação coral. No início do intervalo, pelas 17h15, o professor
Domingos Peixoto fez a apresentação dos “Salmos Responsariais” e dos
2 CDs. Na missa (vespertina) foi cantado o CREDO, com o refrão da
assembleia: “Creio! Creio! Esta é a nossa fé./ Creio! Creio! Esta é
a fé da Igreja”.
No fim da celebração
estiveram à venda os livros e os CDs, revertendo o respetivo produto
em benefício das obras da Igreja de São Bernardo, previstas para
breve.
Na Sé de Aveiro, uma
semana depois, em 26 de janeiro (de 2013), também sábado, houve um
“Concerto em favor do órgão de tubos da Sé”, com o seguinte
programa: 17h00 – Concerto coral; 18h15 – Apresentação do duplo CD
“Cânticos para a Liturgia” e “Salmos Responsoriais – Livro do
Salmista e Livro do Organista” de João Gamboa; 19h00 – Eucaristia
festiva.
No concerto e na
Eucaristia cantou o Coro Litúrgico de Milheirós de Poiares,
executando cânticos de João Gamboa.
A apresentação das
obras foi feita pelo professor Domingos Peixoto e reproduz-se a
seguir o texto que preparou e lhe serviu de apoio.
“A
No ano de 2013 passa o
50º aniversário da promulgação da Constituição Apostólica
Sacrossanctum Concilium , sobre
a Sagrada Liturgia. Apesar dos seus 50 anos, continua a ser um foco
de luz a iluminar o caminho de quantos se dedicam à música sacra,
cuja finalidade é a glória de Deus e a santificação dos fiéis. Num
flash sobre a perspetiva do Concílio acerca da música sacra,
podemo-la sintetizar assim: a. Um olhar sobre o passado – um
património construído
/ 378 /
b. Um olhar sobre o
futuro – um património a construir.
a. Quanto ao passado, a
tradição musical da Igreja é “um tesouro de inestimável valor,
superior a todas as outras expressões de arte”. Porquê?
Porque “o canto,
intimamente ligado ao texto, é parte integrante, necessária da
liturgia solene”. De facto, a igreja é a casa da arte por
excelência, onde se encontra as diferentes expressões artísticas (arquitetura,
escultura, pintura, etc.), reflexo da Beleza Suprema. Mas a música é
– expressão delicada da
oração,
– fator de comunhão,
– elemento de maior
solenidade.
Por isso, preserve-se,
guarde-se e desenvolva-se com diligência o património da música
sacra: canto gregoriano, polifonia (n.º 114) e até o canto popular.
b. Quanto à visão sobre
o futuro, o Concílio lança um desafio: “os compositores, imbuídos do
espírito cristão, compreendam que são chamados a cultivar a música
sacra e a aumentar-lhe o património (n.º 121). Na verdade tendo o
latim deixado de ser o idioma exclusivo da Liturgia, um vasto campo
se abre na criação musical sobre textos na língua vernácula.
B
E aqui estamos nesta
tarde à volta de um compositor que conhece como a palma das suas
mãos estas linhas orientadoras, ouviu o chamamento, respondeu e
aceitou o desafio – o dr. João Gamboa.
São hoje apresentados
dois dos seus livros:
a) Os Cânticos para
a Liturgia , a 1, 3 ou 4 vozes,
para o Ordinário da Missa e para todos os Tempos litúrgicos e
festividades, gravados em CD pelo Coro de Milheirós de Poiares no
auditório do Departamento de Comunicação e Arte da Universidade de
Aveiro;
b)
Salmos Responsoriais
– versão para o salmista e versão para o
organista, também para todo o Ano Litúrgico.
Falar da beleza e
qualidade destes cânticos, não é preciso. Deles acabamos de ouvir no
concerto uma amostra, tão bem interpretada pelo Coro Litúrgico de
Milheirós de Poiares, sob a direção da sua titular, a prof.ª
Clarinda Ferreira. Quem tiver dúvidas, poderá tirá-las ao ouvir o
seu belo efeito e eficácia no espaço e momento próprio para que
foram compostos – a eucaristia. /
379 /
C
Estes livros são
páginas de uma vida: mais de 40 anos ao serviço da liturgia, que,
por coincidência, começaram nesta Igreja da Glória, e depois
continuaram em São Bernardo e na Misericórdia.
a. Nestas páginas, o dr.
Gamboa fixou uma recomendação do Concílio: “Que as composições
possam ser cantadas, não só pelos grandes coros, mas se adaptem
também aos pequenos e favoreçam uma ativa participação de toda a
assembleia dos fiéis”. E, de facto, os cânticos mais elaborados
incluem geralmente uma melodia destinada à assembleia.
b. Além disso, estas
páginas são uma palavra profética de quem luta contra a mediocridade
e contra muita música indigna da casa de Deus. É que o Concílio,
numa visão muito ampla, declara que aceita e aprova no culto divino
todas as formas autênticas de arte, desde que dotadas das qualidades
requeridas. Aqui recordo sempre uma frase muitas vezes repetida pelo
compositor bracarense, cón. dr. Manuel Faria: “A música, se é má,
não pode ser sacra”.
c. Neste contexto, não
é só o dr. Gamboa que está de parabéns, mas também a Diocese, os
coros e as nossas assembleias, por disporem deste enriquecimento do
património da música litúrgica.
d. Estes livros e CDs
são uma oferta generosa do dr. Gamboa: do seu tempo, da sua
criatividade e... de muito do seu dinheiro... Como foi já referido,
o produto da venda dos CDs reverte em benefício do novo órgão desta
igreja, que chegará em breve. Também a preparação da edição foi
custeada pelo autor.
Por isso termino:
Dr. Gamboa, parabéns e
obrigado”.
Domingos Peixoto
7.
Cânticos para a liturgia (3.ª edição)
A 3.ª edição dos
“Cânticos para a Liturgia”, “reformulada, corrigida e aumentada”,
veio à luz do dia em dezembro desse mesmo ano de 2013, em edição da
Gráfica de Coimbra.
Algumas novidades: mais
cânticos, alguns não sendo específicos do “próprio”, o Glória 2
já tem acompanhamento de órgão que eu escrevi, traz
/ 380 /
o Credo, os salmos saíram e estão em livros autónomos... E a
insistência no trabalho com a assembleia:
“É importante e
indispensável o canto da Assembleia e o Coro deve promover e
facilitar a sua participação, assumindo o papel de a educar e apoiar
dialogando com ela. Um ensaio de pelo menos cinco ou seis minutos,
bem conduzido e motivador, explicando algum termo, expressão ou
ideia e a possível relação com a Palavra do dia, é sempre muito
frutuoso. (...)
Nada mais belo e santo
e agradável do que uma Assembleia litúrgica a cantar, a cantar a fé
da Igreja, a fazer a festa de Jesus Cristo”.
8. As
antífonas do Ó
Em outubro de 2014,
publiquei ainda “As Antíforas do Ó”, em dois cadernos policopiados,
um com a versão para coro, o outro com acompanhamento de órgão
escrito pelo professor Domingos Peixoto.
A razão da composição
destas Antífonas do Ó está num jovem brasileiro de nome Luís
Humberto Borges, que me conheceu através do padre João Caniço, e a
quem ofereci todos os meus livros e CDs. Vivia em Uberlândia, havia
estudado e continuava a estudar música e, em mail de 11 de
fevereiro de 2013, com 25 anos, diz-me que “estava em dúvida se
partia para o doutorado (doutoramento) em música ou
ingressava na vida religiosa”.
Também me confessa:
“Luto pelo zelo da boa música no templo!” E logo a seguir afirma
que, mesmo na sua paróquia, quem ia à missa “não tinha a certeza se
estava num circo ou num salão de baile de péssima qualidade!”
Em carta de 14 de
fevereiro de 2013, eu disse-lhe, entre outras coisas:
“Persista na dignificação da música na Liturgia.
É um esforço que precisa de muitos apóstolos. E dura anos, é preciso
muito tempo. Contagie outros, motive outros para esta causa.
Entreajudem-se, apoiem-se!”
/ 381 /
Pois este jovem
pediu-me um dia, todo entusiasmado com a beleza dos textos, que
musicasse as belíssimas Antífonas do Ó. Fiz isso em 2014.
Da bem documentada
“Apresentação” (p. 3), escrita em setembro de 2014, saliento:
“A expressão máxima da
esperança bíblica na vinda do Messias está concentrada nas sete
antífonas usadas na oração do Magnificat nas Vésperas da última
semana do Advento (de 17 a 23 de dezembro): “Ó Sabedoria do
Altíssimo”, “Ó Chefe da casa de Israel”, “Ó Rebento da raiz de Jessé”,
“Ó Chave da casa de David”, “Ó Sol nascente”, “Ó Rei das nações”, “Ó
Emanuel”. Neste “Ó” invocativo inicial é que se deposita toda a
força dos sentimentos da Igreja no tempo em que se preparam as
festividades do Natal. Daí serem estas orações conhecidas por
antífonas do “Ó”.
(...) As antífonas
invocam, com títulos do Antigo Testamento, o Verbo que já incarnou e
agora vive no meio de nós e suplicam-Lhe que venha de novo: “vinde
ensinar-nos...” “vinde resgatar-nos...”, “vinde libertar-nos...”,
“vinde iluminar...”, “vinde salvar-nos...”.
As antífonas do Ó estão
compostas a uma só voz e podem ser usadas também na Eucaristia, em
celebrações da Palavra e da Penitência e na popular novena de Natal.
Muitos artistas de
todos os tempos – escultores, pintores, músicos e poetas – criaram
as suas obras contemplando a figura da Senhora grávida. Num sermão
de 1640, o padre António Vieira ensaiou uma leitura clássica da
figuração geométrica do “Ó”, o círculo da perfeição.
Além da música para as
antífonas, também tinha escrito, em 1998, um poema que está na p.
189 do livro “Novamente Diário” (Aveiro, 1999) e canta a Senhora “do
ventre redondo”.
/ 382 /
SENHORA DO Ó
Senhora do Ó:
teu ventre redondo e fecundo
contém a redenção do mundo.
Senhora do Ó:
teu seio arredondado,
morada do ser, vaso sagrado,
traz o Messias anunciado.
Senhora do Ó:
em teu seio escondido,
albergue de Deus e abrigo,
está o Verbo oferecido
a toda a humanidade,
em tua maternidade,
para a vida nova e salvação,
Senhora da Encarnação.
Senhora do Ó:
em teu corpo guardado,
conténs o Filho de Deus
desde sempre esperado
para salvação do mundo,
Senhora do ventre redondo e fecundo.
II. O Coro Litúrgico de
Milheirós de Poiares, exemplo fecundo e luminoso de dedicação à
música litúrgica e sacra
Ao longo dos capítulos
13 e 14, o grupo coral litúrgico da paróquia de S. Miguel de
Milheirós de Poiares, concelho de Santa Maria da Feira, é
constantemente citado. O mesmo acontece neste capítulo 17 e irá
ainda repetir-se
/ 383 /
no 18, no 20 e no 21. A sua presença na minha vida e atividade
litúrgica e cultural é constante, é mesmo positivamente omnipresente
e avassaladora. Deu visibilidade e brilho às minhas iniciativas.
Desde o dia 15 de
dezembro de 1991, em que cantou connosco em São Bernardo, na
eucaristia das 11 horas, e à tarde se apresentou, juntamente com o
Coral Vera Cruz e o Coro Litúrgico de São Bernardo, num concerto de
Natal, até 17 de outubro de 2015, no Museu de Aveiro/Museu de Santa
Joana, no lançamento do romance “Um Anjo na Cidade”.
Em 15 de dezembro de
1991, o programa foi o seguinte:
No final do concerto,
os três coros executaram em conjunto, com flautas de bisel tocadas
pelos meus “pequenos cantores”, o cântico “Ergue os teus olhos”, de
A. F. Santos.
Em 17 de outubro de
2015, mais de 24 anos depois, o Coro Litúrgico de Milheirós de
Poiares voltou a estar presente, de maneira brilhante, no concerto
que antecedeu a apresentação do referido livro e se realizou na
Igreja de Jesus do Museu de Santa Joana.
Das obras apresentadas
quero salientar as seguintes: as que têm os n.os
(4) e (5) são dois trechos breves
para órgão (escritos por João Gamboa) e foram executados pela
organista Marília Canhoto, no órgão de tubos do coro alto da
referida igreja; a n.º (7), Formosa Princesa, é o hino de
quatro estrofes com que termina no romance a cantata “Os olhos de
Joana”, que João Gamboa pôs em música especialmente para este
concerto, no qual foi executado pela primeira vez.
/ 384 /
Quero agora tentar
proceder ao levantamento completo de todas as intervenções corais,
quer litúrgicas quer de caráter cultural, que o Coro Litúrgico de
Milheirós de Poiares levou a cabo, em situações ligadas ao meu
percurso musical e literário.
(1) Em 15 de dezembro
de 1991, o CLMP participou, pela primeira vez em São Bernardo, na
eucaristia e num concerto de Natal, como acabei de indicar.
(Fica assim corrigido o
que escrevo à frente, no n.º (13) – pp. 386 ss. –, no texto da
intervenção que pronunciei em Milheirós de Poiares, no dia 22 de
dezembro de 2012).
(2) Em 2 de julho de
1994, no auditório da Biblioteca Municipal de Aveiro, cantou na
apresentação do meu livro de poesia “Invocação de Deus”.
(3) Em 26 de novembro
de 1994, na Igreja da Vera Cruz, em Aveiro, cantou no Concerto
espiritual “Invocação de Deus”, com poesia de Eugénio Beirão e
música de João Gamboa.
Aos presentes eu disse,
entre outras ideias: “A
Palavra eterna de Deus e a palavra efémera do poeta confrontam-se
num diálogo dinâmico e insinuante, resultando para todos – assim
espero – um feliz momento de alegria espiritual, de oração e de
louvor a Deus. Por outras palavras: através da poesia e da música
podemos elevar-nos a Deus. É este o objetivo deste concerto
espiritual. E é este o meu desejo”.
(4) Em 14 de maio de
1995, no Museu de Aveiro, no espetáculo “Poesia e Música para Santa
Joana” integrado nas Festas do Município 95, o CLMP cantou com
outros na grande homenagem à Padroeira da cidade, Santa Joana
Princesa (cf. Cap. 14, pp. 326-331).
(5) Em 15 de fevereiro
de 1998, deslocou-se a São Bernardo o CLMP e também o coro infantil
e o coro juvenil – a paróquia em peso. Cantaram connosco na
eucaristia e de tarde ofereceram um belo e variado concerto. Também
atuaram o conjunto de metais da Escola de música da Fanfarra e o
/ 385 /
Coral Vera Cruz. Era o Dia do Coro e inaugurámos um novo órgão. Foi
dia importante.
(6) Em 16 de outubro de
1999, o CLMP deslocou-se a Peraboa, Covilhã, e, no 2.º Encontro de
Naturais de Peraboa, apresentou na igreja paroquial um concerto
breve com cânticos de João Gamboa e a seguir cantou na missa
festiva.
(7) Em 26 de maio de
2001, na Igreja Matriz de Milheirós de Poiares, na apresentação da
Música Litúrgica de João Gamboa – livro “Cânticos para a Liturgia”
–, o Coro interpretou um vasto programa de cânticos, alguns
associados à leitura de poemas de Eugénio Beirão.
A meio do concerto,
usei da palavra e disse que aqueles cânticos que tínhamos estado a
ouvir “foram compostos para a celebração da fé: o seu objetivo é,
pois, ajudar e permitir às comunidades cristãs
fazer a festa de Jesus Cristo, a festa
da salvação, na eucaristia de
cada domingo.
Mais à frente:
“Aos amigos do Coro
Litúrgico de Milheirós de Poiares, tão brilhantemente dirigido pela
professora Clarinda Ferreira, musical e pastoralmente competente,
com um trabalho muito seguro e uma dedicação digna do maior realce e
admiração, onde não falta a atenção da organista Manuela Sousa e o
dinamismo organizativo do Francisco Maia, a todo o coro e a todos os
que leram poemas, o meu profundo agradecimento”.
(8) No dia 11 de julho
de 2001, na Igreja Matriz de Cesar, o Coro de Milheirós de Poiares
apresentou um concerto com bastantes cânticos litúrgicos de João
Gamboa e alguns poemas de Eugénio Beirão, lidos por Albina Almeida.
Mas também partituras de música sacra de compositores consagrados.
(9) Em 18 de maio de
2002, à noite, o CLMP apresentou um “concerto de música coral
litúrgica”, da autoria de João Gamboa, na igreja do Seminário da Boa
Nova em Valadares. Foram lidos poemas de Eugénio Beirão. O
concerto integrou-se no “Congresso da ARM”, que, sob a presidência
de Serafim Fidalgo e pela primeira vez, durou dois dias (tarde de
sábado, serão e manhã de domingo). O convite ao coro foi feito pelo
autor, que ofereceu o concerto à ARM e aos armistas.
(10) Em 15 de dezembro
de 2007, o Coro de Milheirós de Poiares apresentou
/ 386 /
um concerto de Natal na Igreja Nova de S. Tiago de Rio Meão,
cantando compositores clássicos e alguns cânticos de João Gamboa.
Também foram lidos poemas de Eugénio Beirão.
(11) Em 18 de Abril de
2009, no lançamento de dois livros – “Os Dias Férteis” (poesia) e
“Invenção para dois trombones e outras histórias” (contos) –, o CLMP
esteve no auditório da Biblioteca Municipal de Aveiro, cantando
temas litúrgicos e não litúrgicos.
(12) Em 17 de abril de
2010, no Espaço-Museu da Sé de Aveiro, na apresentação do livro “Nas
asas da Liturgia e outros voos”, de João Gamboa, o CLMP cantou, em
concerto breve de música sacra e litúrgica, acompanhado ao órgão por
Marília Canhoto.
(13) Em 22 de dezembro
de 2012, o CLMP organizou na sua igreja matriz o lançamento dos 2
CDs “Cânticos para a Liturgia”, que havia ele próprio gravado em
2010 e 2011 e tinham acabado de ser editados. E fê-lo com um belo
concerto.
Pude falar e li com
emoção as palavras que escrevera e aqui deixo na íntegra, tão
relevantes eram para mim a circunstância e o merecimento e simpatia
do gesto do Coro de Milheirós de Poiares.
Senhor padre Fernando
Dra. Clarinda Ferreira,
ilustre diretora artística do Coro Litúrgico Queridos Amigos do Coro
Litúrgico de Milheirós de Poiares
Minhas senhoras e meus
senhores, com relevo para outros cantores
Uma saudação amiga para
todos e a expressão da minha alegria por estar entre vós, a que
junto a minha gratidão por mais este gesto e este momento de música
e cultura.
O encontro-concerto de
hoje, promovido pelo Coro Litúrgico de Milheirós de Poiares,
encerra, ou continua, uma relação musical de mais de 18 anos entre
mim e o Coro de Milheirós de Poiares, que se traduz em mais de 25
encontros, nos quais umas vezes houve um concerto e outras
celebrámos a Eucaristia e realizámos um concerto.
Esta relação teve o seu
início em julho de 1994, no lançamento do livro de poemas
/ 387 /
“Invocação de Deus”, na Biblioteca Municipal de Aveiro
[de facto esta foi a segunda vez!],
e teve alguns momentos muito importantes, entre os quais saliento:
– Fevereiro de 1998, em
S. Bernardo: Eucaristia com bênção do Órgão (eletrónico) e concerto,
tendo participado também os vossos Pequenos Cantores;
– Outubro de 2000:
apresentação da música do livro “Cânticos para a Liturgia”, com
concerto na Igreja da Santa Casa da Misericórdia de Aveiro e
Eucaristia presidida pelo bispo D. António Marcelino, na Sé de
Aveiro;
– Março de 2007, em S.
Bernardo: Eucaristia e concerto em memória de Irene Roseira;
– Maio de 2007:
Eucaristia e concerto no Encontro Nacional da ARM, no Convento de
Cristo, em Tomar;
– Dezembro de 2007 a
dezembro de 2008: execução do projeto “Música Litúrgica de Padre
Arménio e João Gamboa”, na Igreja da Santa Casa da Misericórdia de
Aveiro, com os seguintes ciclos:
• Ciclo Advento-Natal, em 9 de dezembro de 2007,
• Ciclo Quaresma-Páscoa, em 9 de março de 2008,
• Ciclo Padre Arménio, em 6 de junho de 2008,
• Ciclo Tempo Comum, em 26 de outubro de 2008,
• Ciclo Nossa Senhora, em 8 de dezembro de 2008.
– 2009 e 2010, no DeCA
da UA: gravação da música litúrgica guardada nestes dois CDs hoje
aqui apresentados;
– Abril de 2010:
concerto na Sé de Aveiro e Eucaristia em S. Bernardo, no lançamento
do livro “Nas asas da Liturgia e outros voos”.
Como acabamos de ver,
sempre o culto e o amor à cultura musical, com relevo e dedicada
promoção da música litúrgica. Nisto temos sido cúmplices. Os CDs são
disso a prova e como que a coroa e a assinatura.
Deles diz a Irmã
Celeste Lopes, de Arronches, onde é responsável do canto litúrgico:
“Deliciei-me a ouvir o CD. As melodias variadas e muito bem
conseguidas. Uma harmonização e execução melódica que fazem
rezar e elevar para Deus. As vozes dos solistas duma afinação exata
e expressiva! Apreciei muito. Muitos parabéns...”
Confesso-vos que
aprendi muito com o Coro Litúrgico de Milheiros de Poiares e tenho
por ele elevada consideração e estima. Penso que, com a sua diretora,
a organista, os salmistas e todos os cantores, ele é exemplo
luminoso daquilo que
/ 388 /
escrevo num texto que, não
tendo tempo para ler, vos deixo para reflexão – a vós e a outros
coros –, a partir da sua leitura num ensaio. (Era o ponto 1. do
texto publicado nas pp. 321-323 destas memórias, “Na liturgia a
música é serva, os ministros do canto também).
|
Agora, só dois
testemunhos muito rápidos e claros.
Primeiro. O senhor
Manuel da Flauta, de S. Bernardo, tinha sido flautista na Banda da
Armada e havia regressado à terra. Um dia, no fim da celebração da
Eucaristia, espera-me à saída e diz-me, extasiado e feliz: “Senhor
Fulano, que bonito: as palavras dos cânticos a baterem certo com as
palavras das leituras!”
Segundo. Era a Festa do
Pai Nosso na missa paroquial e houve reunião com o senhor prior, as
catequistas e eu. Relativamente aos cânticos eu disse os que havia
escolhido e porquê e os que eram mais adequados às crianças e que
lhes ensaiaria. Chegados ao Pai Nosso, sugeri: o senhor prior faz um
convite especial a dar as mãos ou a elevá-las para o céu e cantamos
o Pai Nosso, com o seu texto e melodia oficiais. Não quiseram. E
defenderam um cântico das crianças após a comunhão. No dia da
celebração: a homilia demorou 28 minutos e foi muito profunda e
mística – as crianças e os adultos nada devem ter entendido; no
momento do Pai Nosso, nenhum convite a nada e recitação a correr,
que o tempo ia longo. Depois da comunhão, saiu de lá o “Pai Nosso
galego”!
/ 389 /
O senhor Manuel da
Flauta, se pudesse, partia o seu amado instrumento na cabeça daquela
gente. E não era pecado! Sim, partia a flauta, que a cabeça devia
ser muito dura.
Ainda uma confissão
feliz: na Sé de Aveiro, por duas vezes que por lá passei nos últimos
dias, ouvia-se, em fundo suave e contemplativo, a música do Advento
deste CD. Graças a Deus!
Graças a Deus, também,
pela celebração de 40 anos de serviço à Igreja, na sua liturgia, e
aos homens, na cultura, que o grupo coral litúrgico de Milheirós de
Poiares está a iniciar. Parabéns ao Coro e parabéns à Paróquia que
recolhe e desfruta os frutos do seu trabalho e dedicação.
(14) Como se disse
atrás (p. 377), em 26 de janeiro de 2013 o CLMP apresentou na igreja
da Glória um “Concerto em favor do órgão de tubos da Sé, em
construção”, e cantou na eucaristia das 19 horas.
(15) Em 17 de outubro
de 2015, o CLMP cantou no lançamento do meu livro “Um anjo na
cidade”, no Museu de Santa Joana, em Aveiro. Como já vimos (p. 383).
E como tive eu notícia
do Coro Litúrgico de Milheirós de Poiares? Através de Francisco
Maia, porque conhecer este era saber da existência daquele coro.
Para tanto era preciso descobrir Francisco Maia. E foi no âmbito da
ARM que encontrei o Chico pelo ano de 1990. (Calma, estamos quase a
chegar lá!)
A ARM – Associação
Regina Mundi dos antigos alunos da Sociedade Missionária da Boa
Nova acolhe os antigos candidatos ao sacerdócio missionário que
estudaram naquele Instituto. Em determinada altura do percurso
desistiram e seguiram outro rumo, mas a amizade mútua e o
reconhecimento pela formação recebida levou-os a associarem-se e a
reencontrarem-se de vez em quando, em atividades de diverso teor.
Foi aí que conheci o Chico, muito mais novo que eu. Além de bom
cantor era (e continua a ser) o presidente da direção do Coro e um
excelente animador, dinamizador e congregador. Daí a iniciarmos esta
longa e riquíssima colaboração foi um passo.
(Quanto à ARM, não
espere o leitor pela demora, porque no capítulo 20 vai conhecer um
pouco do que se passou por lá durante alguns anos deste século. Isto
está tudo entrelaçado!)
/ 389
/
O Coro Litúrgico de
Milheirós de Poiares (Santa Maria da Feira) foi fundado em 1972,
anima as celebrações dominicais da sua paróquia e tem um ensaio
semanal de duas horas. O seu currículo é vastíssimo e muito variado
– desde a música litúrgica de qualidade à música sacra, acompanhada
com órgão ou orquestra e a capella, em contexto celebrativo
do culto e em situação de concerto.
A dra. Clarinda
Perestrelo Ferreira é a diretora artística do coro desde a sua
fundação. Diplomada com o Curso Superior de Piano pelo Conservatório
de Música do Porto, é também licenciada com o curso de Complemento
de Formação no Ensino de Música do Instituto Piaget de Canelas,
Gaia, sendo professora de Educação Musical. Na sua paróquia tem
desenvolvido um notável trabalho pastoral no domínio da música
litúrgica, sendo responsável também por uma escola de música para
crianças e um coro litúrgico infantil.
Sempre ligada às
orientações e beneficiando do grande dinamismo do Serviço de Música
Litúrgica da diocese do Porto.
Seja-me permitido mais
um aparte, e breve, relativo a São Bernardo. Nos anos de 1994 e
seguintes apoiei (também monetariamente) três jovens, que tinham
sido “pequenos cantores” e estavam no Coro Litúrgico, na frequência
do Curso de Música Litúrgica da diocese de Aveiro. Foram elas: Sara
Simaria (só um ano), Maria Margarida de Jesus e Susana Maria Rebelo
Ferreira. Nenhuma completou o curso, mas as duas últimas continuam
ativas na paróquia. Susana Ferreira levou mais longe o esforço e por
2011 voltou a estudar órgão com a professora Celina Martins, durante
dois anos. E tem sido a organista do coro que eu dirijo, tendo
sucedido a d. Irene Roseira, quando esta se afastou.
III. “A propósito do
órgão de tubos da Sé, em construção”
Sob este título,
publiquei no semanário diocesano “Correio do Vouga”, em 6 de março
de 2013, p. 21, e na semana seguinte, 13 de março, p. 20, dois
textos à volta dos órgãos de tubos da Sé – o histórico, de 1754, e o
novo, nessa altura em construção, e que veio a ser benzido e
proporcionou o concerto inaugural em 12 de julho do mesmo ano de
2013.
/ 391 /
São esses dois textos
que aqui ficam, o primeiro deles em segunda republicação.
(1)
Órgão de tubos emudecido
Ninguém acende uma luz
debaixo da mesa ou no canto da sala, junto ao chão. Não iluminaria
os convivas e não pouparia energia aos donos da casa se esse fosse o
objetivo; antes roubaria brilho à festa, ao mesmo tempo que era
sinal de rematada insensatez.
Também não escreve o
poeta o seu poema para ficar olvidado na gaveta, a vida inteira; nem
o pintor joga e combina as cores no seu quadro para o deixar à mercê
do pó e da humidade, no fundo da oficina. Também o compositor não
escreve a sinfonia, o concerto ou a canção, para ficar embalsamada e
morta, florida embora, na partitura, mas para dela ser erguida pela
arte dos músicos e tornada deleite para os melómanos. Do mesmo modo,
a obra dramática só vale a pena ter sido escrita quando é recriada
pelos atores sobre o palco e assim diverte, sugere, ensina, critica,
comove.
Mas aquele órgão de
tubos, naquele templo belo e luminoso, é candelabro que não ajuda à
festa, porque está apagado e não há quem o acenda; é poema que não
encanta nem comove, porque ninguém o diz; é tela que a ninguém enche
os olhos, porque está coberta de teias de aranha, virada para a
parede; é partitura de tocata, tento ou fuga que não se toma
“magnificat” nem “alleluia”,
porque nenhum organista a arranca ao olvido e a faz ressoar
jubilosamente; é obra de teatro que nenhum público aplaudirá, porque
não há grupo que a leve à cena.
Quem se lembraria de
cirurgicamente roubar ao rouxinol a possibilidade de cantar tão
melodiosamente nas balsas e salgueirais? Ou quem se atreveria a
cortar as asas à águia para não subir às alturas e voar
magnificamente no azul, acima das montanhas? Ou, ainda, quem
poluiria, por desleixo, o riacho, matando toda a vida que nele
cantasse um hino ao Criador e sujando a limpidez da sua corrente?
Ou quem castraria o
pavão para que não ostentasse e não seduzisse a fêmea com o leque
aberto e deslumbrante da sua plumagem magnífica?
Ninguém faria nada
disto e fazê-lo seria tomado, provavelmente, por um ato
inqualificável, um ato de loucura, um ato criminoso. Ou não?!
Mas aquele órgão de
tubos, naquela igreja acolhedora, é rouxinol silenciado
/ 392 /
que a ninguém deleita os ouvidos e o coração com o seu cantar; é
águia de asas cortadas que não nos leva até à morada de Deus, na
montanha misteriosa azulviolácea; é rio enegrecido e sem vida que
não proclama as maravilhas da criação nem oferece ao viajante
cansado a frescura da sua água cristalina para deliciar os olhos e
matar a sede; é beleza escondida que não se vê e não aproveita a
ninguém, impedida de facilitar a resposta dos homens à mensagem e à
sedução de Deus...
Furtar uma obra de arte
à fruição dos homens é um ato grave. Impedir um ser vivo de o ser em
toda a sua plenitude relativa e de exercer a função para que foi
criado, é um crime grave de leso-Criador.
Aquele órgão de tubos
sem voz retalha-me a alma. Porque está esvaziado do seu ministério.
Foi construído para ajudar a assembleia dos crentes a louvar o seu
Senhor, e está ali desprezado, esquecido, morto. Foi feito para
ajudar a elevar até Deus os sentimentos dos homens ávidos do Bem e
do Belo, e jaz ali inútil e triste.
Aquele órgão de tubos
emudecidos corta-me o coração e faz-me chorar. É como Sexta-feira da
Paixão vista sem a luz da Fé. Ou como uma boda de casamento comida
em silêncio e sem rir.
Aquele órgão de tubos
não canta, não aplaude, não implora, não pede perdão, não contempla,
não pacifica, não exorta, não rejubila, não louva, não aclama, não
exalta, não celebra.
(Publicado em "O
Aveiro", Ano 3, N.° 108, 16
setembro 1993, p. 3, e republicado em “Ecos & Miragens, Crónicas”,
Aveiro, 2009, pp. 107-109)
(2)
O ÓRGÃO DE TUBOS DESEJADO
Está ali, incrustado na
parede e meio suspenso, há muitos anos. E reduzido ao silêncio,
apesar da bela fachada. Como um colorido mas embalsamado
pintassilgo. Ou como um rouxinol triste, emudecido dos seus gorjeios
e cantares.
Nas minhas insónias, às
vezes surpreende-me com os seus desabafos.
– Estou aqui esquecido
e desprezado, sem voz para cantar. As pessoas que são daqui já nem
olham para mim; sabem que não canto e não me ligam. Os que vêm de
fora olham-me com enlevo, admiram o meu rosto, que dizem ser belo, e
imaginam o júbilo e o deslumbramento do meu canto. Enganam-se,
coitados. Mas eu não tenho culpa.
/ 393 /
– Pois não! – apoio eu,
oferecendo-lhe algum consolo, mas sem estar seguro de que ele me
oiça, pois imagino que, se já não tem voz, também terá perdido o
ouvido.
É já bastante velho –
tem mais de 250 anos – o velho órgão histórico da Igreja de Nossa
Senhora da Glória, pois data de 1754. Colocado sobre as duas portas
góticas reconstruídas em 1976, que dão passagem para a sacristia
atual, teve anteriormente outras localizações e está ali desde essa
data. Sofreu grande remodelação em 1883, que o beneficiou e lhe
conferiu um som brilhante. Em 1976 foi totalmente revisto e bastante
enriquecido.
O fole manual foi
substituído por turboinsuflador; recebeu três meios-jogos de
madeira: bordão-aberto, de
dezasseis pés, flauta doce, de oito pés, e flautado,
de quatro pés; e foi-lhe aplicado um segundo teclado, ficando
provido de um tutti
e órgão positivo. Lembro-lhe esta sua
história e sabe o leitor o que me diz?
– Sofri muito ao longo
da minha vida. Mudaram-me de local, intervieram no meu organismo
aplicando-me próteses, dotaram-me de novas cordas vocais,
modernizaram o meu funcionamento... Tudo aceitei com um único
objetivo: cantar melhor, para melhor louvar o Criador e melhor
sustentar o canto do povo crente.
Digo-lhe que, de facto,
muitas gerações de fiéis beneficiaram da sua beleza sonora e com a
sua ajuda elevaram o coração e a voz em festa ao Senhor.
– É verdade! E sinto-me
muito feliz por isso – responde-me, entusiasmado.
– O período de que
melhor me lembro são os anos a seguir a 1976. O templo foi ampliado
e ficou muito belo. Muito cantei nesses anos, muitas mãos me tocaram
e eu exultei e fiz exultar de alegria. A catedral de Aveiro renovada
era uma primavera branca de flores e aleluias pascais.
/ 394 /
– Agora está aí,
jubilado, tendo já ganho direito ao descanso – acrescento, a
sossegá-lo.
– Talvez, pois parece
ser essa a vontade dos homens.
– De facto, os
entendidos optaram por não o restaurar e decidiram-se por um órgão
novo, moderno, construído de raiz, mais capaz de servir esta bela
casa de Deus.
– Eu sei... Aqui do meu
canto vou observando tudo e estou a par do que se passa. Já vejo,
além, o esboço da face do meu sucessor. E promete!
– E não está magoado?
– Claro que não. Até
rejubilo. Anseio mesmo pelo dia em que ele se apresentará em todo o
seu esplendor sonoro. Nesse dia, cantarei com ele, no meu íntimo e
em silêncio...
Fiquei satisfeito com
este desfecho. Uma grande alma dá sempre lugar a outra grande alma.
E esse dia já não está
longe, é daqui a menos de cinco meses. Até lá cumprem-se as etapas
previstas e os nossos corações vão aumentando de expetativa e
curiosidade. Sobretudo vão aumentando no amor ao órgão de tubos, por
tudo o que ele significa e representa e por tudo o que ele vai ser
para a Liturgia e para a Cultura em Aveiro, alimentando a
espiritualidade de muita gente.
O órgão de tubos é o
instrumento musical que em si concentra mais vozes e cores sonoras,
indo da mais celestial suavidade à mais poderosa, imponente e
arrebatadora força sonora.
O seu rosto, a sua
fachada é sempre artística e às vezes majestosa. A cara deixa
entrever a riqueza do coração.
Mais que todos os
outros instrumentos, o órgão de tubos é ressonância de toda a
Criação. O reino mineral está presente nos tubos de estanho, de
cobre (e às vezes de prata e ouro); o reino vegetal marca presença
nos tubos de madeira feitos das árvores da floresta (algumas muito
raras e preciosas); o reino animal manifesta-se e associa-se nas
peles dos foles, que são os pulmões do órgão. O órgão de tubos é,
portanto, um instrumento cósmico. Ele canta, em nome de toda a
Criação, em nome do Cosmos, o grande hino de louvor, o grande
magnificat ao Criador.
Por tudo isto, a Igreja
dá-lhe lugar de relevo na Liturgia. |
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