30º Domingo do Tempo Comum (ano
A)
1ª leitura: Livro do Êxodo, 22,
20-26.
2ª leitura: 1ª Carta de S. Paulo
aos Tessalonicenses, 1, 5-10.
Evangelho: S. Mateus, 22, 34-40.
No tempo de Jesus havia razões de
sobejo para uma pessoa se perder entre a quantidade de mandamentos
da lei judaica. Contavam-se 248 preceitos positivos e 365
proibições! Mesmo assim, nada que se compare com as leis, sobretudo
as dos Estados, embora também cada Igreja ceda facilmente à tentação
de confundir a autêntica importância e autoridade com uma panóplia
de leis e mandamentos.
Na medida em que os fariseus estavam
preocupados com a educação do povo, procuravam sintetizar a Lei de
um modo claro e fácil de reter. Infelizmente, era frequente
misturarem a palha com o grão. Pelo que, tivessem ou não intenções
de o atrair para uma armadilha, fazia sentido a pergunta a Jesus:
qual o mandamento mais importante?
A primeira parte da resposta seria
igual à de qualquer estudioso da Lei: amar a Deus a sério. Isto
significa não pôr outras coisas no lugar de Deus. Temos muita
experiência do que essas coisas podem ser: o dinheiro, o sucesso, a
rapidez, o poder… Boas em si, tornam-se más quando Deus deixa de ser
o mais importante. Até porque todas estas coisas passam e nunca nos
enchem: é um sinal de que só ficamos satisfeitos com o que não passa
e contém a plenitude de todos os prazeres desejáveis. Que pena que
certos sectores de pensamento religioso dêem mais valor às
tribulações do que à alegria ou deixem a alegria apenas para o outro
mundo!
Mas a principal razão do bom virar
mau, é que não se pode amar a Deus a sério sem amar os outros a
sério. Na linha do pensamento do domingo passado, diríamos que «pela
mão de Deus» somos entusiasmados a fazer bem aos outros, com a
capacidade de discernimento do que é que vale a pena «dar», tirando
prazer em deixar os outros usufruir do fruto do nosso trabalho. Não
é nesta base, aliás, que reivindicamos os nossos direitos, fazendo
valer quanto o nosso trabalho é um bem para os outros? Um estilo de
vida onde há lugar para este «dar», para esta preocupação pelo bem
da sociedade, é que denota uma autêntica educação cívica.
Porém, cada um de nós corre o risco
de fazer do trabalho ou do lucro ou até dos outros, o seu Deus. Amar
a Deus a sério é avivar a consciência de que nenhum valor é superior
a Deus. Ao contrário de ideias muito espalhadas e até sustentadas
por grandes pensadores (que nesta questão foram superficiais),
verifica-se que é justamente a reconhecida supremacia de Deus o que
dá garantia à autenticidade da nossa dedicação ao trabalho e aos
outros. Aceitando Deus como luz para a inteligência e força para a
vontade, ficamos atentos para não transformar o trabalho em
destruição do próprio eu, destruição do equilíbrio e paz sociais e
destruição do outro. O trabalho deve estar sempre ao serviço da
dignidade da pessoa, que é semelhante a Deus. Semelhante, mas não
igual: por isso, idolatrar o outro provoca graves situações de
injustiça e destrói a nossa paz – pois confundimos o nosso bem
particular com o bem do outro; ou dedicamo-nos a alguém ou a um
grupo tão exclusivamente que esquecemos o bem dos mais; e sofremos
desilusões que chegam a tirar a vontade de viver.
A importância desta semelhança entre
levar Deus o os homens a sério – não poderia ser mais reconhecida
nos jogos políticos, financeiros e infelizmente também nos «jogos»
religiosos?
A interdependência destes princípios
e o estatuto de «igual» importância constituem um ponto central na
mensagem de Jesus, em que a «simplificação» da Lei só é válida se se
eliminam subterfúgios, hipocrisias e legalismos. A união da causa de
Deus com a causa dos homens também nos desperta para a importância
da auto-estima, de valor vital para o equilíbrio da personalidade.
Afinal, se levamos Deus e os outros a sério é também porque Deus nos
leva a sério.
Jesus não fugiu às últimas
consequências da dedicação ao bem da humanidade. Levou tão a sério a
sua missão que deu testemunho do sentido da vida com a própria vida
e, como sugere a segunda leitura, levou, a quem o sabe ouvir, a
construir desde já a alegria total. |