A. G. da Rocha Madahil, Estudantes miguelistas do liceu de Aveiro há setenta e tal anos, Vol. VIII, pp. 226-229.

ESTUDANTES MIGUELISTAS

DO LICEU DE AVEIRO,

DE HÁ SETENTA E TAL ANOS

DUMA pequena pasta de velhos papeis impressos aveirenses (programas de festas e de regatas, prospectos de eleições, proclamações políticas do Governo Civil e da Câmara, poesias, recortes de jornais, etc.) que amorosamente conservo tal como a recebi de quem todos esses acontecimentos viveu e com eles vibrou, acompanhando a vida da cidade, berço de nossos maiores, extraio para o Arquivo uma curiosa folha avulsa, datada de 3 de Abril de 1870, e assinada por sessenta nomes, que previamente se declaram «alumnos do Lyceu Nacional de Aveiro».

É uma saudação dirigida a D. Miguel de Bragança, filho de D. Miguel I, que então contaria doze anos apenas, a propósito do 39.º aniversário de sua Mãe, D. Adelaide Sofia(1).

Falecido D. Miguel I em 1866 (14 de Novembro), era a seu filho, Miguel também(2), que os estudantes legitimistas de Aveiro se dirigiam, saudando-o como a única pessoa que, no dizer da mocidade académica, signatária, podia «salvar Portugal do abysmo em que estava prestes a cair».

Apesar do arrojo e do calor das afirmações, a saudação talvez não valha mais do que qualquer outra saudação ou manifestação académica, produto, as mais das vezes, de exaltação de momento, do natural inconformismo académico de todos os tempos, e até, não raro, consequência de especulação política de encobertos agentes instigadores. Uma vez ou outra, no entanto, sinceridade juvenil, nobre e espontânea. / 227 /

A tudo isso tem assistido quem pelos bancos das escolas passou, e a ninguém, de resto, o caso surpreende. Ontem, como hoje.

Como, porém, no caso presente se tratava de definir uma posição de responsabilidade política, de certa transcendência, visto entrar em jogo a melindrosa questão dinástica, natural é que os entusiastas e corajosos académicos o não fizessem sem conhecimento das famílias respectivas.

E assim, as sessenta assinaturas da folha avulsa dar-nos-iam a conhecer outras tantas famílias legitimistas da época, a maior parte das quais de Aveiro ou da região, o que não é inteiramente destituído de interesse histórico. Por esta razão − se porventura o é − e pela curiosidade do impresso, que deve ser de primeira raridade, se arquiva neste nosso repositório, absolutamente eclético, de notícias de todos os tempos.

Aos nossos leitores deixamos a identificação dos signatários e seus actuais representantes, o que para nós, afastados de Aveiro há muitos anos, apresentaria hoje por vezes certa dificuldade; quer-nos porém parecer − e isso não nos surpreende absolutamente nada − que nenhum dos moços legitimistas de 1870, pelo menos os que ainda pudemos conhecer − e alguns foram eles − se manteve fiel, na vida prática, à ideologia política tão calorosamente enunciada e enaltecida na folha impressa que a seguir fielmente transcrevemos.

Não é impossível que exista ainda, felizmente, algum dos signatários de 1870; o destinatário é que não pertence já ao número dos vivos: representa-o hoje, como é sabido, seu filho D. DUARTE NUNO Fernando Maria Miguel Gabriel Rafael Francisco Xavier Raimundo António, que nasceu a 23 de Setembro de 1907, e reúne em si todas as linhas da descendência da Casa de Bragança, dando fim à divisão dinástica, que tão desfavoravelmente se repercutiu na sociedade portuguesa.


«
FELICITAÇÃO

DIRIGIDA AO SENHOR

DOM MIGUEL MARIA DE BRAGANÇA E BOURBON,

POR OCCASIÃO DO ANNIVERSARIO NATALlCIO DE SUA EXCELSA MÃE

A SENHORA

DONA ADELAIDE SOPHIA DE BRAGANÇA.

______________________


Nós abaixo assignados, alumnos do Lyceu Nacional de Aveiro, vimos hoje cheios de jubilo felicitar-vos pelo augusto anniversario natalicio de VOSSA EXCELSA MÃE.

Não podiamos deixar passar em silencio, este glorioso dia tão cheio de esperanças, para aquelles em que corre nas veias / 228 / o sangue dos valorosos combatentes da Cruz de Maroços (sic) e de Souto Redondo.

Apesar de não nos ser avisado o anniversario natalicio de VOSSA EXCELSA MÃE pelas demonstrações de regosijo publico, não deixámos de o saber porque uma auspiciosa esperança, que se nutre em nossos corações, de um dia podermos felicitar-vos dentro dos muros de nossa querida Patria nos adverte, que é hoje o trigesimo nono anniversario da Senhora Dona Adelaide Sophia de Bragança, VOSSA EXCELSA MÃE.

Esperamos em Deus que ha de permittir, que este dia, em que se fundam nossas esperanças e futuro de nossa querida Patria se não ha de demorar muito.

Porque se assim não succedesse, esta Nação que outr'ora fez tremer todo o mundo, seria em breve riscada do mappa das Nações.

Presentemente todas as vistas se dirigem para vós, porque todos conhecem que só Vós sois a unica pessoa que pode salvar Portugal do abysmo em que está prestes a cair.

Todos nós fazemos preces ao Altissimo para que permitta que em breve possais desenrolar no solo portuguez a bandeira das Quinas, essa bandeira pura e sem mancha, que sempre foi victoriosa e nunca vencida.

Pedimos que se digne apresentar a VOSSA EXCELSA MÃE, em testemunho de fidelidade e homenagem as nossas humildes felicitações.

Aveiro 3 de Abril de 1870.

João Augusto Marques Gomes.
Francisco Marques de Lemos.
Eugenio Ferreira da Encarnação.
Albano Augusto Xavier de Macedo.
Manuel Marques Vieira de Carvalho.
Joaquim Nogueira da Silva Junior.
Antonio Alves Mariz.
Domingos Gonçalves Gamellas.
Manuel Rodrigues de Sá.
Avelino Dias de Figueiredo.
Emigdio Eduardo Pereira.
Raphael Gonçalves Andril.
Constantino dos Santos Silva.
Joaquim Antonio Fernandes.
Claudino Domingues da Graça.
 
Thomaz Fernandes Gomes de Pinho.
Antonio Ferreira dos Santos.
João Antonio Simões.
José Tavares da Silva Rebello.
Antonio Vieira da Silva Maia.
José Nunes Antão.
Antonio Soares d'Almeida.
José Nunes da Silva.
José Marques d'Almeida Rebello.
Luiz d'Oliveira Miranda Rocha.
Calisto Luiz de Abreu.
Domingos dos Santos Gamellas.
Antonio Tavares de Pinho.
Guilherme X.
Pereira Simões.
Bernardino Adolfo da Silva Martins.

/ 229 /

Antonio dos Santos Ferreira.
José Maria Alpoim de Cerqueira Borges.
João Pinto Balas.
Francisco d'Almeida Brito.
João da Silva Gomes.
José Antonio Pires de Rezende.
José Maria Moreira Junior.
Manuel Tavares de Veiga.
José Rodrigues de Mello Junior.
José Luiz Monteiro.
José Gomes Moreira de Pinho.
José dos Santos Silva.
Joaquim da Silva Nunes.
Joaquim Manuel da Fonseca Guerra.
Manuel dos Santos Gamellas.
Manuel Ferreira de Carvalho.
Manuel Marques de Lemos Junior.
Zeferino Cesar de Sousa Monteiro.
José Antonio Soares de Mello.
Anselmo Dias da Costa.
Joaquim Antonio Rebello.
Eugenio Pinheiro Nobre.
Julio Martins de Seabra.
José Fernandes d'Almeida.
Francisco Manuel Christo.
José Bernardo da Silva.
Alfredo Rangel de Quadros.
Antonio Rodrigues Gomes.
Jorge Manuel Lobo Pimentel.
Francisco Alexandre Lobo Pimentel.»

Em várias ocasiões a academia aveirense veio a público com manifestos e proclamações; possuímos muitas dessas folhas, onde sucessivamente se reflectem todas as ideologias políticas, a bem dizer. Legitimista, porém, não conhecemos outra além da que acima se reproduz.

A. G. DA ROCHA MADAHIL

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(1) − Adelaide Sofia Amélia Luísa Joana Leopoldina, princesa de Lowenstein-Wertheim-Rosemberg; acabou por professar, em 13 de Junho de 1897, no Mosteiro de Santa Cecília de Cowes, na ilha de Wight, onde faleceu em 16 de Dezembro de 1909.

(2) −  Miguel Maria Carlos Egídio Constantino Gabriel Rafael Gonzaga Francisco de Paula de Assis Januário.

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