Li, há dias, que a
Câmara Municipal de Aveiro deliberou dar o nome de duas das
marinhas, do que foi o vastíssimo e importante salgado
aveirense, a arruamentos deste concelho.
Este facto decidiu-me a escrever sobre um assunto, que considero
de interesse, do qual tenho falado bastas vezes em conversas de
café, mas que recordações de uma antiga amizade me coibiam de
trazer à discussão pública.
Ainda antes de entrar no assunto principal, quero tornar claro
que, mau grado – e desculpem-me a gabarolice – já ter escrito um
livro sobre os barcos Moliceiros, de ser autor de um filme para
a RTP sobre estes barcos, de ter dado entrevistas e feito
palestras sobre o mesmo tema, não posso considerar, com muita
pena, porque sou aveirense e gosto muito dos Moliceiros, que
Aveiro seja a capital desta embarcação, ideia esta que agora se
veicula, com êxito, através de todos os “media”. O Moliceiro
era, e é, uma embarcação, essencialmente, do norte da Ria, onde
a água, sendo salobra, permitia o crescimento do conjunto de
plantas, designado como moliço, que constituía a sua
matéria-prima. Os Moliceiros vinham a Aveiro para vender este
fertilizante aos agricultores locais, descarregando-o nas
malhadas, ou, então, em dias festivos.
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Ria e marinhas
de sal de Aveiro, nos finais do século XIX e primeira metade
do século XX. |
O título que Aveiro
ostentou, durante séculos, foi o de «CIDADE DAS MARINHAS», não
só dada a dimensão do seu salgado e, consequentemente, do grande
número de pessoas que nele trabalhavam e de famílias que dele
viviam, mas também da qualidade e variedade do produto que dele
se extraía, o qual ocupou um lugar de relevo no contexto da
economia local.
E, posto este longo, mas creio que necessário intróito, começo a
teclar sobre o tema que me anda atravessado, há tempo demais,
nos poucos neurónios que me restam.
Creio que, nos finais da década de 1970, ou início dos 80, o
supracitado e há muito falecido velho amigo moveu, com êxito,
influências, para que fosse dado, a uma rua de Aveiro o nome de
António dos Santos Lé, viseense, cuja actividade, na nossa
terra, tanto quanto sei, foi, unicamente, de cariz profissional,
logo remunerada, pois se limitou a ser regente de uma Banda e a
dar lições particulares de música.
E qual o arruamento escolhido? A centenária “Rua das Marinhas”,
porquanto tinha sido nela a Sede da Banda, onde o regente em
causa ministrava os ensaios e aulas.
E nem a Comissão de Toponímia viu que estava a cometer um
atentado contra o património cultural aveirense, nem o Executivo
Autárquico teve escrúpulos em avalizá-lo ou, então, consciência
do erro em que estava, não só a colaborar, mas também a dar
cobertura.
Eu sei que das actuais placas consta a referência “Antiga rua
das Marinhas”, mas quem lá mora, reside na “Rua António dos
Santos Lé”, quem para lá escreve, fá-lo, também, para esse
endereço e, quem para aí se dirige, é pelo nome de António dos
Santos Lé que procura.
E, curiosamente, criou-se uma situação anedótica, na toponímia
citadina, onde passou a haver uma “Rua dos Marnotos” e uma “Rua
das Salineiras”, classes laboriosas que foram mandadas para o
desemprego, dado que lhes foi retirado o local de trabalho.
No final da década de 80, acompanhei quatro marnotos aveirenses,
a expensas da UE, numa visita às salinas da Guérande, em França;
curiosamente, reparei que, em todas as localidades onde
estivemos, havia um topónimo – rua, praça ou avenida – referente
à actividade salineira.
Quando é que se corrige este erro grave, incompreensível,
injustificável e insensato da toponímia regional aveirense?
Quanto a mim, é urgente que se tomem medidas rectificadoras. Não
querendo ser radical, proponho uma solução fácil. Basta que o
senhor Vereador da Cultura, que preside à Comissão de Toponímia,
sendo, não só aveirense, mas também homem da beira-ria, logo,
devendo ter especial sensibilidade para este tipo de
problemas, providencie para que a secular rua em causa passe a
ter a seguinte designação, nas respectivas placas
identificadoras:
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RUA DAS
MARINHAS
Antiga Rua
António dos Santos Lé |
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Aveiro, 4 de
Fevereiro de 2019
Diamantino Dias |