J. Domingos Arede, Madaíl, concelho de Oliveira de Azeméis, Vol. XIX, pp. 3-40

MADAÍL, DO CONCELHO

DE OLIVEIRA DE AZEMÉIS

BISPADO DO PORTO

◄◄◄ / 7 /

CAPÍTULO I
ONOMÁSTICO DE MADAÍL. CONTRIBUIÇÕES
DE MADAÍL À SÉ DO PORTO, E AO ESTADO
NOS TEMPOS MEDIEVAIS. LEIRA REGUENGA
E HOSPITAL, NO LUGAR DO MEIO,
TAMBÉM DE MADAÍL

I
ONOMÁSTICO DE MADAÍL

Madaíl teve uma anterior forma, Madaildi, no latim medieval, e esta forma assentará em a designação villa Mathagildi (Quinta de um indivíduo chamado «Mathagildo», de origem germânica).

Vejamos, a seguir, sobre o topónimo de Madaíl, o que diz o Dr. JOAQUIM DA SILVEIRA, Notário aposentado da Figueira da Foz, um erudito em estudos onomásticos:

«As mais velhas referências, que lhe conheço presentemente, não vão além do século XlII e todas oferecem já a forma Madaíl. São umas inquirições de cerca de 1220 (Nova Malta, I, 364), − o chamado foral velho da Terra de Santa Maria de 1251, − o rol das freguesias do Bispado do Porto em 1259, − o Catálogo de todas as igrejas do País de 1320-21, etc.

No numeramento da população da Estremadura, de 1527, vem a grafia Madayl (Archivo Hist. Português, VI, 276), porque, na época, se usava o y para marcar o i tónico; e na Carta Corográfica de Portugal de 1/1000.000,  folha 10, Madaille, com pretensões a reproduzir a pronúncia popular. Também algumas pessoas no século XIX, e até no século XX, têm escrito esse nome com a forma Madahil, para melhor assinalar a existência do hiato (e não ditongo), na pronúncia das suas duas vogais interiores, − aí −, como se fazia naquele século, v. g. em sahir, ahi, bahia e nos topónimos Cahide, Sahil, etc., mas tais grafias, com um h que não tem qualquer justificação etimológica, são reprovadas quer pela reforma ortográfica de 1911, quer pelo recente Acordo Ortográfico Luso-Brasileiro.

A forma Madoil, que no século XVII aparece na Anacrisis Historial do P.e NOVAIS, IV, 200 (Porto, 1918), tem manifestamente erro de o por a. São, pois, muito escassos os elementos que podem auxiliar-me na averiguação etimológica de Madaíl. / 8 /

Partindo, porém, do que sucedeu, por exemplo, com o topónimo de terminação semelhante, Fail, freguesia do concelho de Viseu, que nas inquirições de 1258 aparece já com as formas Fail, Fayl, ao lado da mais pura Faildi, e que sabemos positivamente provir de uma primitiva villa Fagildi, «quinta de um indivíduo chamado Fagildo», podemos supor, − e eu, na verdade, suponho −, que Madaíl terá tido uma anterior forma Madaildi, no latim medieval, e que esta assentará em uma inicial designação villa Mathagildi, «quinta de um indivíduo chamado Mathagildo».

O nome pessoal Mathagildus, de origem germânica, não está ainda documentado, como tantos outros; mas a sua existência é admissível.

O seu 1.º elemento formativo, matha ou math, figura também em Matha-suintha, nome de uma princeza ostrogoda, em Matha-mod, nome de uma divindade germânica, em Mathildis, nome de mulher bem conhecido, etc.

O 2.º elemento gild, latinizado gildus, entra em muitos outros antropónimos: Athanagildus, Leubigilduz, Teodegildus, Fagilduz, Hermenegilduz, etc.

De Mathagildi até Madaíl houve as seguintes alterações fonéticas: a dental aspirada th intervocálica passou a d, como no nome pessoal Athala, «nobre», cujo genitivo deu o nosso topónimo Adalanes, em documento de 1024, hoje Adães (Barcelos e Oliveira de Azemeis); − o g intervocálico caiu, como no nome pessoal Leubigildus, que deu Leovildo e Leovigildo, em documentos de 980 e 1070, e como em latim − vagina e legitimus, de que nasceram − bainha e lídimo; − e o d da terminação − ildi foi assimilado ao l, tornando-se esta − illi, ille e por fim − il, como sucedeu no citado caso de Faildi, que através da forma Failli (que se lê em documento de 1221), atingiu a forma Fail, já em 1258.

Na nossa onomástica há vários casos de idêntica assimilação, que se observa também no português til (sinal ortográfico) resultante do espanhol tilde».

E friso de novo que a minha solução é uma simples hipótese, embora verosímil. Figueira da Foz, 1 de Maio de 1952, JOAQUIM DA SILVEIRA».

 

II
CONTRIBUIÇÕES DE MADAíL A SÉ DO PORTO
E AO ESTADO NOS TEMPOS MEDIEVAIS

A velha igreja de Madaíl pagou à Sé do Porto, nos tempos medievais, direitos com o nome de Censos, em todos e cada um dos anos, para a sustentação do bispo e do seu cabido. / 9 /

A Igreja velha de Madaíl foi tributada pelo seu Bispo jurisdicional D. Martinho Pires, imediato sucessor de D. Fernando Martins, falecido a 8 de Novembro de 1185 (anos de Cristo) (1).

Nesses tempos medievais, a supradita igreja pagou também ao Estado, no reinado de D. Dinis, por espaço de três anos, uma contribuição suplementar com o nome de taxação eclesiástica para defesa da Pátria. Essa contribuição era a décima parte das rendas eclesiásticas do seu Reino para  / 10 / subsídio da guerra contra os mouros, excepto as igrejas da Ordem de S. João do Hospital (2).

Daí a taxação da igreja de Madaíl em 10 libras, moeda do tempo.

Provas justificativas:

a) Censos da igreja de Madaíl à Sé do Porto:

− Ecclesia. S. Mametis de Madaíl −
Quatuor bracalia. uel xxxvj. solidos,
− Et sunt episcopi siue capitulo −
(3).

b) A mesma igreja pagava mais, de bragais, para o bispo, 4 libras e 8 soldos (4).


III
LEIRA REGUENGA E HOSPITAL, NO LUGAR
DO MEIO, TAMBÉM DE MADAíL

Madaíl possuiu uma leira reguenga e um hospital, como se depreende do velho Foral da Feira que diz:

«Madail − jurati de Madal dixerunt de auditu quod iacebat ibi una leyra de Reguengo que partia com ospitali. / 11 /

Et dominus Rex sancius dederat eam martino de aragon pro uno azore».

E assim:
a) Leira reguenga. − A leira reguenga foi doada por D. Sancho I a Martinho de Aragão por um açôr, ave diurna de rapina, do género falcão.

O açôr era um direito pertencente à Coroa por a dita leira ser do património real.

b) Hospital. − O hospital era para viandantes pobres e doentes que, como é de crer, tivessem deixado a Via Militar Romana para demandarem povoações da beira-mar, com trajecto pelo lugar do Meio, de Madaíl, ou, em sentido inverso.

Nota. Nesses recuados tempos, eram raras as albergarias ou hospitais. Por estes sítios, apenas podemos contar a albergaria ou hospital de Albergaria-a-Velha, mandada fazer por D. Teresa, Mãe de D. Afonso Henriques.

O Ospício, cujo local na povoação ainda conserva o nome, é o remoto passado a preponderar através dos séculos e das gerações.

 

IV
A IGREJA DE MADAÍL − CURATO
DA DE AVANCA

O pároco de Avanca apresentava cura de Madaíl com jurisdição de cura de almas.

A igreja de Madaíl era anexa à de Santa Marinha de Avanca, que era da Comenda da Ordem Militar de Cristo.


V
DESMORONAMENTO DA IGREJA VELHA

A igreja, desde longe, já ameaçava ruínas. O povo de Madaíl teve o cuidado de abandonar a mesma, em virtude do perigo iminente de derrocada em que se encontrava.

Desmoronou-se no ano de 1938, sem esperança da sua reconstrução no mesmo local. / 12 /


CAPÍTULO II
EDIFICAÇÃO DA NOVA IGREJA
EM ESTILO ROMÂNICO (1939-1951)
I

Desmoronada a velha igreja, era urgente e indispensável a construção de outra nova.

O local da velha era insuficiente e já pouco apropriado para a sua reconstrução. Daí a necessidade de procurar terreno, mais vasto e acomodado, para a ambicionada edificação.

O Rev. Pároco Manuel Soares de Albergaria, como bom e sincero amigo do seu povo, inquiriu e encontrou um terreno próximo da igreja desmoronada, que muito bem se ajustava para a construção que se pretendia.

O mesmo pároco, com o desejo de bem servir a sua freguesia, foi incomodar o seu particular amigo, Dr. Aníbal Pereira Peixoto Beleza, em Oliveira de Azeméis, senhor do terreno inquirido, pedindo-lhe a cedência de um mato próximo da igreja derrocada para a construção de outra e do respectivo adro para grande benefício da freguesia.

E o Dr. Beleza, como bom Amigo de Madaíl, ouviu e atendeu o pedido feito pelo pároco, beneficiando Madaíl com o terreno suficiente para a construção da nova igreja e do seu respectivo adro.

II
DESCRIÇÃO CIRCUNSTANCIADA DAS OBRAS

É sempre conveniente a descrição pormenorizada dos trabalhos efectuados nas igrejas e outras obras públicas e, sobretudo, no que respeita à construção e ornato das mesmas obras, com o nome do seu arquitecto.

E assim:

I
DECORAÇÃO EXTERIOR

a) A porta principal da nova igreja é encimada por uma mísula que segura o Orago − S. Mamede, apoiado sobre as cabeças de um casal de leões.

b) Imagem do Orago, que domina a frontaria da igreja: é de granito, e mede de altura três metros e setenta centímetros. / 13 / É majestosa e sobressai por o Cornato arquitectónico do frontispício ostentar, com magnificência, uma rosácea, ou seja, uma vidraça de cores variadas, entre 16 metros de cantaria circundante.

Este trabalho foi feito sob a direcção do arquitecto das obras da igreja, Sr. Rogério de Azevedo, do Porto.

Nota. «O Orago S. Mamede nasceu na cidade de Cesareia, da Capadócia, na Ásia Menor, pelo ano de Cristo de 261. Nesse tempo, era Pontífice S. Félix I, que morreu no cárcere, e Aureliano − o Cruel − Imperador de Roma, que foi assassinado no ano de 275. Foram seus pais Teódoto e Rufina que, pela sua fé e virtudes cristãs, foram encarcerados em Cesareia para sofrerem martírio.

Teódoto morreu na prisão pela sua fé; e Rufina, vendo morrer seu marido, teve um parto prematuro de que morreu, também na prisão, junto do seu marido, para onde tinha ido com ele. A criança, nascida antes do tempo, foi recebida e acarinhada por uma santa matrona, chamada Amia que vivia em Cesareia.

Mamede sofreu muitos tormentos por não adorar os ídolos (deuses do Paganismo).

Mais:

Acerca de S. Mamede-Mártir, diz o P.e JOÃO CROISET, no seu Anno Cristão, 3.º volume,. pág. 327:

«O bemaventurado S. Mamede, ou como outros dizem, S. Mamas, foi natural da Paphlagónia, filho de S. Teódoto e de Santa Rufina, cavalheiros dos principais e da linhagem dos senadores; dos quais faz comemoração o martiriológio romano no dia 31 de Agosto.

«Tinha, naqueles tempos, o ceptro do império romano Aureliano, que suscitou a nona perseguição contra a Igreja.

«Publicados os éditos em Paphlagónia, e sendo Teódoto e Rufina, pais de Mamede, cristãos e grandes servos de Deus, foi S. Teódoto acusado de o ser perante o Governador romano. Preso e conduzido a Cesareia de Capadócia, onde o lançaram em um cárcere, sua digna esposa Santa Rufina, embaraçada de Mamede, quis fazer-lhe companhia. Morreu Teódoto na prisão; Rufina pelas amarguras a que se sujeitou, deu à luz, antes do tempo, a Mamede, e morreu de parto, ficando o filho vivo no meio dos dois cadáveres de seus pais.

«Apareceu então um formoso mancebo (sem dúvida anjo do Senhor) à bemaventurada Santa Amia, senhora nobre e mui principal, ordenando-lhe que fosse pedir ao presidente os corpos dos bemaventurados Teódoto e Rufina, dizendo que acharia vivo entre eles o menino S. Mamede, o qual mandaria criar diligentemente. Assim o fez a excelente senhora; enterrou os corpos dos ditos santos em um seu / 14 / horto, e ao menino criou-o com cuidado e adoptou-o como filho seu.

Aconteceu que um dia, tinha apenas dois anos o menino, foi chamado por Amia, e ele respondeu Mama, querendo por certo dizer mãe, e daqui lhe veio o nome de Mamede, ou Mama. Aos cinco anos pô-lo Amia aos estudos, nos quais fez progressos notáveis.

«Perseguia, por então, Aureliano com grande fúria os cristãos, forçando homens, mulheres e até as crianças a sacrificar aos ídolos, no intuito de os manter, desde os verdes anos, nas superstições do paganismo.

«Mamede, porém, não só não sacrificava, mas persuadia os seus condiscípulos a que também o não fizessem.

Sendo já de idade de quinze anos, morreu Amia, sua mãe adoptiva, e deixou-o herdeiro de seus bens.

«Soube o presidente o que fazia o jovem; mandando-o chamar à sua presença, disse-lhe: «És tu o que não queres adorar os deuses e, não contente com isto, persuades os teus condiscípulos a que o não façam?»

O jovem, com peito varonil, repreendeu-lhe tão louca superstição, e o não dar ao Deus verdadeiro o culto que a ele só pertence.

Quis o tirano forçá-lo a adorar um ídolo contra sua vontade; mas o santo observou-lhe que, tendo ficado herdeiro de Amia, senhora da maior nobreza, não podia, segundo o direito, ser assim tratado»...

E, durante três dias, Mamede esteve em fornalha ardente. Saído incólume da fornalha, retirou-se para o deserto, e lá exerceu a indústria da manteiga e queijo com leite que lhe forneciam as feras que havia domesticado.

Por fim, foi atravessado por um instrumento cortante, que o deixou a esvair sangue e, depois de ter andado umas dezenas de metros, segurando suas vísceras nas mãos, ouviu uma voz do Céu que o chamou. E assim entregou a sua alma a Deus!

Advertência. Na cidade de Lisboa, as matronas lusitanas, quando se lhes seca o leite, recorrem a S. Mamede, e conseguem a abundância que desejam para os seus filhos.

(Mapa de Portugal pelo Padre JOÃO BAPTISTA DE CASTRO. Terceira Parte, pág. 439).

Em bastantes terras de Portugal, depois da amassadura da farinha para fazer o pão, é costume fazer uma cruz com a mão direita sobre a massa, dizendo:

S. Mamede te levede,
S. João te faça pão,
S. Vicente te acrescente,
Nosso Senhor te dê sua Bênção.

/ 15 /   c) Torre anexa à igreja. Tem esta torre na sua frontaria um púlpito em granito muito bem trabalhado e um janeIão para dar luz à escadaria interior, que é uma obra admirável de arte, e a mais original que tenho visto. Do lado poente a torre tem, também, outro púlpito e dois janelões, cuja beleza e finalidade são as mesmas da frontaria. Na frente da torre está assente o relógio, que regula bem. O seu mostrador está em cantaria circulante, e suas horas iluminadas a luz eléctrica e ouvidas por quase todos os moradores da freguesia. É uma grande obra de utilidade pública e muito apreciada por todos. Possui também um sino grande que custou 18 contos, pago por subscrição aberta pelo Pároco.

II
DECORAÇÃO INTERIOR
ALTAR-MOR DA IGREJA

a) Altar-mor com uma tribuna ao centro. Ornamentam este altar, da direita para a esquerda, quatro imagens: São Mamede, Senhora das Dores, São Caetano e São Mateus.

b) 4 janelões: 3 do lado esquerdo, e 1 do lado direito.

c) 2 credências, junto do altar-mor, para as galhetas e mais utensílios para a missa e outros ofícios do culto divino.

d) 2 cadeirais.

e) Comunicação com a sacristia do pároco, onde se guardam as vestimentas sacerdotais, num bom e grande arcaz que o pároco mandou reformar, e as alfaias da igreja.

Na sacristia encontra-se ainda um crucifixo de cerca de 90 cm., de certo valor pela sua antiguidade.

f) 2 púlpitos, ambos com entrada e saída pela Capela-mor, e que servem de cadeira paroquial e de confessionários.

 
II
ARCO-CRUZEIRO E NAVE DA IGREJA

a) Um crucifixo com a imagem de Cristo, de cedro e a cruz de castanho, assentes na frontaria do arco feito de cantaria, em alto relevo. A sua execução é uma maravilha de arte. A imagem, é modelo «Teixeira Lopes», e o crucifixo tem 3 metros de altura.

b) Uma grade com porta de vaivém para vedar ou facilitar a passagem das pessoas para a capela-mpr. / 16 /

Entrando a nave:
a) 3 janelões do lado direito e outros 3 do lado esquerdo para darem luz a toda a igreja e, sobretudo, ao corpo da igreja.

b) 2 portas laterais, uma de cada lado.

c) 26 bancais, 13 de cada lado, que flanqueiam a passagem do centro da nave que segue à capela-mor.

d) 2 altares, um de cada lado, cada um com três janeIões na parede da igreja, fazendo os três janelões parte integrante do respectivo altar. Estes 2 altares foram aproveitados da velha para a nova igreja, onde foram adaptados, como convinha à casa de Deus. / 17 / [Vol. XIX - N.º 73 - 1953]

e) Coro e guarda-vento, obras elegantes, seguras e de merecimento.

f) Instalação da luz eléctrica. A Junta de Freguesia, constituída pelos vogais − Manuel de Oliveira, Firmino Alves de Pinho e Amadeu António, concorreu com a quantia de 2.000$00 para ajuda desta instalação.


III SACRISTIA

A sacristia, com entrada e saída para o adro, comunica com a capela-mor do lado do Evangelho. E espaçosa e aprazível, com muita luz, gosto e arte.

Debaixo da Sacristia fica o salão da catequese com igual grandeza, que comunica com a cripta. / 18 /


IV
CRIPTA

.
a) Uma sala subterrânea, ligada à igreja do lado sul, com as imagens de S. Francisco de Sales, N. Sr.ª do Perpétuo Socorro e do Sagrado Coração de Jesus.

b) A mesma sala comunica com uma outra dependência, também subterrânea e situada em pavimento térreo, debaixo de todo o nível do soalho da igreja.

c) Estas salas devem ser consideradas como verdadeiras dependências da igreja, magnifico templo de Madaíl. / 19 /


CAPÍTULO lII
VISITAS EPISCOPAIS E BÊNÇÃOS SOLENES.
BENEMERÊNCIAS E HOMENAGEM
I
VISITAS EPISCOPAIS E BÊNÇÃOS SOLENES

a) Em 16 de Maio de 1940 foi solenemente benzida a primeira pedra da nova igreja pelo Reverendíssimo Bispo D. António de Castro Meireles, de saudosa memória, e que, na ocasião, proferiu um eloquente improviso que infundiu admiração ao numeroso auditório, e foi uma honra para o pároco e povo de Madaíl, em quem deixou as melhores impressões.

b) Em 20 de Setembro de 1942, foi a mesma igreja benzida também solenemente pelo Rev. pároco, tendo assistido ao religioso acto os Reverendos − Vigário da Vara do Distrito Eclesiástico de Oliveira de Azeméis, Mário Ferreira e Manuel Soares de Albergaria, sobrinho do pároco da freguesia.

/ 20 / A seguir à bênção, fez-se a mudança do Santíssimo Sacramento, da velha para a nova igreja, tendo acompanhado as irmandades, Cruzada Eucarística e muito povo; depois da bênção, ficou encerrado no Sacrário.

No dia seguinte, 21, foi ministrada a Comunhão solene das crianças, fazendo a prática D. Manuel Ferreira da Silva, Bispo de Curza.

c) Em Dezembro de 1944, foi dada por terminada a obra da igreja e, a seguir, assinado o Auto de Posse pelo Ex.mo Engenheiro chefe Alberto Manuel Arala Chaves e o pároco Manuel Soares de Albergaria, como representante da Corporação Fabriqueira desta freguesia de Madaíl. / 21 /

II
INAUGURAÇÃO DA NOVA IGREJA

a) Em 19 de Agosto de 1951, foi inaugurada, com brilho e esplendor, a nova igreja, tendo assistido o Rev.mo Bispo da diocese D. Agostinho de Jesus Sousa, pessoas da freguesia e outras de representação social.

b) Antes da solenidade da inauguração, houve uma pregação de nove dias, feita pelo Rev. Manuel de Almeida, Cónego e Deão da Sé de Lamego.

lII
BENEMERÊNCIAS DE AMOR CRISTÃO

a) O povo de Madaíl é grande, apesar de Madaíl ser terra pequena e pobre.

b) O povo de Madaíl, crente em Deus, é trabalhador, activo e honesto, amigo do seu lar abençoado e de paz, que ele considera como uma pequena Igreja.

E o seu respeitável pároco, Manuel Soares de Albergaria, não se cansou de estimular o seu povo para o bom nome de Madaíl, solo abençoado, que se prestigiou com a beneficiação devida à fecunda actividade do seu pároco!

c) Os filhos de Madaíl, que vivem no Brasil, são convidados a serem beneméritos das obras da nova Igreja, vindo em auxílio e cooperação da sua terra Mãe.

Segue a cópia da circular enviada:

«Caros conterrâneos e Amigos Madailenses: Encontra-se em ruínas a nossa Igreja de S. Mamede de Madaíl, templo santo e sagrado que os nossos antepassados construíram com a mais acrisolada fé cristã e católica e que, tantos e tantos anos, recolheu os seus votos e orações, e que eles nos legaram como penhor perene e sagrado das suas mais ricas e arreigadas tradições de filhos de Deus e da Igreja Católica, confiando à nossa guarda esta herança que, embora nossa, pertence também aos nossos filhos e seus vindouros, a quem, por gratidão, somos forçados a legar e a entregar.

De lá se retirou já o seu Altar-mor para o salvaguardar da iminente catástrofe que ameaçava soterrá-lo e destruí-lo na derrocada do velho edifício de S. Mamede e S. Mateus, e por quem nossos Pais tinham a máxima veneração, a quem sempre recorriam nas suas aflições. / 22 /

Com grande mágoa e tristeza vimos sair daí o Santíssimo para um dos seus altares laterais, onde continuará até que reedifiquemos a sua Capela-Mor que não ficará bem sem novo corpo da Igreja, não só porque se encontra também em péssimo estado de segurança, mas porque o aumento desta população que se vem acentuando, dia a dia, nos obriga a uma Igreja maior e mais espaçosa. É para a nova Igreja de Madaíl, terra vossa e nossa, a mais querida e amada, e de que já se traçou o seu plano, e que brevemente vai principiar, que nós, abaixo assinados, em nome de toda a freguesia, vimos impetrar o vosso auxílio e a vossa cooperação para assim não deixarmos desaparecer a casa das nossas orações, e podermos, como, até aqui, continuar a usufruir o nome de Madailenses, herança por todos os títulos honrosa, e que devemos conservar e entregar a nossos filhos.

Avante, pois, por Madaíl!
Por sua nova Igreja!
Pelo seu engrandecimento!

A COMISSÃO:
O pároco − Manoel Soares de Albergaria
Manoel de Oliveira Firmino Alves de Pinho
Manoel de Azevedo
Manoel Fernandes Correia Abel da Silva Reis
Manoel Alves de Pinho.

 

IV
MAIS BENEMERÊNCIAS DO PÁROCO
A SUA FREGUESIA DE MADAÍL

a) Adro em volta da Igreja, seu arranjo e vedação. Planeou 2 lotes de terreno que mandou murar e capear a cantaria, e plantar bastantes tanchões ou estacas de oliveira, postas segundo as regras da agricultura.

b) Em redor avistam-se campos espaçosos e férteis que o circundam, apresentando um quadro deslumbrante com as lindas aldeias dos seus arrabaldes.

c) Instalações sanitárias junto do muro do Adro, mas fora dele, para despejos, com portas no mesmo muro de vedação. / 23 /

d) Passal e residência. Com a derrocada da velha Igreja, ficou abandonado e devassado o terreno ocupado pela mesma e seu Adro. Nesta conjuntura o Rev. Pároco mandou vedar o supradito terreno e juntamente o Adro, com muro e rede, fazer ramadas a arame e eucaliptos, e plantar oliveiras.

e) Mandou soalhar e sanear a casa da residência, serviço de reconhecida necessidade e utilidade, tendo assim ficado mais confortável para si e seus sucessores.

/) Mandou fazer um lagar e comprar uma prensa para lagaragem do vinho do passaI.

Mais:

g) Uma cruz de metal para o Sagrado Coração de Jesus acompanhar os funerais e procissões religiosas.

h) Insígnias da Cruzada Eucarística, e uma bandeira bordada a oiro.

i) E opas de seda para a Irmandade do Santíssimo Sacramento.

I
OUTROS BENFEITORES DA IGREJA.

a) Do Paço Episcopal (esmolas da Bula da Cruzada): uma estola; uma bolsa de corporais branca com o corporal; uma casula preta e prateada, e bolsa de corporais também preta e prateada, manustérgios e sanguinhos, e um véu de ombros, branco.


V
A ACÇÃO DO PÁROCO DE MADAÍL
A BENEFÍCIO DA SUA FREGUESIA

a) O povo de Madaíl é merecedor de aplausos e parabéns por ter a felicidade de continuar pároco na sua freguesia o Rev. Manuel Soares de Albergaria, grande amigo da terra.

Não se tem poupado a sacrifícios para melhorar e valorizar a freguesia. Também não tem sido tímido e covarde em defender a honra do seu bom povo que muito o estima.

b) A sua grande actividade e decisão se deve a construção da nova Igreja, serviço relevante que, de principio, sempre acompanhou nos seus projectos e obras, com uma vontade resoluta e bem dirigida para um fim conveniente e de interesse para Madaíl. / 24 /

c) Concluída a obra da igreja, que atraiu ao pároco as simpatias do seu povo, cuidou logo o pároco em satisfazer outra necessidade para honra e utilidade da freguesia: melhorar o passal e casa da residência paroquial, o que já fez, como fica dito neste trabalho, com brio, dignidade e perfeição.

d) O pároco só tem mostrado, com a acção da sua vontade, o sentimento de amor para com a sua, igreja, deixando assim, aos vivos e vindouros, uma lição e um exemplo vivo a imitar.
/ 25 /

Assim o testemunham as obras da nova igreja e outros trabalhos, que ele incitou, promoveu e orientou, e, daí o ser homenageado pelo povo com louvor e gratidão.


VI
HOMENAGEM DE GRATIDÃO

Lembrança dos Madailenses pela acção benemérita do seu pároco, lavrada em letras douradas por baixo da Mísula da porta principal que sustenta S. Mamede.

Uma lápide evocativa com a inscrição seguinte:

«Ao Benemérito Fundador desta Igreja de Madail Rev.mo Sr. Padre Manoel S. Albergaria.
      Homenagem de gratidão (1943).»

Na ocasião, o Rev. Manuel Soares dos Reis, de Madaíl proferiu a seguinte alocução:

Senhor Abade:

Como filho desta terra, eu quero, neste momento, em nome do povo de Madaíl, apresentar a V. Rev.ª o preito do nosso reconhecimento pelos sacrifícios inúmeros que esta obra (nova igreja) lhe custou. Ela foi para V. Rev.ª um longo martírio de trabalhos, arrelias, desgostos, numa palavra, sacrifícios de toda a espécie, mas agora, realizada ela, é incontestavelmente, a sua glória. Eu sei que o Senhor Abade lhe tem amor e muito amor. Nem podia deixar de ser assim. Digne-se, pois, aceitar esta pequenina homenagem de gratidão que, na nossa pobreza, lhe ofertamos. É pequenina e singela, mas tem a acompanhá-la os sentimentos dos nossos corações agradecidos. E por ventura as gerações vindouras saberão apreciar, melhor do que nós, o heroísmo de V. Rev.ª que tanto amor devotou à construção desta obra.
Ao Senhor Abade, benemérito fundador desta igreja, o nosso profundo e eterno reconhecimento. (V. "A Opinião", semanário de Oliveira de Azeméis, de 2 de Outubro de 1943).
/ 26 /


CAPÍTULO IV
BENEMÉRITOS DA IGREJA
E DA INSTRUÇÃO EM MADAÍL.
CEMITÉRIO E ESCOLA

I
CEMITÉRIO

a) Joaquim Moreira Júnior, casado com D. Urraca Augusta Dourado Moreira, mandou construir o cemitério / 27 / próximo da igreja velha e, também nele, um Cruzeiro em estilo renascença.

Faleceu em Oliveira de Azeméis, no dia 1 de Abril de 1900, com a idade de 49 anos, tendo sido ali sepultado em jazigo de família.


II
ESCOLA

a) D. Urraca Augusta Dourado Moreira, conforme a vontade do seu falecido marido, mandou construir a Escola Primária Oficial de Madaíl que, a seguir, ofereceu ao Estado. / 28 /

Foi construída em 1908, e está instalada em edifício próprio.

b) A mesma viúva forneceu à Escola quase todo o material didáctico e mobiliário escolar, algum do qual ainda se encontra em uso.

A escola é mista.

Pelas suas benemerências a fim da instrução, foi homenageada a dita senhora D. Urraca na referida Escola, publicamente, em festa própria, no dia 31 de Julho de 1909.

Faleceu em Lisboa e lá foi sepultada.

Antes da construção da Escola, não havia edifício escolar na freguesia. Quem desejasse frequentar os estudos primários, tinha de ir à Escola de S. Martinho da Gandra, distanciada uns três quilómetros.

c) O prédio da nova Escola é um dos melhores e mais belos do concelho e até do distrito. Tem residência para a professora, e fica situado à beira da estrada Oliveira de Azeméis − Ovar.

d) Foi sua primeira professora D. Elisa de Castro e Costa, que ali se manteve de 1909 até 1911. Sucedeu-lhe, no lugar, D. Ester José Ferreira Lebre até fins daquele ano, ou princípios do seguinte, em que foi substituída por D. Albina Júlia Pinto de Avelar que ali exerceu o seu cargo até 1938. / 29 /

Depois destas, ali leccionaram, como professoras agregadas, D. Leonor Pereira de Oliveira, de 1937 até 1943, e D. Maria Matilde Rodrigues de Sousa, de 1943 − até Julho do ano seguinte. Desde o dia 1 de Outubro de 1944, a Escola tem D. Maria Emília de Castro como sua professora efectiva.

A Escola tem na sua frontaria a seguinte inscrição:

«ESCOLA JOAQUIM MOREIRA»

III
MOVIMENTO DA ESCOLA

A Escola de Madaíl, para o tamanho da freguesia, tem um movimento escolar relativamente grande.

Senão, vejamos:

É frequentada por 46 crianças, sendo 24 do sexo masculino e 22 do feminino.


CAPÍTULO V
VIDA HABITUAL DO POVO DE MADAÍL.

MELHORAMENTOS

I
VIDA HABITUAL DO POVO DE MADAÍL

a) Madaíl, terra antiga, está situada a 3 quilómetros de Oliveira de Azeméis. É freguesia pequena e pobre, como já se advertiu.

O seu terreno, verdejante e pitoresco, presta-se para a cultura de todos os géneros agrícolas.

b) Assenta em terreno elevado e próximo da margem direita do Rio Ul, afluente da margem direita do Rio Antuã.

Seu clima é temperado, e o seu solo produz milho, centeio, legumes, vinho verde e frutas. Tem estrada de macadame e bela posição topográfica. O povo é crente em Deus, laborioso, amigo da sua Igreja, da sua amada terra e do seu Rev. Pároco.

c) A maioria do povo cultiva, com a enxada, a terra de que vive para usufruir alimentos necessários à sua vida de trabalho activo e honesto.

d) A outra parte do povo, no aproveitamento de algumas economias para as suas maiores necessidades, costuma ser reforçada com os escassos recursos da sua indústria / 30 / caseira que consiste em manufacturar: ancinhos, cabos de enxada e de machados, cadeiras e cadeirinhas de pinho e canastras que vende nas feiras da região.

O rendimento proveniente desta indústria, e de outras da terra, que cultiva com o suor amargo do seu rosto, são os recursos principais da sua subsistência familiar.

II
MELHORAMENTOS

Madaíl não possui estação telégrafo-postal. Para o seu serviço público e particular, tem caixas postais em dois lugares: Residência e Meio.

a) O correio da Residência, de que é encarregado Inácio de Bastos, data de 1951. Na mesma casa há uma «Cabine Pública Telefónica» com o n.º 193, que funciona desde 7 de Janeiro de 1952. Esta cabine é reputada no valor de 3.000$00, e foi oferecida pelo Pároco, entrando ainda o mesmo Pároco com 250$00, depósito que o «Regulamento dos Correios» exige antes da sua montagem.

b) O correio do lugar do Meio. É seu encarregado Domingos Vaz Soares.

Mercearias:

a) Carlos da Silva Torres, no lugar do Souto
b) Inácio de Bastos, no lugar da Residência
e) Manuel Ventura, no lugar do Rego e
d) Domingos Vaz Soares, no lugar do Meio.

III
MOVIMENTO RELIGIOSO NA FREGUESIA DE MADAÍL

Em Madaíl, como em outras freguesias, há o Registo paroquial e o mapa para os extractos.

Os assentos, tanto de baptizados e casamentos, como de óbitos, são lançados em livros próprios que têm os termos de abertura e encerramento pelos Vigários da Vara dos respectivos distritos eclesiásticos.

E assim, no movimento religioso de Madaíl:

a) em baptizados − uma média de 10.
b) em casamentos − uma média de 5.
e) em óbitos − uma média de 6.

/ 31 /

CAPÍTULO VI
DA DISTRIBUIÇÃO DE PODERES
COM SUBORDINAÇÃO D_ AUTORIDADE

I
NO ECLESIÁSTICO

a) Pertenceu Madaíl à comarca eclesiástica da Feira que teve dois Vigários da Vara.

Actualmente é da comarca eclesiástica de Oliveira de Azeméis.

O concelho de Oliveira de Azeméis, no cível, foi criado por Decreto de 5 de Janeiro de 1799, e a ele pertence, hoje, Madaíl.

b) Pertenceu Madaíl ao Bispado de Coimbra, a que esteve subordinada, no tempo decorrido entre o martírio do Bispo D. Sisenando (alanceado quando dizia Missa) e a vinda de D. Hugo para Bispo do Porto. Nesse tempo, já recuado, foi a Diocese do Porto dividida pelos dois bispos comarcãos − o de Braga e o de Coimbra, servindo de linha divisória o Rio Douro. Esta Diocese do Porto foi restaurada pelos seus antigos limites, no tempo do Pontífice Pascoal lI, em 1115, e no tempo do Pontífice Calisto lI, em 1120. Vigorou a Bula de Calixto lI.

Nota. A diocese do Porto esteve sem Bispo 165 anos, pelo martírio de D. Sisenando (5).

II
NA POLÍTICA

a) Madaíl, pertenceu, de princípio, à Comarca da Feira e, a seguir, ao antigo concelho da Bemposta. Isto consta do Registo das cidades, vilas e lugares que há em a Comarca da Estremadura, feito por ordem do rei D. João III, em 1527.

b) O concelho da Bemposta foi extinto por Decreto de 24 de Setembro de 1855. Desde então passou Madaíl para o concelho de Oliveira de Azeméis, criado por Decreto de 5 de Janeiro de 1799, como se advertiu. / 32 /


lII
MADAÍL NA ESTATÍSTICA POPULACIONAL

 
Em 1623

 . . . . . . . . . . . . . . . . . .

98 almas (6)
Em 1789  . . . . . . . . . . . . . . . . . . 339 almas (7)
Em 1864  . . . . . . . . . . . . . . . . . . 342 almas
Em 1878  . . . . . . . . . . . . . . . . . . 373 almas (8)
Em 1900  . . . . . . . . . . . . . . . . . . 417 almas
Em 1952  . . . . . . . . . . . . . . . . . . 580 almas (9)
 

ÚLTIMO CAPÍTULO
NÓTULAS FINAIS SOBRE A IDEIA,
A ACTIVIDADE E AS VERBAS DISPENDIDAS
NA EDIFICAÇÃO DA NOVA IGREJA DE MADAÍL

Resumindo: Em Fevereiro de 1936 entrou na pequenina, aldeia de Madaíl o Padre Manuel Soares de Albergaria, que ainda hoje se conserva a pastoreá-la. Desde a primeira hora, esse activo sacerdote viu a necessidade − que ainda nenhum outro tinha visto − da construção de um Templo que substituísse o antigo, que há muito ameaçava ruína e apresentava perigo para os fiéis assistentes aos actos do Culto.

O Sr. Padre Albergaria pensou nisso, e, se bem o pensou, melhor o realizou. Mas não o fez sem sacrifícios e empecilhos de toda a ordem. Muitas noites mal dormidas a pensar na melhor maneira de levar a cabo o seu intento; dezenas de viagens a Lisboa, ao Porto e a outras localidades, em constante vaivém de mendigo peregrino; extraordinário esforço intelectual e físico, trabalhando com os operários e auxiliando-os em tudo; enfim, todo a sorte de contrariedades que hoje estão demovidas à custa duma luta titânica contra os múltiplos afazeres em obra de tal vulto.

O maior obstáculo, como é de admitir, esteve sempre no capítulo financeiro. Um povo tão pequeno e tão pobre, como o de Madaíl, não podia arcar com as consequências de semelhante empreendimento, e, assim, o trabalho do pároco foi multiplicado, alargando-se por outros povoados na obtenção de subsídios e oferendas para leilões. Mas quem poderia / 33 / [Vol. XIX - N.º 73 - 1953] contar só com o magro produto dos leilões para um edifício que havia de custar, como custou, a monumental verba de 734.603$00? Todos ajudaram, é claro, conforme as suas posses. O terreno para a construção, foi dado pelo Dr. Aníbal Beleza, já falecido; − e o Estado comparticipou, por várias vezes, com um total de 219.966$00. deduzidos 23.106$00 de fiscalização. De onde veio o resto? De toda a parte. O Padre Albergaria pediu como um cego, incomodou tudo e todos e, após uns anos de tormenta, pode orgulhar-se e rever-se, sossegado, na sua obra cristã.

Os madaílenses devem estimá-lo e venerá-lo, como o mais alto obreiro do seu progresso, como amigo e como homem de grande valor e dedicação pelas causas justas − tão abnegadamente devotado à causa da consolidação espiritual dos seus paroquianos. E só assim − porque ele a mais não aspira − consegue pagar essa enorme dívida, dívida contraída com suor e sangue, e a golpes de energia e tenacidade.

O único templo que existia em Madaíl − paróquia com apenas 115 fogos e 580 almas − era a sua Igreja Matriz, que, segundo velhos escritos, datava do século XII, estando em 1938 a desmoronar-se.

Nesse mesmo ano pensou o pároco − em vez de aplicar o produto de alguns leilões no remendar inútil do velho templo − na edificação duma Igreja Nova. Assim, apresentou / 34 / um projecto do Engenheiro Corte-Real no Ministério das Obras Públicas, que foi rejeitado pelo malogrado Ministro Engenheiro Duarte Pacheco, que mandou elaborar um novo projecto pelo seu pessoal técnico. O encarregado desse trabalho, arquitecto Rogério de Azevedo, apresentou em 6 de Maio de 1939 o segundo projecto com o orçamento de 3593°0800, que foi aprovado e com participado pelo Estado com a verba de 112 contos. Porque o terreno da velha Igreja era insuficiente para a nova construção, apesar de ali se terem gasto bastantes milhares de escudos, conseguiu-se, como já se disse, que o Dr. Aníbal Beleza, a pedido do pároco, oferecesse o terreno para a nova Igreja, cuja primeira pedra foi lançada e benzida pelo Bispo do Porto, Sr. D. António Augusto de Castro Meireles, em 16 de Maio de 1940.

A execução do projecto demorou apenas 28 meses, e, assim, em 20 de Setembro de 1942, o Rev. Abade de Madail, assistido pelo Rev.º Vigário da Vara, Padre Joaquim Ferreira Salgueiro, e pelos Reverendos Manuel Soares de Albergaria (Sobrinho) e Mário Ferreira, procedeu à bênção da nova Igreja, acto que foi presenciado por enorme concorrência de povo. Na obra foram gastos 235.800$00 em materiais, e 144.630$00 em mão de obra, o que perfaz um total de 380.430$00. Apesar do subsídio do Estado, do concurso do povo da freguesia e das freguesias vizinhas em trabalhos, materiais e dinheiro, essa obra terminou com um «deficit» de 16.209$00, que aos poucos se foi saldando, não sem dificuldades.

Mas a obra, embora admirada e elogiada por todos que a viam, não estava concluída, e ainda faltava fazer muito, que os madailenses consideravam impossível.

Em 1943 foi elaborado um novo projecto de obras mais urgentes: arranjo do Adro e vedações, muro de suporte, capeado a cantaria, retretes, painéis de granito, aterros e desaterros, etc. − traçado pelo autor do projecto da Igreja, que teve por ajudante o arquitecto Sr. Januário Godinho.

Estas obras foram orçadas em 139.510$00 e o Estado comparticipou-as com 55.804$00. Foram dadas por concluídas em Dezembro de 1944, tendo sido o auto de entrega assinado pelo Engenheiro Sr. Arala Chaves e pelo Padre Manuel Soares de Albergaria, como presidente da Corporação Fabriqueira.

Faltaram ainda as obras concernentes ao interior do Templo. Novo projecto foi feito pelo arquitecto Pereira Leite, para: − arranjo do altar-mor, cadeiras, púlpitos, gradeamento no arco cruzeiro e dois nichos, um para cada lado do altar-mor, guarda-vento e bancadas, tudo em madeira de castanho encerado, obras computadas em 55.650$00. O Estado subsidiou também com 24.316$00 estes trabalhos que ficaram / 35 / concluídos em 21 de Maio de 1948, tendo-se gasto a quantia prevista e ainda mais 11.595$00.

Outras obras se fizeram desde 1938 a 1948, que custaram milhares de escudos, sempre sob a hábil direcção e providencial impulso do respectivo pároco, nos terrenos da nova e da velha Igreja, com plantação de árvores, arranjos e vedações de terrenos que estavam devassados, electrificação da nova Igreja, para a qual a Junta de Freguesia, composta dos Srs. Manuel Oliveira, Firmino Alves de Pinho e Amadeu António, contribuiu com 2 contos, tendo a despesa sido de 3.500$00.

A certa altura começou o tortulho a apodrecer assustadoramente o pavimento da Igreja e seu rodapé. Tentou-se e conseguiu-se debelar o mal com um novo projecto de obras para substituição do madeiramento por mosaico.

Neste projecto, elaborado pelos arquitectos Aristeu Ravásio Gonçalves e Rogério de Azevedo, foram incluídos outros melhoramentos necessários como: − um relógio para a torre; uma imagem de S. Mamede, padroeiro da freguesia, em granito, com 3,m70 de altura, que foi colocada no exterior sobre a porta principal da Igreja; uma imagem de Cristo Crucificado, com 3 metros de altura e colocada sobre o arco-cruzeiro; um salão paroquial, cripta, etc.

Para este último projecto de obras, que custaram 162.340$00, concedeu o Estado a verba de 50.640$00, Foram dados como prontos estes trabalhos, e inaugurados em 19 de Agosto de 1951, com a presença de S. Ex.ª Rev.ma o Senhor D. Agostinho de Jesus e Sousa, de saudosa memória, que a esta freguesia veio em visita pastoral, a última da sua vida. Nesse acto estiveram também presentes: S. Ex.ª Rev.ma Manuel de Almeida, Cónego e Deão da Sé de Lamego, que, em Madaíl, esteve a fazer uma pregação de nove dias, o Rev. Padre Mário Augusto de Almeida, secretário do Senhor Bispo, o Rev.º Padre Joaquim Ferreira Salgueiro, Vigário da Vara, e os Srs. Abades de UI e S. Tiago de Riba UI, e também o Rev.º Manuel Soares dos Reis, filho de Madaíl, e ilustre Vigário da Vara da Vila da Feira, onde é Pároco.

A freguesia de Madaíl que, como já se disse, é pequenina e pobre, realizou uma admirável obra, graças ao trabalho e perseverança dos seus habitantes, à sua necessidade de ter uma Igreja condigna, à ajuda dos povos vizinhos, ao auxílio do Estado e, sobretudo, à orientação, esforço e sacrifício do seu Pároco, que dá graças a Deus por tudo o que conseguiu fazer.

Felizmente, todas as dívidas se encontram pagas, existindo apenas uma, bastante volumosa, ao Pároco, mas que este desde já considera saldada. / 36 /

No dia 26 de Setembro de 1943, o povo de Madaíl, grato ao seu incansável pastor, promoveu-lhe uma homenagem em que foi descerrada uma placa com os seguintes dizeres:

 

Ao benemérito fundador desta Igreja de Madaíl − Rev.mo Sr. Padre Manuel S. Albergaria − Homenagem de gratidão. − 1943.

 

A esse solene acto, assistiu o director do jornal «A Opinião», grande propagandista das obras da Igreja.

Na ocasião efectuou-se na Igreja uma festa constando de comunhão geral, missa solene, cantada por um grupo de senhoras da terra, sermão pelo Rev. Padre Salgueiro, e a que assistiram as crianças da Cruzada Eucarística com suas bandeiras e insígnias, a Irmandade do Santíssimo Sacramento e Associação do Sagrado Coração de Jesus com suas opas, fitas e cruzes.

Na homenagem ao pároco, o Rev. Padre Manuel Soares dos Reis, devotado madailense e actual pároco da Vila da Feira, proferiu o discurso que segue:

«Duas breves palavras para recordar o significado da cerimónia que vai realizar-se.

A homenagem que, hoje, prestamos ao Sr. Abade não é apenas um dever de gratidão pelo muito e muito que lhe devemos. Eu devo afirmar-vos que, muito mais do que isso, ela constitui para nós um dever de Justiça, uma dívida imensa que nunca poderemos satisfazer plenamente. Diante desta obra para a qual, meus senhores, todos vós concorrestes com os vossos sacrifícios, com os vossos suores e trabalhos, é justo, verdadeiramente justo reconhecer que ela se deve principalmente aos sacrifícios, à abnegação, ao heroísmo do nosso Pároco.

Remontemos alguns anos atrás na história da nossa terra. Tínhamos aquela igrejinha velha, pequenina e pobre, que os nossos antepassados nos legaram sabe Deus com quantos sacrifícios. Todos nós reconhecíamos a sua pequenez, a sua insuficiência para os actos de culto colectivo. Demais, as suas paredes carcomidas pelo rodar de alguns séculos, advertiam-nos de que já tinham cumprido a sua missão, e que necessitavam portanto de substituição ou reparo. Uma igreja nova, airosa e ampla, eis uma ideia fagueira que se desenhava no nosso espírito. Mas como? Era lá possível fazer uma igreja nova numa terra tão pequena e tão pobre? Não, era impossível, e não se pensava a sério nisso!

Entretanto o Sr. Padre Albergaria vem para Madaíl. O seu coração de pastor confrange-se com a nossa pobreza. Sente profundamente a necessidade de remediar / 37 / esta situação angustiosa. É que ninguém melhor que o pastor sente as necessidades do seu rebanho. Depois de inúmeras reflexões, o Sr. Abade concebe o plano grandioso, magnífico, duma igreja nova. Seria preciso sacrificar-lhe tudo. Não importa. A obra era de Deus. E o Sr. Abade tudo sacrificou a esta obra. Sacrificou-lhe as suas comodidades e sossego que trocou por trabalhos, preocupações e muitos desgostos. Sacrificou-lhe os seus amigos, aos quais recorria sempre que fosse necessário. Sacrificou-lhe a sua bolsa que, tantas vezes, se viu forçado a abrir para ocorrer a várias despesas, embora com poucas ou nenhumas esperanças de reembolsar quantias dispendidas. Sacrificou-lhe até a sua saúde e a sua vida: tantas preocupações e canseiras envelheceram-no um pouco. Mas é escusado gastar tempo a lembrar-vos estas coisas, porque elas são assaz conhecidas de todos!

Agora, meus senhores, que usufruímos os benefícios desta obra que nos custou imenso, mas que também é o mais legítimo título de nobre orgulho e brio dum povo; agora que podemos reunir-nos à vontade para elevarmos a Deus as nossas preces neste belo templo, é justo que prestemos uma pequenina homenagem de gratidão àquele a quem, primariamente e antes de mais ninguém, devemos este grande melhoramento. Teve-se a ideia de colocar aqui uma lápide para recordar às gerações vindouras o nome do Sr. Padre Albergaria, benemérito fundador desta Igreja. A esta pequenina homenagem, que vai realizar-se, eu convido todos os presentes a associarem-se com o maior entusiasmo e com os mais nobres sentimentos de gratidão para com aquele que tantos sacrifícios fez por nós, e que merecia imensamente mais!

Senhor Abade: − Como filho desta terra, eu quero neste momento, em nome do povo de Madaíl, apresentar a V. Rev.ma o preito do nosso reconhecimento pelos sacrifícios inúmeros que esta obra lhe custou. Ela foi para V. Rev.ª um longo martírio de trabalhos, arrelias, desgostos, numa palavra, sacrifícios de toda a espécie; mas agora, realizada ela, é incontestavelmente a sua glória. Eu sei que o Senhor Abade lhe tem amor e muito amor. Nem podia deixar de ser assim. Digne-se, pois, aceitar esta pequenina homenagem de gratidão que, na nossa pobreza, lhe ofertamos. É pequenina e singela, mas tem a acompanhá-la os sentimentos dos nossos corações agradecidos. E porventura as gerações vindouras saberão apreciar, melhor do que nós, o heroísmo de V. Rev.ª que com tanto amor se devotou à construção desta obra. / 38 /

Ao Sr. Abade, benemérito fundador desta Igreja, o o nosso profundo e eterno reconhecimento.

*

A menina Açucena Alves de Pinho recitou também a seguinte saudação:

«HOSSANAS E PALMAS»

Senhor! Um novo templo foi erguido
para honra e glória do Teu nome;
que estas paredes de granito bem polido
sejam o testemunho eloquente,
o brado enternecido
daquele amor do Céu que nos consome.

Senhor! Um novo templo foi erguido.

Esta casa de Deus
que é nossa, que é da nossa terra,
é um cântico de amor,
é um preito de gratidão ao Senhor,
é afinal
uma oração de pedra.


Oração de pedra! . . .

Igreja da nossa aldeia
linda, pequena,
calma, serena,
poema vivo escrito em letras de oiro,

Igreja da nossa aldeia
erguida para o alto a apontar o Céu! . . .

Ergueu-a com carinho
e com jeito
este incêndio de amor que nos abrasa o peito.

Porém o obreiro infatigável,
que suou
e trabalhou
como ninguém:

O grande obreiro
que nesta obra
com serenidade, com calma,
pôs todo o vigor da sua alma;
o grande obreiro
que trabalhou com coragem,
com ardor,
foi, bem o sabemos, o nosso querido
e muito amado pastor.

/ 39 /

Senhor Abade:
Nossa aldeia pequenina,
Catedral de orações,
vai cantando a ladainha
de suas palpitações.

Neste momento solene,
queremos exprimir
o sentimento perene
de gratidão
que vive dentro de nós.

Hossanas, vivas e palmas
ao pastor das nossas almas.»

P.e ALEXANDRINO BROCHADO


E o Rev.º Vigário da Vara, Padre Joaquim Ferreira Salgueiro, pronunciou um magnífico discurso de exaltação à vontade férrea do Rev.º Manuel Soares de Albergaria. Este,
/ 40 / comovido quase até às lágrimas, agradeceu a manifestação que culminara em verdadeira apoteose.

*

Eis, em síntese, apresentados todos os pormenores, desde o prólogo ao epílogo, da maior obra que jamais se realizou intramuros de Madaíl.

Só resta pedir a Deus a graça de consentir que todos os seus benfeitores possam admirar por muitos anos, com prazer e alegria, o fruto da sua dedicação e do seu amor pela causa da SANTA IGREJA!

P.e JOÃO DOMINGOS AREDE

_________________________________________

(1) II Parte do Catálogo dos Bispos do Porto, págs. 49 e 50. Censual do Cabido da Sé do Porto, pág. 494.

(2) Hist. da Igreja em Portugal. Tomo segundo, pág. 616. 

(3) − Censual do Cabido da Sé do Porto, pág. 547.

(4) lbidem, pág. 557. 

(5)Descrição da cidade do Porto, a pág. 65, pelo Doutor AGOSTINHO REBELO DA COSTA, no ano de 1789.  

(6)Catálogo dos Bispos do Porto (II parte), pág. 387.

(7)Descrição da cidade do Porto, pág. 139.

(8)Anais do Município de Oliveira de Azeméis, pág. 156.  

(9) Livro do Registo Paroquial do Ano de 1952.

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