Soares da Graça, Gente da Bairrada nas guerras da Restauração, Vol. III, pp. 151-156.

GENTE DA BAIRRADA NAS

GUERRAS DA RESTAURAÇÃO

Um ilustrado e prezado amigo facultou-me há tempos o exame dum velho manuscrito que logo vi ter muito interesse para a história das lutas da Restauração, resolvendo por isso tirar dele algumas notas e transcrever alguns dos documentos ali insertos para publicar no Arquivo do Distrito de Aveiro, visto que deles constam referências muito honrosas a pessoas da linda região bairradina, de certo ignoradas, ou esquecidas.

Trata-se dum processo de habilitação requerido pelo Capitão-Mor Pedro de Barros Sobrinho, natural de Tamengos, e no qual ele fez petição, ao rei, de dois hábitos de Cristo, sendo um para ele e outro para um seu filho. Para esse fim, o suplicante abona-se não só com os seus serviços de Capitão das Ordenanças, e Capitão-Mor do Couto de Aguim e seu termo, durante 13 anos, ou fosse desde 1679 a 1692, ano em que fez a mencionada petição, mas ainda com os de seu pai o Capitão Agostinho Jorge Sobrinho, natural da Pedrulha, e de seu tio o Padre João Gomes Sobrinho, também da Pedrulha, da comarca de Coimbra. No dito processo o suplicante alegava que «deu sempre inteiro comprimento a tudo que se lhe ordenou acodindo aos Alardos geraes que se costumão fazer todos os annos sem nunca faltar á sua obrigação» e sempre «com grande zello prudencia e verdade» etc. etc. Invocou ainda, em seu favor, os serviços de António Cabral da Costa, natural de Coimbra, parente de sua mulher D. Helena Cabral, e que o mesmo havia prestado na Índia. Vê-se mais que por sentença de 26 de Agosto de 1684, numa justificação por ele requerida e constante do mesmo processo, o pai do requerente faleceu ab intestato no estado de casado com Bárbara de Barros, tendo desta uma filha que morreu de menor idade e um filho Dom Manuel das Chagas, Religioso dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, que renunciou, a favor do Capitão Pedro de Barros, seu irmão, o que lhe podia tocar dos feitos de seu pai e tio. / 152 /

O processo é instruído com vários documentos, dos quais alguns se transcrevem no final deste artigo; e baseado neles, o Capitão Pedro de Barros Sobrinho faz ver que seu pai faleceu Capitão da Ordenança do Couto de Aguim, dizendo que ele procedeu com zelo em todas as ocasiões, principalmente no tempo de guerra, conduzindo «soldados pagos e auxiliares» acompanhando sempre o Capitão-Mor Manuel de Oliveira Barreto, indo também com este e uma companhia de 20 soldados a Castelo Branco, onde mostrou o zelo com que serviu o rei.

Maior folha de serviços porém foi aquela que apresentou de seu tio o referido P.e João Gomes Sobrinho, que foi realmente um valente soldado. Tendo sido nomeado Capelão do Terço que se formou em Coimbra no ano de 1643 «per ter as partes e calidades necess.as p.ª bem poder ocupar o ditto cargo». Desempenhou-o com satisfação e aplauso de todos, «confessando e sacramentando os soldados e acodindo aos rebates e animando-os nelles entrando e saindo de guarda trabalhando nas trincheiras e forteficações» o que lhe mereceu sempre menção honrosa. O mesmo Capelão marchou com o dito Terço para Campo Maior, acompanhando a infantaria e cavalaria na entrada que fez em Castela, entrando cinco léguas na terra do inimigo, marchando para Estremoz com uma Companhia a seu cargo à frente da qual esteve vinte dias, estando em Campo Maior até Janeiro de 1645, tomando parte nas jornadas de Boin, Jurumenha, Mourão e outros lugares, e portando-se sempre como «bom servidor e leal vassallo».

SOARES DA GRAÇA


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«Mendo Afonço da Silveira Cappitão de Infantaria por sua Mag.de do terço que levantou o Conde de Cantanhede Dom Ant.º Luiz de Menezes por Sua Mag.de ell.ma

Certefico q marchando eu da Cidade de Coimbra com hum trosso da minha Companhia vim a Villa de Estremos aonde achey o Capelaõ mor Joaõ Gomes Sobrinho con secenta soldados q eraõ o restante dela com os quais avia marchado a dita praça por hordem do dito Conde vindo por cabo deles. E assistio vinte dias Entrando e saindo de guarda E as forteficaçoés da fachina ate o dia que cheguei a dita praça adonde mos entregou com o quaderno que em seo poder tinha. E por me ser pedida a presente por o dito Capelaõ mor lha pacei por mim assinada e selada com o signete de minhas armas o que iuro pello iuram.to dos Santos evamielhos paçar na verdade e assim o julgo por merecedor de toda a honra e m.ce q que sua Mag.de for servido fazer-lhe dada em Campo Mayor aos trinta de Dezembro da era de mil e seis sentos e quarenta E quatro Anos. Mendo Afonso da Silveira (Tem um selo branco)  Consultar versão em PDF
/ 153 / [VoI. lIl - N.º 10 - 1937]

 
NOTA: A palavra «que» está representada por «q» com um til ~ por cima, impossível de colocar nos sistemas informáticos.

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