► FÁBRICAS E INDÚSTRIAS
Em Eixo há fábrica de telha e tijolo, de há muitos anos.
Do testamento de Jorge da Silva, morador que foi no
lugar da Granja de Cima e escudeiro da Princesa Santa Joana, freira do
Convento de Jesus, de Aveiro, feito no ano de 1555,(1)
se vê que este ficou devendo a quantia de 1:540 rs. a João Forneiro, de
Eixo, de serviços e de um milheiro de telha que lhe
vendeu, donde se prova que já no dito ano se fabricava telha nesta Vila.(2)
Que no ano de 1722 havia forno de telha nesta Vila consta do Livro do
Tombo último desta igreja de Santo Isidoro, pg. 32. A telha e o tijolo
da fábrica actual são muito estimados, porque o barro que é lavrado no
mesmo sítio do forno é dos mais finos deste género; e tanto que daqui
foi telha para a obra da Relação do Porto.
Na primeira Exposição do Porto de 18... tiveram a telha,
o tijolo e o barro desta fábrica uma menção honrosa, que nos foi
dirigida pelo Juiz respectivo.
No sítio do Rego, no alto do prédio de Manuel Marques
Vieira a correr ou perto do caminho que vai para a Silha-Sardinha,
aparecem a pouca profundidade vestígios de um pequeno forno de telha ou
louça, e uma pequena cova de se tirar barro no dito caminho.
A indústria mais importante desta Vila tem sido a das
caldeiras.
O pessoal desta indústria compõe-se de proprietários
capitalistas, artistas e criados caixeiros para andarem pelas feiras;
ainda que muitas vezes a mesma pessoa acumula os dois primeiros
mesteres, e alguns (poucos) os três ditos. Esta indústria consiste no
seguinte: – Os proprietários das lojas de caldeiras compram e mandam vir
do Porto pastas de cobre e latão amarelo e fazem ou mandam fazer nas
suas lojas caldeiras, tachas, alambiques, panelas, sertãs, escumadeiras,
fogareiros, esquentadores
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de cama e outros objectos, que se costumam fazer desta matéria, os quais
os ditos criados vão vender às feiras e pelas portas em quase todo o
Reino. Daqui resultou dizer-se em toda a parte «que Eixo é a terra dos
caldeireiros»; porém tal asserção não só não é exacta porque todo o dito
pessoal desta indústria forma uma grande minoria da terra, porque as
lojas de caldeiras nunca passaram de seis a oito, ocupando cada uma um
ou dois artistas e, quando muito, três criados; e nem esta indústria
pode ser considerada vil e tanto que os donos destas lojas
sempre ocuparam os primeiros empregos da terra.(3)
Esta indústria, até certa época, pode dizer-se que
foi um monopólio de Eixo, e então se fizeram boas casas
com ela;(4) mas, depois
que se estabeleceram em outras terras do Reino lojas de caldeiras e se
começaram a usar as obras de folha de Flandres e ferro fundido, tem
decaído muito; no entanto, ainda hoje se pode considerar o melhor da
terra.
Tem a Vila três lojas de ferreiros e um serralheiro.
Outro negócio importante é o dos bois. No mês de Agosto
vão alguns capitalistas e outros com dinheiro emprestado comprar
bezerros a Trás-os-Montes, que vêm vender de ordinário nas feiras do
Distrito e distribuir pelos lavradores destas e outras terras. Este
negócio já foi exercido em mais larga escala do que hoje.
Também foi importante o negócio de cavalgaduras, cavalos,
éguas e mulinhas de seis meses. Este comércio consistia em comprar para
revender logo, e está hoje quase abandonado, não havendo quem trate dele
exclusivamente. Os contratadores não corriam só as feiras do Distrito
mas até outras muito distantes, como as de S. João de Évora, Lisboa,
Golegã, Coimbra, Neves, Viseu, Calvos, Vila Nova de Famalicão e
Penafiel.
Uma indústria que deste há trinta anos tem progredido
pela sua maior expansão e aperfeiçoamento é a padaria de trigo. Esta
indústria é exercida por mulheres, que podemos reduzir a duas classes, a
saber, as que cozem diariamente, que são em número de dez ou doze, e as
que só cozem para certas feiras e festividades.
Aquelas vendem algum pão nesta Vila; uma grande parte em
Aveiro e nos Lugares de Cacia e Sarrazola, Oliveirinha e Costa,
Mamodeiro, Requeixo e Travassô; e cozem diariamente vinte alqueires de
trigo reduzidos a farinha. As padeiras que cozem só para feiras e festas
são em muito maior número.
Esta indústria é muito defraudada pelos moleiros e,
quando as padeiras compreenderem melhor os seus interesses e se puderem
emancipar destes, devem tirar bons lucros. É sabido que um alqueire de
trigo rende cinco quartas de farinha ou vinte maquias. As padeiras têm
recebido algumas vezes dos moleiros de cada alqueire de trigo nove
maquias de farinha! E ficam muito satisfeitas quando recebem doze
maquias! Hoje que os proprietários desta terra se empenham para se
libertarem dos moleiros, não devem as padeiras (pelo menos as que cozem
diariamente) deixar de seguir os exemplos daqueles, no
que tirarão um lucro certo.(5)
Os proprietários de atafonas têm o lucro de uma quinta parte – o que
moer por sua conta 400 alqueires de milho terá 500 de farinha. É esta
uma inovação que, se se generalizar, dará grande aumento a esta terra,
onde se consome anualmente uma grande porção de milho.
► A FEIRA DE EIXO
Esta feira fica num arrabalde da Vila, no sítio chamado a
«Serra de Eixo», e tem lugar no dia 3 de cada mês. O princípio desta
feira foi o seguinte:
Pouco depois de 1850, propôs a Câmara desta Vila que se
mudasse a feira da Oliveirinha para o dito local desta Vila; subindo
esta proposta ao Conselho do Distrito, a maioria deste votou contra a
proposta. Então o Bacharel Venâncio Dias de Carvalho Figueiredo, desta
Vila, e um dos conselheiros do Distrito, fez uma emenda ao projecto ou
proposta da Câmara para que se criasse a feira actual; e sendo esta
aprovada, se começou no dia 3 de Outubro de 1855. Como o tempo não era
próprio para edificações improvisaram-se umas barracas para as lojas
defronte das casas, mas separadas da feira do gado, que se determinou
ser o grande largo que fica do lado da Oliveirinha. A experiência tem
mostrado que esta separação foi um erro e tanto que os lojistas, que em
princípio concorreram, têm abandonado a feira, não só porque as barracas
se acham em mau estado, mas porque esta separação influi nos seus
interesses. No ano seguinte, fez-se uma plantação de sobreiros e outros
arbustos neste local, que foi mal sucedida, pegando muito poucos. É para
lamentar
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que se tenha deitado a um completo desprezo e que não se tenham reparado
os erros que teve nos seus princípios, porque o seu local é o mais usado
para um grande mercado, e tal que não seria fácil encontrar segundo como
este. O sítio, onde actualmente é a feira do gado, é um grande largo em
forma quase circular, cujo terreno enxuto e firmíssimo não é susceptível
de ter lama no inverno nem poeira no verão. Este local muito superior ao
da Vila, que domina, tem vistas muito pitorescas para esta, para o campo
e para muitos lugares e serras, que se avistam à distância de muitas
léguas até à serra do Caramulo. É neste espaço largo que deve ser toda a
feira, tanto de gado de todas as espécies, como de lojas e cereais,
etc.; e por mais que ela se aumente, não seria fácil ocupar todo este
espaço. A experiência tem mostrado a conveniência de se fazerem as
feiras com boa distribuição, arrumando os diferentes expostos à venda,
cada um no seu sítio; mas de maneira que todos formem um só corpo. É
pois urgente fazer-se o abarracamento com frentes para o sul e a correr
com as propriedades que ficam ao norte deste largo e arborizando-se este
e fazendo-se a distribuição dos mais objectos de maneira que fique
franca e livre a estrada de Eixo à Oliveirinha, que deve ficar no meio
da feira.
Esta feira dura há treze anos; a que é mais concorrida é
a de gado vacum e suíno; de cavalar quase não há transacções; vendem-se
cereais e hortaliças, e tem poucas tendas.
Quando se fizerem as obras, que tanto são precisas nesta
feira, deve ela aumentar-se muito, não só porque o seu local é
excelente, mas também porque fica central a muitas povoações.
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NOTAS:
(1)
– Vê-se a consciência e honradez desta personagem que mandou pagar esta
e outras quantias pequenas! Hoje não há disto!
(2)
– Não sabemos se este João Forneiro seria proprietário ou fabricante de
telha no mesmo sítio onde hoje é o forno que nos pertence; o que sabemos
com certeza (por termos os respectivos Títulos de compras) é que o nosso
bisavô Dr. Eusébio Custódio das Neves conjuntou várias leiras de terra
ao prédio do forno actual, com que lhe deu a extensão que tem; e já
numas das leiras conjuntas havia outro forno.
(3)
– Já no ano de 1749 os caldeireiros ocupavam os lugares de Vereadores e
Juízes da Vila, como se vê dos livros de registo da Câmara de Eixo; e
tinham tanta influência que se vê do livro de 1746 que na Câmara havia
12 medidas de cobre grandes e pequenas de líquidos e secos – alqueires e
ai mudes, etc. (cit. Livro fI. 54).
(4)
– Sirva de exemplo a casa de José Dias de Carvalho, do Casal, que deixou
por sua morte 60 contos de réis em moeda, além dos bens de raiz!
(5)
– Há na Vila cinco atafonas, todas feitas neste ano de 1868 e estão
muitas mais em projecto. Já antes se tinham usado, mas tão imperfeitas,
que foram todas abandonadas. As que se usam actualmente satisfazem muito
bem e esperamos que se venham a aperfeiçoar muito mais. Não devemos
perder de vista um novo invento de moinhos.
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