Sair dos carris sem descarrilar

Se é muito bom viajar na tranquilidade e segurança dos «caminhos de ferro», é preciso que esses caminhos sejam bem traçados e os carris de 5 ou mais estrelas. Só andar nos cada vez mais velhos carris dá cabo deles e de quem se gasta com eles. Até descarrila a máquina de encarrilar!

«Andar na linha» é sabedoria de todo o tempo – mas também é verdade que a linha apodrece com o tempo. Nem basta limpar a ferrugem. Mais vale renovar a linha inteira, mesmo se apenas são precisos alguns «ajustes justos» ao trajecto original.

Convenhamos que o planeamento da grande viagem da vida não se pode limitar aos velhos traçados nem confiar na aparente solidez. «Carris de 5 estrelas», sim, mas como soberbas rampas de lançamento. Aprendendo com Jesus Cristo, vale a pena avançar com uma «alegoria»:

Existe neste país uma zona misteriosa, quase sem pontos cardiais, a que podemos dar o nome vago de «Administração da CP». Uma coisa que também se considera «serviço público» mas que nem é serviço nem público. Diz que tem utentes, mas cada vez menos se interessa por inter-agir com eles. Reclamações legítimas caem no silêncio misterioso e não há melhor sorte para o empenho construtivo de judiciosas sugestões. Por outro lado, preferimos queixumes longos em longas filas de espera – a ter o trabalho produtivo de reclamações bem fundamentadas ou discussão pública «bem educada».

É isso: «Os caminhos de ferro portugueses» transformaram-se na alegoria dos «caminhos da vida dos portugueses»…

Onde vai a defesa do ambiente e segurança rodoviária, com o falhado transporte de automóveis e camiões? Onde vai a boa comunicação com os vizinhos e o reconhecimento dos valores específicos do seu nível de civilização? Até as velhas linhas da CP nos isolam de cidades com grande valor cultural como Santiago, Salamanca ou Sevilha – e que nos abriam mais caminhos aquém e além Pirenéus.

Os factores culturais perdem força, se a inter-acção é dificultada. Daí que o sector público e o privado são chamados a contribuir, com as capacidades próprias, para o bem-estar da sociedade concretizável no bem de cada pessoa.

Trabalhar como pessoa é trabalhar com prazer e ver como foi positivo, e reconhecido, o contributo para a melhoria da qualidade de vida para além do nosso tempo, fruto de quem dedica ao bem da Humanidade toda a capacidade de «serviço» – conceito velho mas criativo por natureza, não podendo ganhar ferrugem…

É universalmente reconhecida a importância do transporte ferroviário, que potencia a segurança e eficácia de todos os outros meios de transporte. Nele, podemos conviver, apreciar a paisagem, descansar, brincar, trabalhar… tranquilamente, com rapidez e pontualidade (estamos numa alegoria!). Facilita o salutar exercício de conhecer melhor as pessoas e também de meditar no que a vida atrapalhada nos esconde ou faz esquecer. Se os professores, médicos, sacerdotes… e sobretudo os políticos usassem mais o transporte público! Certamente que as aulas, os negócios, as leis, os planos do Governo e os serviços religiosos (rituais, homilias, catequeses…) dariam melhor resposta aos problemas da vida com o realismo da «aprendizagem no terreno».

É bom viajar na vida com alegria e segurança – mas será que sabemos sair dos carris velhos e desajustados?

Aveiro, 30-03-2019

 

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