A protecção contra
incêndios na «Celulose»
desde a construção das
instalações fabris
POR ROGÉRIO CANSADO *
1 – Encontro-me integrado nos assuntos relacionados com a protecção contra incêndios, desde Julho de 1947, pois
pertencia ao Batalhão de Sapadores
Bombeiros de Lisboa.
As minhas funções permitiam-me dedicar a todos
os assuntos relacionados com a segurança de vidas e haveres, fosse qual
fosse o local e o tipo de instalações ou da indústria considerada.
Nas missões para que fui orientado, desempenhei funções de perito oficial em diversas empresas, mas só quando essas entidades eram obrigadas
a estabelecer, de acordo com a Lei, determinados
meios de segurança para proteger o seu pessoal
e evitar perigos a terceiros.
2 – Foi com grande espanto para mim, quando, no final do ano de 1951,
fui contactado pela Administração da «Celulose», a qual me encarregou do
estudo das Instalações Fabris de Cacia, sob o ponto de vista de
protecção contra incêndios.
Sempre considerei uma medida de longo alcance a deliberação dos
responsáveis pela «Celulose», ao pretenderem considerar, desde o início
da construção, os problemas de protecção contra tão grave risco. Julgo que foi uma
das primeiras Empresas que
em Portugal pensou neste assunto, considerado de
importância primordial nos países industrializados.
3 – Eis a origem da minha colaboração na «Celulose», que se mantém há
mais de 26 anos,
apenas com a interrupção durante 2 anos (1964-65),
em que estive ausente do Continente e fui substituído
pelo Sr. Eng.º Sacadura Botte, pessoa muito competente e que possuía
formação técnica idêntica à
minha.
4 – Vou tentar recordar alguns pontos relacionados com a história da
protecção contra incêndios na «Celulose». Assim:
–- No final de 1951 foi solicitada a minha colaboração para a elaboração
dum plano e projecto sobre a protecção das Instalações de
Cacia que se encontravam na fase inicial da
construção.
– Depois de contactos com alguns dos técnicos, dos quais citarei o Sr.
Eng.º Amperla, elaborei
em 12 de Dezembro de 1951, um parecer
técnico que se referia a instruções estabelecidas pelo Grémio dos
Seguradores, instalações a montar, considerações sobre as possíveis
reduções de taxas de seguros no caso da montagem de «spinklers», etc.
Aprovado o parecer técnico, apresentei o Projecto de Segurança
(23/2/52), o qual constava, essencialmente, da implantação da rede de
bocas de incêndio e de marcos de água, dos cálculos das canalizações, da
estação de comando de válvulas e da bomba destinada ao serviço de
incêndios, dos depósitos de água, das torneiras de suspensão, etc.
Este foi o plano base, ao qual se seguiram as diferentes fases que são
peculiares em projectos deste tipo (concursos, adjudicações,
empreitadas, fiscalização, etc.).
Foi sobre este plano que têm assentado todas as alterações que se têm
vindo a verificar, devido às ampliações sucessivas que tem sofrido a
Fábrica desde a sua inauguração.
– Entre as alterações mais importantes consideradas ainda antes da sua inauguração, mencionarei os projectos apresentados em 16 de Junho, 11 e 28 de Julho de
1952, referentes à rede complementar de bocas de incêndio, devido à
construção dos refeitórios, vestiários, lavabos e escritórios, ampliação
da zona destinada ao Parque de Madeiras, de nascente; libertação do tubo
abdutor de 600 mm de todas as derivações que estavam previstas.
– Em 27 ou 28 de Janeiro de 1953 elaborou-se a proposta da instalação
do grupo electro-bomba junto do colector de comando e do sistema de
alarme.
5 – Com a conclusão destes trabalhos, pode considerar-se terminada a 1.ª
fase da instalação dos meios de protecção contra incêndios da
«Celulose».
Estes trabalhos nem sempre correram bem. Assim, tendo-se optado pelas
canalizações de fibrocimento, como medida económica e não pelo ferro,
como se tinha preconizado, houve falhas técnicas com o primeiro
empreiteiro, que não conseguiu que as canalizações suportassem as
pressões hidráulicas exigidas no caderno de encargos. Um segundo
empreiteiro
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tomou conta da obra e concluiu os trabalhos com novas canalizações.
Verificou-se ainda que o grupo electro-bomba do serviço de incêndio
produzia uma pressão exagerada, pelo que teve de ser modificado.
Depois destes pequenos percalços, o sistema tem funcionado em condições
satisfatórias e lembremo-nos que ainda é o mesmo passados 25 anos de
trabalho.
6 –- O sistema adoptado foi o de malha fechada, com válvulas de
suspensão, o que tem permitido que as canalizações se mantenham
operacionais, mesmo
quando se têm verificado avarias nalguns troços. No projecto procedeu-se
com uma largueza tal, que
tem permitido suportar as ampliações sucessivas que se têm vindo a
verificar ao longo da vida da Fábrica e que não têm sido de pequena
monta.
7 – Com as instalações fabris prestes a serem
dadas por concluídas (26 de Maio de 1953), adquiriu-se o material
destinado a guarnecer os 3 depósitos destinados ao serviço de incêndios
e iniciou-se a instrução do pessoal da brigada de incêndios.
Para isso, contratou-se um antigo profissional dos Bombeiros (Gaspar dos
Santos), para que fosse o responsável permanente pela preparação da
brigada que se estava a constituir.
Encarregou-se ainda um Chefe do Batalhão de Sapadores Bombeiros (António
Simões Carneiro) para dirigir a instrução, motivo pelo qual se desloca a
Cacia regularmente.
8 – Dispondo-se de pessoal já em fase adiantada de treino, publicou-se
(20 de Outubro de 1953) um Plano de Instruções para a Protecção contra o
risco de Incêndios, que tratava dos seguintes pontos: responsável;
brigadas de incêndios; responsáveis pelas secções ;vigilância; sistema
de alarme; código de sinais; instrução normal do pessoal; exercícios
periódicos; revista do material e ensaios.
9 – Durante o ano de 1954 fizeram-se palestras a todo o pessoal sobre a
aplicação do material existente e deram-se instruções práticas
(extintores e bocas de incêndios).
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Estas instruções têm sido repetidas algumas vezes, ainda que não tenham
sido feitas com a frequência que seria para desejar.
Chegou-se ao ponto de fazer um exercício com fogo real, do qual apenas
tinha conhecimento o Comandante, o seu imediato e o Director das Instalações Fabris, além da Administração.
10 – Outras ampliações continuam a ser feitas, as quais vão sendo
acompanhadas da implantação
das respectivas medidas de protecção.
Recordo-me:
– Das medidas adoptadas na Fábrica de Cartão
Canelado e no Parque de Madeiras, Norte (Novembro de 1954).
– Montagem de botões de alarme, de detectores
e de sirenes (Janeiro de 1959).
– Parecer sobre a ampliação das Instalações
(8 de Janeiro de 1969).
– Montagem de portas blindadas automáticas anti-fogo na zona de
separação das Caves da Fábrica de Embalagens (15 de Fevereiro de 1969).
11 – Quanto ao Corpo Privativo de Bombeiros, a sua história poderá ser
escrita por pessoa que mais tenha lidado com ele. Contudo, não poderei
deixar de recordar a boa amizade e compreensão que tenho recebido de
todos, especialmente dos mais antigos e lembrar que:
– A brigada foi criada ao mesmo tempo do arranque da Fábrica (1953) ou
mesmo um pouco antes.
– Em 31 de Dezembro de 1955 foram elaborados os planos e os regulamentos
para a criação do Corpo, que teve a sua existência legalizada em 1 de
Abril de 1956.
– Foram seus Comandantes os Srs. Eng.º Barata da Rocha, José Luís Archer
e Dr. Lúcio Lemos. Este último ainda se mantém no Comando e merece a
nossa maior consideração pelo esforço que sempre tem dedicado a esta
missão, como tem demonstrado através da sua acção pessoal (a nível local
e nacional) e das obras publicados, que são muito apreciadas.
R. C.
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* Coronel de Engenharia. Consultor Técnico de Protecção contra
Incêndios.
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