Depois de cozida e escolhida, a cortiça
é cortada em traços (rabaneação), donde se extraem as rolhas.
Lamentavelmente, receio bem que
esteja ainda por escrever a história da indústria rolheira no Norte
do país. Na verdade, não tenho conhecimento algum da sua existência
e, muito menos, da sua origem. Tudo o que se sabe relativamente ao
início da industrialização da cortiça no Norte do país perde-se nas
mais díspares versões, sobretudo a partir dos anos anteriores a
1900.
Com efeito, salvo elementos
concretos em contrário, a explicação da origem da indústria rolheira
no Norte chega vagamente até nós, numa transmissão de história
falada, muito difusa e imprecisa.
Secção de brocas – Os traços são
brocados, saindo as rolhas.
Admite-se, porém, que a indústria
rolheira tenha proliferado em regime de artesanato doméstico, tendo
encontrado, inicialmente, como mercado de consumo, as caves de vinho
do Porto. Seguindo esta linha de orientação histórica, facilmente se
compreenderá qual a razão do alheamento narrativo acerca de uma
indústria que se iniciava de modo rudimentar, ou quase medieval.
Talvez o vulgo de então não se apercebesse de que se esboçava, pela
primeira vez, a que viria a ser a maior concentração da indústria
rolheira do país, hoje, num total de 207 unidades fabris.
Estas unidades estão repartidas mais
densamente pelas freguesias de Lourosa, Lamas e Paços de Brandão. A
indústria rolheira estende-se, ainda, sem tamanho
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afluxo às freguesias limítrofes de Fiães, Moselos, Oleiros e S. João
de Ver.
Com efeito, pode quase asseverar-se
que a indústria rolheira do Norte se encontra quase exclusivamente
no progressivo concelho da Vila da Feira.
EVOLUÇÃO INDUSTRIAL
No ano de 1912, a indústria rolheira
no Norte apresenta-se ainda com uma técnica muito rudimentar, e
denunciando manifesto atraso em relação à indústria roIheira do
Centro e do Sul do país. Entretanto, a despeito da crise provocada
pela guerra de 1914/1918, foi proliferando o surto
industrial-rolheiro, embora em ritmo muito lento. Esta agonia
prolonga-se até 1925.
Secção de escolha das rolhas
O Norte desconhece o mundo do
consumo. A Inglaterra procura-nos e transacciona. Exporta-se em
regime de consignação. O importador é que dita o preço que entende
pagar pela mercadoria. Por vezes, o próspero importador, pretextando
que o artigo exportado não oferece condições de apresentação ou
aspecto favorável, não só decide não pagar um centavo ao industrial
rolheiro como ainda tem o arrojo de exigir uma indemnização, ao que
se afirmava, para suprir despesas de transporte e encargos
alfandegários.
Hoje, continuam a exportar-se as
mercadorias sem as mínimas garantias de solvência. Admite-se sempre
que o importador «é bom homem» e cumpridor. Mas, por vezes, não é
uma coisa nem outra e, por sistema, reclama periodicamente e faz
descontos. Há peritos (importadores) especializados neste género de
trabalho.
Ora, como ia dizendo, a Inglaterra,
é nessa altura, o mercado das rolhas por excelência. Depois,
distribui por bom preço esse artigo pelo resto do mundo.
Os desperdícios de cortiça começam
também a ser procurados pelo estrangeiro, que nos visita e nos
compra; e por isso as aparas deixam de ser queimadas nas lareiras.
1926/27 são anos encorajadores para
o industrial rolheiro, pois as rolhas de cortiça são requeridas
agora com mais regularidade. Esta favorável situação industrial terá
induzido alguns industriais a incrementarem e a desenvolverem
tecnicamente a sua indústria, o que viria a ser tremendamente
trágico e inoportuno, para muitos deles, perante a crise de 1929.
A despeito de uma falta de
estruturas coordenadoras, de uma ausência quase absoluta de
capacidade industrial, a indústria rolheira do Norte foi-se
disseminando pelas freguesias de Lourosa, Lamas e Paços de Brandão.
Entretanto, durante o decénio 1930/1940, o industrial nortenho
sente-se receptivo a uma técnica mais evoluída, e há muito usada
pela indústria rolheira do Centro e do Sul. Mecaniza-se, assim,
embora tardia e rudimentarmente, a indústria rolheira e só então a
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unidade fabril no Norte perde a sua conhecida designação de
palheiro.
EM 1937 É FUNDADA A DELEGAÇÃO DA J. N. C. DO NORTE
Por outro lado, a indústria rolheira
espanhola quase se extingue, pois fica tremendamente abalada,
durante a guerra civil nesse país. (1936/1939). Durante este
período, verificou-se uma maior afluência na procura das rolhas de
cortiça em Portugal e o Norte tomava também posição de relevo num
maior incremento industrial.
Os dez anos subsequentes
caracterizar-se-ão mais pela proliferação de unidades fabris, dando
escoamento a uma procura mais intensiva que por qualquer outro
aspecto de modernização tecnológica.
A técnica é, também, então, produto
há muito importado, mormente da vizinha Espanha, e já incompatível
com as necessidades exigidas pela senda da evolução e progresso.
O período áureo da indústria
rolheira inicia-se praticamente a partir do ano de 1950 e
prolonga-se até ao fim de 1955.
Assiste-se a uma onda intensiva de
consumo a nível internacional, mais reforçada e confundida pela
presença da Argentina, durante o governo de Peron. Mas,
positivamente, a indústria rolheira também então não procurou
reestruturar-se tecnicamente, e limitou-se apenas a colher os frutos
de uma situação esporádica.
Todavia, esta época sacudiu e
despertou iniludivelmente uma noção de consciência comercial, que
até então andava muito arredada do industrial rolheiro do Norte. E
os mercados, que durante esse período eufórico nos procuravam,
depois dessa época, começaram, pela primeira vez, a ser visitados
nos seus países por uma grande parte de industriais rolheiros.
Esboça-se, aqui, uma fase de
prospecção comercial até então ignorada pelo industrial nortenho, e
quebra-se definitivamente o «slogan» bem denunciador de uma ausência
de capacidade industrial e comercial: «o vender é em casa, e o
comprar é na feira».
Irrompe-se, com efeito, de um torpor
industrial e comercial generalizados e dinamiza-se um espírito de
comercialização, embora incipiente, mas ousado e competitivo.
Em síntese, assiste-se nestes
últimos 10 anos a um inegável recrudescimento geral da indústria
rolheira, mas, como sempre, sem um conveniente sentido de orientação
técnica e comercial.
Por aqui se podem avaliar os milhões de
rolhas que se produzem diariamente, de que
o concelho da Feira é o maior produtor do mundo com 200 fábricas em
actividade.
POSIÇÃO ACTUAL DA INDÚSTRIA
Há elementos imprescindíveis na
composição dos corpos, como existem condições mínimas e fundamentais
para a formação e valorização das empresas.
Os alicerces de que emergiu a
indústria rolheira não oferecem condições ideais para uma evolução
saudável. Minguam os valores humanos na chefia ou Direcção
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das empresas. Faltam os viveiros de técnicos neste país para estudo
de máquinas actualizadas e muito mais produtivas. Faltam as rédeas
de um comando autêntico e eficiente nos organismos coordenadores –
travando oscilações e crises fabricadas, ignobilmente, por vezes,
pelas empresas mais prósperas, na mira de grandes lucros. Rareia a
mão-de-obra qualificada em consequência de uma franca emigração, que
de modo algum serve para neutralizar o presente desequilíbrio
industrial.
Com tamanhas carências acumuladas,
não é fácil admitir uma perspectiva feliz para a indústria rolheira.
Contudo, não se pode olvidar os extraordinários e insuplantáveis
recursos qualitativos da cortiça, pois bem sabemos que a presença da
indústria rolheira adentro dos mercados mundiais se deve mais às
excelentes características da matéria prima, que a um processo
tecnológico e comercial evoluídos. Mas não se poderá perpetuar, por
ignorância de uns, e por comodismo ou negligência de outros, este
género de confusão comum em que tem assentado a vida industrial
rolheira.
Há uma luta grandiosa a travar na
defesa de uma grande indústria portuguesa, a indústria rolheira.
Nessa batalha de fomento e desenvolvimento técnico, industrial e
comercial deveriam empenhar-se os organismos coordenadores, os
industriais e o Governo.
Todavia, na
qualidade de industrial rolheiro, sou de opinião de que deverão ser
os industriais, em permanentes reuniões de trabalho, a estudar os
problemas relativos à técnica industrial e comercial. Daqui dirijo o
meu apelo aos Ex.mos elementos do Grémio Nacional da Cortiça do
Norte, para que coordenem essas inestimáveis reuniões, e assim se
inicie e desenvolva um trabalho prático, objectivo e seguro, no
estudo dos problemas mais prementes da nossa indústria. |