Serra da Freita – Pastoreando o rebanho
Neste país de humanizadas montanhas,
de ubérrimos vales, de doces planícies, neste país que, segundo o
ilustre Oliveira Martins, é monumental anfiteatro voltado ao mar, do
distrito de Aveiro, mostrando exactamente as mesmas características
e até a mesmíssima configuração, apresenta-se desde logo como que
vera síntese de Portugal.
Realmente, se atentarmos bem, com
olhos de ver, nada falta da Costa Verde ao Buçaco, das dunas
gafanhenses às escarpas do Douro no torrão de Paiva, do que existe
desde o Minho e Trás-os-Montes ao meridional Algarve das noivas
amendoeiras...
Serras amáveis, montanhas adustas,
praias tentadoras, estâncias de cura e de repouso, tabuleiros de
luxuriante vegetação, florestas, salinas com os seus montes de «neve
salgada», rios coleantes, vinhedos, pomares, extensas toalhas de
água, instalações fabris, monumentos, recantos edénicos, vastas
paisagens e essas flores que são sempre, estiraçadas na «carpete»
campesina, as cidades, vilas e aldeias...
Os dólmens, pré-históricos monumentos
sepulcrais ainda se vêem nas serras vizinhas.
Todavia, e dado emergirem dum
semelhante conjunto, dum tal paraíso, há ainda a considerar as
obras-primas, tudo quanto transcende a própria formosura, possui
invulgaridade, é susceptível de encantar os turistas mais exigentes.
Ora, sem sombra de dúvida, o vale de Cambra, quer seja surpreendido
das Baralhas, da Senhora da Saúde ou da estrada que corre para S.
Pedro do Sul, imbui-se de magia estranha, de poder sortílego...
Há quem compare este pedaço de terra
eleita a um recanto suíço. Nós, portugueses, somos decididamente
atreitos à sina de estabelecer confrontos inúteis... Olhando, por
exemplo, do aludido sítio das Baralhas, o panorama é excelso. E este
adjectivo, duma suprema
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de ser nosso, pertence a Ferreira de Castro, glorioso filho da
vizinha Ossela, escritor que deu a volta ao Mundo, romancista
traduzido em todas as línguas cultas do Globo...
Também a actual sede do concelho não
cessa de aperaltar-se e de se engrandecer. Se as suas indústrias de
lacticínios, de folha de flandres e de serração de madeiras, braço
dado com uma agricultura que oferece vinhos verdes gratíssimos ao
paladar, lhe dão o sustento, a vila tem noção do que valerá,
turisticamente, num futuro próximo. Daí, possuir ânsia de
aformoseamento, nó como é de rodovias que levam à vetusta, histórica
e castiça Arouca, às termas célebres de S. Pedro do Sul, à
progressiva urbe industrial de S. João da Madeira, a Oliveira de
Azeméis, graciosa e vidreira, a Sever do Vouga, recolhida e
sossegada...
Indispensável entroncamento de
comunicações, repetimos, para os quatro pontos cardeais (quando será
construída a ligação com Pinheiro da Bemposta?), é capaz, só por si,
esta velha «terra de Cambra», de fixar durante horas esquecidas,
largos dias, as almas ávidas ,de paisagens com alma...
Independentemente disso, afigura-se-nos talhada para constituir
amanhã já um fulcro de viagens turísticas às preciosidades de toda a
espécie que a cercam. A sua localização, efectivamente, é admirável.
Numas linhas que, antes de
exaltadoras são de trivial justiça, não ficaria bem, por certo,
olvidar Macieira, relíquia de antanho, afável, hospitaleira, credora
de vivas simpatias, dos maiores respeitos e atenções. Isto, contudo
não passará de pormenor. O que importa, nesta crónica, é proclamar
urbi et orbi a beleza singular, inefável da região.
Cheias de tradições, de lendas, de
história, as terras cambrenses parecem talhadas para um futuro
esplendente. O turismo, pelo menos, já começou a descortiná-las. |