Tudo aquilo que existe sobre a superfície
da
Terra não pode existir isoladamente. Seja o que for – obra da natureza ou obra do homem
– que apareça no globo, desencadeia uma série de acções e
reacções, provoca um conjunto de relações, impulsiona coisas novas, faz abortar e fenecer outras
coisas, como se se tratasse de um elo numa cadeia inerte ou de uma
célula de um ser vivo, por sua vez
sujeitos aos impulsos do exterior, tudo funcionando
segundo normas estabelecidas, e desenvolvendo a cadeia ou fazendo o ser
vivo crescer e originar novas vidas.
Uma unidade industrial – grande ou pequena que seja
–- não escapa a uma
tal determinação. A sua actividade encaixa em circuitos de relação,
absorvendo matérias primas, expelindo produtos
acabados, movimentando transportes, impulsionando outras indústrias e o
comércio, gerando e fomentando riqueza.
Restringindo o raciocínio que vínhamos desenvolvendo, vejamos como ele se aplica tão explicitamente às influências
mútuas da fábrica de pasta de papel de Cacia e o porto marítimo de
Aveiro.
Quando a Companhia Portuguesa de Celulose
iniciou a sua laboração em 1953 pode dizer-se que o porto de comércio de
Aveiro não existia. Consequentemente, por inexistência da segunda das
mencionadas entidades, nenhumas relações podiam existir entre elas. Porém,
a partir de 1958 e concluídas as obras da 2.0 fase dos molhes da barra
de Aveiro, a marinha de comércio começa a afluir a este porto e em cada
ano que passa o movimento de mercadorias vai ganhando expressão. Assim
se chega a
1963 com um total de mercadorias movimentadas
já superior às 70000 toneladas, embora sujeito às contingências
resultantes de uma irregularidade de navegação e de restrita diversidade
de mercadorias.
É então que a Companhia Portuguesa de Celulose, perante a realidade que
o porto de Aveiro começa a constituir, se apercebe que talvez possa
passar a dispor de um ferramental imprescindível à
sua actividade – virada para a exportação – em condições convenientes.
E então, em 1964, a C.P.C. inicia, a título experimental, as suas
exportações pelo porto de Aveiro e movimenta 12174 toneladas, o que
representa mais
de 32 % das mercadorias saídas e cerca de 12,6 %
do total do movimento nesse ano.
Por motivos que desconhecemos – mas alheios às condições portuárias
– a C.P.C. baixa verticalmente as suas exportações por Aveiro para as 1 414 toneladas em 1965,
para as reactivar em 1966, ano
em que atingem as 5246 toneladas. Logo de seguida,
ou seja em 1967, as exportações sobem para as
14587 toneladas, passando a ter o peso que haviam alcançado logo no ano
em que elas se iniciaram.
A seguir às pastas para papel vieram os papéis kraft e a subida das
exportações através de Aveiro,
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efectuadas pela C.P.C., aumentaram sucessivamente até rondarem as 100 000
toneladas em 1972 e em 1973. É notável que a pasta de papel e o papel
saídos pelo porto de Aveiro representaram, em 1972, 77 % das mercadorias
saídas e 45 % do movimento total do porto, e em 1973, respectivamente,
65 % e-42 %.
Em 1975 sente-se um decréscimo acentuado nas exportações de pasta e de
papel – bem como no movimento geral do porto – mas estas ainda representam, com as suas 67093 toneladas, 49 % das mercadorias saídas e
34 % do movimento geral do porto.
Em 1976 o movimento portuário entra em recuperação e aumentam as saídas
de pastas de papel e de papel, embora com menor expressão no cômputo
geral do tráfego portuário.
Pelo que acaba de expor-se verifica-se que a
C.P.C., a partir de 1967,
passou a utilizar Aveiro como primeiro porto para as suas exportações e
que o tráfego portuário que gerou teve um peso directo muito notável no
movimento ascensional do porto. Conclui-se, portanto, que a C.P.C. teve
uma influência
directa importante na implementação do porto de Aveiro.
Mas se é certo – como vimos – que a fábrica de celulose de Cacia
contribuiu para fazer crescer o porto de Aveiro com o movimento que a
ele trouxe com as suas exportações, não é menos certo que ela
influenciou de maneira muito assinalável, e indirectamente, toda a expansão portuária comercial.
Ora vejamos:
Quando a C.P.C. iniciou, em 1967, a utilização
de Aveiro para as suas exportações, o porto era incipiente e
desconhecido. A partir de então, Aveiro passou a dispor de meios de
actuação que lhe permitiam servir outras exportações e importações e a
ser conhecido da navegação. Seguindo o exemplo da C. P. C. outras indústrias como que descobriram o porto de Aveiro e
passaram a utilizá-lo tanto quanto possível, como que arrastadas, ou no
rasto, do movimento que a C. P. C. vinha fazendo.
As exportações da C.P.C. foram decisivas para que o podo de Aveiro como
que se tornasse conhecido; tiveram preponderância no apetrechamento
portuário, o que facilitou e possibilitou o atendimento de outros
tráfegos; permitiram a criação de meios de acção que, por extensão,
serviram a novos utentes e a novas mercadorias. Podemos dizer, como que
em jeito de fecho, que o movimento de mercadorias que a C. P. C. passou
a processar pelo porto de Aveiro, fez acelerar o crescimento do porto,
com todas as consequências benéficas daí advenientes, e que a fábrica de
celulose de Cacia, por sua vez, retirou vantagens da proximidade do
porto de Aveiro.
E aqui está – tal como dissemos nas primeiras linhas deste sucinto
apontamento – como todas as coisas se inter-relacionam e, mais
concretamente, como um benefício posto à disposição da Celulose e por
ela usufruído cria e estabelece acções e reacções e acaba por constituir
poderoso activador de
manifestações existentes e gerador de novas actividades.
Em 1977 o porto de Aveiro movimentou cerca de 410 000 toneladas de
mercadorias, contra as 117275 movimentadas em 1967.
Podemos afirmar que de modo nenhum o tráfego
portuário teria crescido como o expressam os números, se não fora o
impulso que, há cerca de 10 anos, lhe veio imprimir a Celulose de Cacia
com as suas exportações.
J. O. B.
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* Engenheiro-Director do Porto de Aveiro
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