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Boletim n.º 20-21 - Ano XI - 1993

Santa Joana

– A BEATIFICAÇÃO HÁ TREZENTOS ANOS

Mons. João Gonçalves Gaspar

 

Foi no dia 4 de Abril de 1693 que o Papa Inocêncio XII, depois de sancionar o culto imemorial prestado à Princesa Santa Joana, publicou o breve "Sacrosancti Apostolatus cura"; por ele, permitiu o Sumo Pontífice que se celebrasse liturgicamente a sua memória no dia 12 de Maio de cada ano, não só em Aveiro, mas também em todo o Reino e na Ordem Dominicana. Perfez-se agora o terceiro centenário.

A devoção à Filha de El-Rei D. Afonso V remonta aos princípios do século XVI, uns trinta anos após a sua morte em 1490, segundo alguns depoimentos prestados em 1626, no primeiro processo, por pessoas de avançada idade. No dia 12 de Maio, celebrava-se então a sua festa com a liturgia do "Comum dos Santos", ornamentava-se o coro de baixo onde fora sepultada, cobria-se o sepulcro de flores, acendiam-se velas e queimava-se incenso; as freiras, após os ofícios corais, desciam em procissão até ao túmulo – antes campa rasa ante o qual e sobre uma mesa expunham o retrato de Santa Joana em trajo de corte; as ditas religiosas, no mesmo dia, em vez de entoarem responsos pela defunta, cantavam antífonas, salmos e hinos de louvor a Deus por aquela que consideravam venerável.

Secundando e acompanhando a comunidade do Mosteiro, à igreja de Jesus acudia uma pequena multidão de devotos que seguiam as cerimónias, cumpriam promessas em acção de graças e rogavam novos favores; o culto, prestado sem decreto nem permissão apostólica, tinha frequentemente a presença de prelados regulares e seculares. Além disso, a Princesa continuava a ser retratada iconograficamente, para ser exposta tanto em Aveiro como nos conventos masculinos e femininos da Ordem dos Pregadores.

Esquecido o primeiro processo, foi finalmente admitida a causa, em 1687, completando-se, confirmando-se e esclarecendo-se então as informações anteriores. Procedeu-se a novos interrogatórios; ouviram-se declarações interessantes sobre a santidade da Venerável; produziram-se depoimentos históricos acerca da antiguidade do culto; narraram-se factos julgados prodigiosos; examinaram-se peças do seu vestuário, quadros representativos, relíquias e o túmulo; visitaram-se os lugares e salas onde habitou e onde faleceu; chegou-se à conclusão de que o culto era efectivamente anterior a 1525. As diversas peças do processo, que se desenrolou em Aveiro, Coimbra, Évora e Lisboa, foram enviadas para Roma, com o parecer favorável do bispo-conde de Coimbra.

Depois da beatificação, logo surgiu o desejo da canonização; contudo, as dificuldades diplomáticas surgidas entre D. João V e a Santa Sé de 1720 a 1723, desencorajaram os ânimos. Só em 1746 se pensou seriamente no respectivo / 10 / processo, que viria a iniciar-se três anos depois; decorreram os depoimentos sobre os escritos a seu respeito e sobre a fama de santidade, examinaram-se novamente o sepulcro e os restos mortais e viram-se os objectos que lhe haviam pertencido – o que tudo se finalizou em 1752. Após a revisão rigorosa do processo, em Roma, o Papa Bento XIV, em 1756, aprovou o parecer do promotor da fé, em ordem à prossecução do mesmo; agora era necessário completá-lo com os capítulos das virtudes para a decisão final.

Mas ficou por aí, em face das novas dificuldades entre Portugal e a Santa Sé, do rumo da política nacional durante a administração pombalina e do azedume entre o Marquês e o bispo-conde de Coimbra, D. Miguel da Anunciação.

Todavia, sobretudo a partir da criação da Diocese de Aveiro e das vicissitudes temerosas motivadas pelas invasões francesas nos princípios do século XIX, Santa Joana começou a ser invocada e venerada como celeste protectora das nossas terras e das nossas gentes.

Finalmente, em 1965, o Papa Paulo VI, ultrapassando todos os obstáculos canónicos por não ser canonizada, declarou-a como padroeira da Cidade e da Diocese.
Para os católicos desta região – e não só – no meio de quem a Princesa viveu e ficou sepultada, o seu túmulo não é apenas um mero objecto de museu; consideram-no principalmente como termo de piedosas peregrinações e rodeiam-no com flores, velas, incenso e preces. As personagens eminentes do passado serão tanto mais válidas no presente, quanto mais a sua memória inesquecível e o seu testemunho singular se tornarem patentes na vida de todos os dias. Por isso, lembramos o tricentenário da beatificação da Princesa Santa Joana.

J. Gaspar

NOTA: As festividades religiosas do dia 12 de Maio de 1993 também acentuaram a passagem do 3.º centenário da beatificação da Padroeira de Aveiro.


 

 

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