Malan tem uma história cheia
de altos e baixos, uma vida agitada, desde o dia em que foi para o mato,
onde aprendeu a odiar o branco e a matar nas picadas, escondido atrás
dum morro de baga-baga ou dum tronco grosso, encoberto pela
cobardia e pelo capim.
Era alto e magro e tinha na
cara as marcas de pesadas mãos.
– Mim bandido, fogueia
tropa…
– Mas apanhou uma lição
quando lhe mostraram a vida miserável que levava, a fome e os perigos
que corria, a mentira que o guiava. Sofreu as grades da prisão. Mas,
quando lhe deram o ar livre de cada dia para ir semear o arroz e a
mancarra, ele não foi. Quis ficar. E dizia:
– Branco ser bom di mais,
tropa amigo, bandido mau...
Estas palavras perdoaram-no.
E ficou.
E ele, que conhecia os
caminhos traiçoeiros e o mato, era guia e, pelo menos, parecia merecer
confiança. Andou comigo e nunca me meteu em apertos. Vivia bem, à sombra
de todos. Comia e bebia do quartel e a mulher fazia patacão. De
manhã pilava o arroz e, de tarde, lavava roupa num riacho, enquanto, por
ali perto, brincava um miúdo, filho da sua carne.
Malan até um dia deu mostras
de valentia e amizade àqueles que sofreram um recontro violento em Morés.
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Ferido num pé, quiseram
evacuá-lo. Ele não quis. Não podiam ir todos. E insistia:
– Primeiro tropa…
Mas, quando veio do
hospital, descobriu-se-lhe a sombra negra, a traição. Malan enganou.
Também ele jogava com um pau de dois bicos. Enganou como o Caifa que
chegou a colocar minas na estrada. Eram informadores, mas, em geral, só
prendiam os que não tinham a ver nada com a guerra. Malan estava
implicado no crime que os bandidos projectaram. Ele sabia dos terríveis
planos, mas não os descobriu a ninguém e, no entanto, sabia que os 10 kg
de veneno, que estavam nas mãos do padeiro, seu cunhado, iriam matar na
primeira oportunidade.
Malan enganou. Ninguém sabia
até esse dia que ele era engajador. Levava bajudas às casas de
mato para noites de orgia. Nem ninguém sabia que ele era informador
também do outro lado e tinha um rádio escondido numa mala.
– Mim bandido... Tropa
amigo. Perdão!
Mas ninguém lhe perdoou.
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