Zagalo dos Santos, O brasão e carta de armas dos Brandões, Vol. IV, pp. 111-116.

O BRASÃO E CARTA

DE ARMAS DOS BRANDÕES

O BRASÃO que se agora publica, na moldura destas pobres palavras, foi do bacharel em direito Francisco Pinto Brandão, ou Barandão, como melhor quadrava às suas filáucias.

A pedra de armas, hoje apeada, quebrada e à guarda de longínquos descendentes, esteve ainda até quase há uma dúzia de anos no cunhal norte-poente da sua linda casa solarenga, na rua da Praça, em Ovar, agora rua do Dr. José Falcão.

Este bacharel e fidalgo, que devia ter sido pessoa de muita circunstância e largos cabedais, casou com D. Maria Arcângela Baldaia, pessoa também de sangue que, por seu lado, não deslustraria a prole que Deus lhes fizesse a mercê de dar.

Pinto Brandão, que tinha prosápias de boa costela, arrimava-se aos Pintos − os Pintos Senhores e Morgados da Quinta e Honra de Paramos, a cavaleiro da Barrinha de Esmoriz, Honra que vinha dos dias remotos de D. Afonso 3.º, segundo a lição do senhor Padre MANUEL F. DE SÁ, na sua Monografia de Paramos.

Esta casa dos Pintos foi das mais faladas nas Terras de St.ª Maria da Feira. Multiplicou-se como o gramão. Aires Pinto, fidalgo da Casa do Duque de Bragança − D. Fernando − e um dos seus mais ilustres membros, por seu testamento de 30 de Junho de 1552, instituiu o Morgadio de Paramos em seu filho Álvaro Pinto Henriques, que foi Alcaide-Mor de Abrantes (1).

De geração em geração, com fulgurâncias de civismo e devoções piedosas e negros de despotismo e prepotências bairristas, veio a extinguir-se o Morgadio em 20 de Abril de 1887 por / 112 / morte, no solar da mesma Quinta, de Miguel A. Pinto de Menezes, cacique e galanteador à moda da época, pois legitimou 9 filhos de 5 mulheres, suas teúdas e manteúdas.

D. Maria Arcângela Baldaia, a dar crédito ao genealogista da família − o frade bento Manuel da Graça Baldaia − quanto a grandeza de avós corria também parelhas com seu marido. Filha de Manuel Jorge Baldaia, que se encontra em 1660 a subscrever uns estatutos da Irmandade da Sr.ª da Cadeinha, e que casou em Ovar, era neta paterna de António Jorge Baldaia, este ligado em Cabanões à família principal dali.

Viera este antepassado da Casa de Rolaens, na Vila da Feira, e honrara bem o seu nome, como oficial embarcadiço que foi, bravo e valente, como lho atestara D. António Avis de Menezes, Governador das Armas da Praça de Cascais, uma vez a 26 de Outubro de 1641 e outra a 25 de igual mês de 1642.

E quem eram, donde surdiram estes Baldaias?

No ano de 1775, um descendente assim disse: «− para em todos os tempos constar aos de seu sangue −»

« − A familia dos Baldaias he a mais antiga da Terra da Feira e a de mais conhecida nobreza. A sua origem, por muito antiga, se não sabe toda, só sim que descendem de André Baldaia, que teve uma filha, D. Joanna Thereza Antonia Baldaia, da Caza do Morgado de Canellas, junto a Villar do Paraizo, abaixo do Porto huma legoa pouco mais ou menos, neta de Baltazar da Silva, que era filho de D. Joanna de Miranda Camello da Caza Villar do Paraizo.

«A principal nobreza era a de Villar do Paraizo, fonte e origem da familia dos Baldaias −»

Os de Vilar deviam ter sido de alta devoção e largos cabedais. Fundaram o Mosteiro de Grijó, da Ordem dos Cónegos Regrantes de S. Agostinho e por isso os seus fidalgos tiveram
por muitos séculos a regalia de serem conduzidos debaixo do pálio, esperados pelos religiosos sempre que os visitavam.

Mas os desatinos da vida foram desfalcando a fazenda e certo Morgado para se aliviar do falazar dos credores, vendeu aos frades o privilégio que os humilhava.

E assim se finou − não se sabe por quantos centos de cruzados − tão espaventosa regalia.

Do ramo dos Baldaias de Cabanões, podíamos acompanhar, do berço ao esquife, todas as gerações que, afinal, não marcaram com relevo suas virtudes na vida, aliás, modesta deste burgo. Dois padres e dois frades − um bento, dominicano o outro − se / 113 / [VoI. lV - N.º 14 - 1938] topam à flor de tanto honesto lavrador endinheirado, possuidor de largas folhas de terra, juncais e pinheiros.

Por via legítima, pôs-lhes ponto final, por morte acontecida em 10 de Abril de 1894, Fernando Augusto Pereira Baldaia, nascido em 11 de Fevereiro de 1825 e filho de Manuel José Pereira Baldaia e de Ana Margarida Pereira de Jesus, filha do capitão Jacinto José Pereira Pinto, do Cardal, freguesia de S. Pedro de Pedroso.

Morreu sem filhos, o Fernando. Mas um outro seu irmão, o sétimo na ordem dos nascimentos, Joaquim Maria Pereira Baldaia e que morreu solteiro em 10 de Abril de 1893, sendo dos quarenta maiores contribuintes e ex-vereador, deixou uma filha, que se finou, também sem filhos, em 17 de Março de 1908.

O Dr. João Frederico Teixeira de Pinho, há 68 anos já, nas mãos de Deus, mas ainda padre-mestre em antiqualhas vareiras, guarda impressionante silêncio sobre esta e outras famílias gradas daqui ou aqui residentes.

Na verdade, muitíssimo pouco se sabe dos descendentes do casal Brandão-Baldaia.

Na relação dos notáveis vareiros, confessadamente incompleta, lá vem o nome do frade crúzio, Francisco Brandão Pinto Baldaia, arcebispo eleito de Braga, que a morte surpreendeu e abateu na sua terra.

Frade crúzio já era alguma coisa para as basófias das respectivas famílias, pois que muitas, para encafuar os filhos nas celas de St.ª Cruz, davam pinchos de corça.

Mas arcebispo de Braga era honra de topete, honra com que até os patrícios, embora gente do remo e de charrua, exultaram a valer.

Para outra maré ficará o tracejar de algumas linhas biográficas deste padre.

Mais outro frade houve ainda na família, seguindo-se-lhe um bacharel. Mas como não temos dados precisos, por aqui nos ficamos quanto a Baldaias e Brandões.

Não tendo notícias de carta de brasão nem de pedra de armas dos Baldaias de Cabanões − se uma e outra coisa possuíram − vamos transcrever do Dicionário Portugal o que sobre o assunto lá encontrámos.

Diz-se lá: «−as armas da família deste apelido são: em campo de prata quatro rosas vermelhas acantonadas, cada uma / 114 / com duas folhas verdes no pé e no centro uma flor de liz azul; timbre uma das rosas do escudo com uma flor de liz de ouro no meio.» −

Ovar, 1-2-1938

ZAGALO DOS SANTOS

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Cópia do original, de pergaminho, iluminado, em magnífico estado de conservação, na posse da viúva do Dr. Antero de Oliveira Cardoso, descendente do requerente da Carta.


BRAZAM DARMAS DO BACHAREL FRANCISCO

PINTO BARANDÃO

Passado no Anno de 1735

Dom IOAM Por graça de Deos Rey de Portugal e dos Algarues, daquem, e dalem, mar em Africa, senhor de Guiné e da Conquista, nauegação, do comercio da Ethiopia, Arabia, Percia e India, & A quantos esta minha carta virem, faço saber que o Bacharel Francisco Pinto Barandão, natural e morador na freguesia de são Christovão da Villa de Ouvar, Comarca da Feira Bispado do Porto, me fes petição em como ele descendia e vinha da geração e linhagem dos Sylvas, Barandões, Pintos e Pereiras, e suas armas lhe pertencião de direito, e pedindo-me por merce que para a memoria de seus antecessores se não perder, e elIe uzar e gozar da honra das armas que pelIos merecimentos de seus serviços ganharão e lhe foram dadas, e assim dos previlegios honras, graças, e mercês, que por direito e por bem dellas lhe pertençem lhe mandaçe dar minha carta das ditas armas que estavam registadas em os livros dos registos das armas dos nobres e fidalgos de meus Reynos, que tem Portugal meu principal Rey darmas.

A qual petição vista por mim mandei sobre ella tirar inquerição de testemunhas pelo Doutor João da Sylva Rodarte, do meu dezembargo e meu Dezembargador em esta minha Corte, e caza da Supplicação, Corregedor do Civel em ella, e por Caetano Jozeph de Moura escrivão do dito juizo, pellas quaes fui certo que elle proçede e uem da geração e linhagem dos ditos Sylvas, Barandões, Pintos, e Pereiras, como filho legitimo do lecenceado Manoel Thomas da Sylva, e de sua mulher Bernarda Pinto Pereira, Neto / 115 / pella parte paterna de André da Sylva, e de sua mulher Maria Francisca, e pella materna, neto de Domingos Gomes Barandão, e de sua mulher Anna Pinto Pereira; Os quaes todos forão pesoas nobres e sempre se tratarão a ley da nobreza, com o estado a ella devido, e não so elle supplicante, como todos seus ascendentes são das principais pesoas, e famillias daquella Villa e Comarca, e servirão os cargos honrozos da Republica, sem que nelles ouveçe raça de Iudeo, Mouro ou Mullato, nem de outra infecta nação e que nunca seus ascendentes servirão cargos humildes, e sempre viverão a ley da nobreza, como pesoas nobres que erão, e que de direito as suas lhe pertençem; As quaes lhe mandei dar em esta minha carta com seu Brazão, Elmo, e Timbre, como aqui são devizadas e iluminadas, asim como fiel e verdadeiramente se acharão devizadas, e iluminadas, em os livros dos registos do dito Portugal Rey darmas, A saber:

Hum escudo esquartelado, no primeiro quartel as armas dos Sylvas, em campo de prata hum leão vermelho rompente, no segundo as dos Barandões, em campo azul sinco barandões de ouro asezos postos em sautor, no terceiro as dos Pintos, em campo de prata sicoestre, digo sinco crescentes de lua vermelhas postas em sautor, no quarto as dos Pereiras, em campo vermelho huma Cruz de prata floreteada e vazia do campo. Elmo de prata aberto guarnecido de ouro. Paquife dos metais e cores das armas. Timbre hum leão vermelho rompente e por diferença huma brica verde com um trifolio de ouro =========

O qual escudos, armas e sinaes, posa trazer e traga o dito Bacharel Francisco Pinto Barandão, asim como as trouçerão e dellas uzarão seus antecessores, em todos os lugares de honra, em que os ditos seus antecessores, e os nobres antigos fidalgos sempre as custumavão trazer, em tempo dos muy esclarecidos Reys meus antecessores e com ellas posa / 116 / entrar em batalhas, campos rectos, escaramuças e exercitar com ellas todos os outros actos licitos da guerra, e da paz, e asim as posa trazer em seus firmaes, aneis, senetes, e devizas, e as por em suas cazas e idificios e deixallas sobre sua propria sepultura, e finalmente se servir, honrar, gozar, e aproveitar dellas em todo e por todo, como a sua nobreza convem =========

Com o que quero e me pras, que haia elle e todos seus descendentes, todas as honras, previllegios liberdades, graças, e merçes, inzenções e franquezas, que hão e devem haver os fidalgos nobres, e de antiga linhagem, e como sempre de todo uzarão e gozarão seus antecessores. ==============

Porem mando a todos meus Corregedores, e Dezembargadores, Juizes Justiças, Alcaydes, e em especial aos meus Reys darmas, Arautos e Passauantes, e quaesquer outros officiaes e pessoas a que esta minha carta for mostrada, e o conhecimento della pertencer, que em todo lho cumprão, e guardem, e fação cumprir e guardar, sem duvida, nem embargo algum que em ella lhe seia posto, por que asim he minha merçe.

EL REY noso senhor o mandou por Manoel Pereira da Sylva seu Rey darmas Portugal ===

Frey Joseph da Crus da ordem de são Paulo Refformador do Cartorio da nobreza do Reyno, por especial Provizão do dito senhor a fes, em Lisboa Occidental aos des dias do mes de Junho do anno do nascimento de noso senhor Jesu Christo de mil e sete centos e trinta e sinco, e vai sobscrita por Antonio Francisco e Souza escrivão da escrivão da da nobreza nestes Reynos e senhorios de Portugal e suas Conquistas.

Eu Antonio Francisco e Sousa sobscrevi

====================== Rey darmas P. al. =====================


Fica registado este Brazão no Livro 8.º do Registo dos Brazões da nobreza de Portugal a folhas 193 − Lisboa Occidental aos 30 dias do mes de junho do anno do nascimento de noso senhor Jezu Christo de mil e sete centos e trinta e sinco.

(a) Antonio Francisco Sousa

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(1)Monografia de Paramos, 1937, págs. 157 e segs.

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