Amor e Vida no Portugal d'Antanho. O Senhor Abade, 1ª ed., Verdemilho, 2020, págs. 18-19


O Professor Rogério

Capítulo 5

Mais tarde, em 1890, quando surgiu o Ultimatum Inglês, reclamando para a Coroa Imperial Britânica a posse dos territórios africanos situados entre Angola e Moçambique, o chamado Mapa Cor-de-Rosa, os republicanos, que atribuíram a afronta à inabilidade diplomática do Rei D. Carlos, revoltaram-se no Porto. Dois rapazes de Quinta do Frade que andavam na tropa viram-se envolvidos. Foram presos, julgados e condenados – o que incendiou os ânimos na aldeia e dividiu monárquicos e republicanos, com os primeiros a considerá-los criminosos, enquanto para os segundos não passavam de vítimas inocentes das circunstâncias.

O anticlericalismo dos republicanos, cujas perseguições padre António começara a sentir ainda seminarista, levava-o a afastar-se daqueles que apregoavam ou praticavam esses ideais. Contudo, havia na aldeia uma pessoa que se apregoava republicana convicta mas cuja vida era exemplar. Tratava-se do professor Rogério. Era um homem profundamente apaixonado pela educação das crianças, tarefa a que se dedicava de corpo e alma. Enquanto professor, não se limitava a ensinar a ler, escrever e contar. Queria construir homens de corpo inteiro. Além de despertar nas crianças o gosto pela leitura, ensinava-lhes também o respeito pela natureza: aprendiam que a floresta é essencial na renovação de oxigénio do ar que respiramos. Celebrava todos os anos o Dia da Árvore, levando os seus alunos a plantar algumas. Na escola, organizava anualmente uma sessão para premiar os alunos que mais se distinguissem nos estudos. Colaborava com a Junta de Freguesia na distribuição de vestuário, livros e material escolar às crianças mais desfavorecidas. Numa palavra, fazia tudo o que era humanamente possível para cumprir a divisa que apregoava: “A Escola é o mais poderoso meio de evitar a Taberna e o Vício”.

Contudo, para padre António era realmente imperdoável que o velho professor Rogério se afirmasse republicano. Tinha tal fobia aos republicanos que a sua simples referência o levava a procurar novos argumentos para lhes denegrir a imagem. Porém o povo, que conhecia bem o professor, não ligava a isso. Os mais novos tinham sido seus alunos. Todos respeitavam a sua figura, independentemente de o abade gostar ou não gostar que ele fosse republicano. Sentiam a importância fundamental do seu trabalho na formação da juventude da terra e tinham-no, por isso, na mais alta consideração.
 

 
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