Existe no Arquivo Nacional
da Torre do Tombo uma preciosa colecção de notícias de variadíssimas
terras de Portugal, coligidas pelos respectivos párocos no século XVIII,
e conhecidíssimas, hoje, de quantos trabalham em história local sob
qualquer das modalidades em que esta costuma apresentar-se.
São as informações paroquiais de 1758.
Como é sabido, constituem essa inestimável colecção as respostas ao
minucioso questionário formulado pelo P.e Luís Cardoso, da
Congregação do Oratório, que se propunha elaborar com esses elementos um
segundo Dicionário Histórico-Geográfico do país, visto a sua primeira
tentativa não ter passado de dois volumes, abrangendo apenas as
localidades que vão de Abambres a Cuvaleiras,
alfabeticamente dispostas.
Está esse riquíssimo material inédito no seu conjunto,
pois o oratoriano não chegou a utilizá-lo
(1); e a história da grandiosa
tentativa, cuja realização teria sido de capital importância para a
historiografia local portuguesa, encontra-se traçada no volume 1.º de
O Arqueólogo Português pela mão de PEDRO DE AZEVEDO e,
também, em carta incluída na obra de PEREIRA DE SOUSA
−
O Megasismo do 1.º de Novembro de 1755 em Portugal
−
distrito de Faro
−
pelo Sr. Dr. ANTÓNIO BAlÃO, ilustre director do Arquivo Nacional.
É,
como digo, colecção conhecidíssima dos investigadores, profissionais e
meros curiosos, extratada já, nos seus elementos arqueológicos,
epigráficos e lendários pelo citado e infatigável PEDRO DE AZEVEDO
(O Arqueólogo Português, vol. 2.º e seg.).
Estas informações paroquiais não são, todavia, as primeiras que se
reuniram entre nós; já o Dicionário do Padre LUlZ CARDOSO
assentava numas informações paroquiais que se não sabe bem quais tenham
sido e que talvez, até, pudessem ser identificadas
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com aquelas de que vamos tratar. Positivo, contudo, é que, 37 anos antes
das de 1758, em 1721, a Academia Real da História inaugurava os seus
trabalhos deliberando escrever a história eclesiástica e a secular do
reino e, como base, lançava no país um questionário a que os párocos
eram obrigados a responder cuidadosamente.
O trabalho da Academia era acompanhado e pessoalmente impulsionado pelo
nosso Rei-Mecenas, D. João V; a deliberação relativa ao inquérito datava
de 5 de Janeiro de 1721; a Academia fora criada por diploma de 8 de
Dezembro transacto.
Determinados académicos tomaram a seu cargo escrever a história
eclesiástica de cada Diocese.
Era obra que se alicerçava em escrúpulo de investigação e seriedade de
processos, lançada em bases documentais honestas, cuja concepção, só por
si, dignifica a historiografia portuguesa da época.
A empresa não chegou a cabo, infelizmente; e o terramoto de 1755
destruiu a quase totalidade do cartório da Academia; bastante material,
e de 1.ª ordem, ficou impresso, ainda assim, na colecção de memorias
e notícias académicas.
Os originais das informações da Diocese de Coimbra não chegaram a
sair desta cidade, ao que suponho; recentemente, em 1933, tive a fortuna
de os encontrar, dispersos e em plena confusão, no Arquivo da
Universidade de Coimbra, onde, em 1917, foi incorporado o espólio do
cartório do Cabido da Sé.
No volume X da Revista Biblos da Faculdade de Letras daquela
Universidade e no meu opúsculo Novas Fontes de História Local
Portuguesa ficou feita a história da colecção. Para lá remetemos o
leitor curioso de mais pormenores, aqui desnecessários.
A Diocese de Coimbra abrangia então, e abrange agora novamente, o sul e
o centro do actual distrito de Aveiro; encontra-se nesse núcleo de
informações paroquiais, portanto, farto número de notícias relativas ao
nosso distrito.
O questionário da Academia Real da História a que estas informações
respondem era muito diverso do que em 1758 o P.e Cardoso
distribuiu; como havia outro especialmente destinado à história secular,
este interessa-se apenas pela eclesiástica e não pede outras notícias
senão quando pergunta pelas notabilidades da terra que por suas virtudes
e letras se extremassem do comum dos mortais.
Era a primeira tentativa dum sistema de inquirições que se ensaiava; o
inquérito do P.e Cardoso beneficiava já das anteriores
experiências, reunia história eclesiástica e história secular, e
avisadamente distinguia nas povoações as terras, as serras e os rios,
como verdadeira ossatura dum bom estudo regional; foi divulgado já pelo
Arqueólogo Português, no seu primeiro volume.
/
39 /
O de 1721, mais modesto mas não menos seguro nos pontos que versa, veio
a público, revelado por nós, no trabalho acima citado, acompanhando o
catálogo de todas as povoações descritas, mas entendemos que não devemos
deixar de o apresentar também aos leitores do nosso distrito, até para
melhor inteligência das informações que a seguir publicaremos. Era assim
concebido:
Ordem para o
Reverendo Pároco
- I, p. 39 [PDF 210
KB]
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Algumas das informações são muito sucintas e o pároco não conseguia
encontrar nada digno de menção; pequenas ou extensas, estas notícias
constituem, todavia, fontes de história local a considerar, momentos da
vida das povoações que se não podem desprezar, devido aos elementos
informativos que encerram.
É interessante observar por elas o lento desenvolvimento gregário,
acompanhar o reflexo do esforço humano na luta constante e porfiada que
a evolução duma localidade representa sempre, ver a actuação dos
diferentes fenómenos sociais que hoje em dia a Geografia humana
põe em relevo na vida dos povos.
Ao mesmo tempo, quanta ruína a considerar neste curto espaço de duzentos
e poucos anos, quanta igreja desaparecida, quanta inscrição, que um
sentimento de eternidade inspirava, se perdeu já e para todo o sempre!
Sunt lacrymae rerum...
Mas a vida é movimento, não contemplação. Quantas virentes realidades de
hoje serão doloridas ruínas amanhã e nossos netos não conhecerão já!
Não se pode deter o tempo nem o capricho humano.
O minuto de Fausto passa,
imperceptivelmente, inexoravelmente...
_________
Como é
natural, começaremos
as nossas transcrições pela capital do distrito; Aveiro tinha então
quatro freguesias, «todas da Ordem de S. Bento de Aviz, e apresentadas
por S. Magestade, como Graõ Mestre da Ordem», esclarece o Dicionário
Geográfico do P.e LUlZ CARDOSO; de todas se conservaram
notícias, como vamos ver.
Os restantes documentos, devido à dificuldade na sua reconversão, vão a
seguir apresentados, em formato PDF.
Eis a
sua listagem:
Informação da
Freguesia do Espírito Santo
- I, p. 40-41 [PDF
306 KB]
Informação da
Freguesia de Nª. Sr.ª da Apresentação
- I, p. 41-43 [PDF
638 kB]
Informação da
Freguesia de S. Miguel
- I, p. 43-46 [PDF
922 KB] |